Mensageiro Sideral https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br De onde viemos, onde estamos e para onde vamos Sat, 04 Dec 2021 19:09:39 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Nasa aposenta telescópio espacial Kepler por falta de combustível https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/10/30/nasa-aposenta-telescopio-espacial-kepler-por-falta-de-combustivel/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/10/30/nasa-aposenta-telescopio-espacial-kepler-por-falta-de-combustivel/#respond Tue, 30 Oct 2018 19:21:25 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2013/08/kepler-150x150.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=8268 A gente sabia que esse dia ia chegar, e chegou hoje. Nesta terça-feira (30), a Nasa anunciou que está aposentando o telescópio espacial Kepler. O motivo: acabou o combustível.

É a aposentadoria do satélite que detém o recorde de exoplanetas descobertos: são mais de 2.600 mundos, de todos os tipos possíveis, orbitando outras estrelas. Graças a seus resultados, foi possível colher uma amostra estatística razoável e verificar que entre 20% e 50% de todas as estrelas da Via Láctea têm planetas potencialmente rochosos, como a Terra, em órbitas localizadas na chamada zona habitável de seus sistemas, onde água poderia perdurar em estado líquido na superfície.

A missão original do Kepler começou em 2009 e foi até 2013, quando uma falha de seus giroscópios impediu o apontamento de alta precisão. O fim poderia ter sido ali, mas os engenheiros da Nasa descobriram um meio de prosseguir a missão, usando a pressão da radiação solar como se fosse um dos giroscópios perdidos, estabilizando o apontamento.

Nasceu a missão K2, que produziu uma série de novas descobertas, monitorando alternadamente várias regiões do céu ao longo das constelações do zodíaco. Essas operações, contudo, continuavam demandando o uso de combustível dos pequenos propulsores usados para controlar o satélite.

Nas últimas semanas, por duas vezes o Kepler entrou em “modo de segurança” por nível baixo de combustível. Com os últimos dados baixados para a Terra, a Nasa decidiu encerrar oficialmente o projeto.

“Como a primeira missão caçadora de planetas da Nasa, o Kepler superou vastamente todas as nossas expectativas e pavimentou o caminho para nossa exploração e busca por vida no Sistema Solar e além”, disse Thomas Zurbuchen, vice-administrador do diretório de ciência da agência espacial americana. “Não só ele nos mostrou que muitos planetas existem lá fora, ele disparou um novo e robusto campo de pesquisa que tomou a comunidade científica como uma tempestade. Suas descobertas jogaram nova luz sobre nosso lugar no Universo e iluminaram mistérios e possibilidades tantalizantes entre as estrelas.”

A Nasa já tem operando no espaço o sucessor do Kepler, o satélite Tess. Desenvolvido por uma equipe do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e lançado em abril deste ano, ele está à procura de planetas ao redor de estrelas vizinhas mais brilhantes, que sejam passíveis de caracterização detalhada com a próxima geração de telescópios.

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Cientistas encontram primeira evidência de uma lua fora do Sistema Solar https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/10/04/cientistas-encontram-primeira-evidencia-de-uma-lua-fora-do-sistema-solar/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/10/04/cientistas-encontram-primeira-evidencia-de-uma-lua-fora-do-sistema-solar/#respond Thu, 04 Oct 2018 03:02:22 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/exomoon-kepler-1625b-320x213.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=8197 Quando o primeiro exoplaneta fora do Sistema Solar foi descoberto, em 1992, era uma bizarrice impensável: planetas que orbitavam um pulsar, o cadáver de uma estrela de alta massa. Quando o primeiro exoplaneta a orbitar uma estrela similar ao Sol foi descoberto, em 1995, era uma bizarrice impensável: um gigante gasoso que completava uma volta ao redor de seu astro-rei em meros 4 dias. Agora, em 2018, começam a se consolidar as primeiras evidências da descoberta de uma exolua, ou seja, uma lua de um planeta fora do Sistema Solar. E, adivinhe só, é uma bizarrice impensável.

Se Alex Teachey e David Kipping, da Universidade Columbia, em Nova York, estiverem certos, trata-se de uma lua do tamanho de Netuno a orbitar um planeta do tamanho de Júpiter. É para fritar a cabeça dos cientistas que tentam explicar como satélites naturais se formam. Mas primeiro precisa ser mesmo verdade, o que não é ainda certo — embora a hipótese tenha ganho um senhor empurrão com um novo artigo que a dupla acaba de publicar no periódico Science Advances, relatando resultados obtidos com o Telescópio Espacial Hubble.

A história começou no ano passado, quando Teachey e Kipping usaram uma técnica interessante para buscar evidências de exoluas nos dados do satélite Kepler, da Nasa.

Rememorando: o Kepler foi construído para encontrar planetas fora do Sistema Solar monitorando de forma constante o brilho de mais de 100 mil estrelas. A ideia era flagrar pequenas reduções periódicas de luminosidade que correspondessem à passagem de planetas à frente dessas estrelas, com relação à linha de observação do satélite. Deu certo, e milhares de planetas foram descobertos por este método.

Não é difícil imaginar como procurar também por exoluas com esses dados. Muitos pesquisadores imaginaram que, se houvesse alguma lua associada aos exoplanetas descobertos pelo Kepler, poderia haver alguma variação sutil no padrão de variação de brilho observado, dependendo da posição que a lua guardasse com relação ao planeta no momento do trânsito. O problema é que essa variação seria tão sutil, e provavelmente embaralhada ao limite de precisão do equipamento, que não seria nada fácil encontrá-la.

Teachey e Kipping, no entanto, não desistiram e desenvolveram um método em que “empilhavam” diversos trânsitos para tentar encontrar algo que indicasse a presença de uma exolua. E, em meio a vários sinais ambíguos, teve um que chamou a atenção, referente ao planeta Kepler-1625b. Ele foi descoberto ao redor de uma estrela similar ao Sol, mas bem mais velha, a 8.000 anos-luz de distância, na constelação do Cisne. E os dois pesquisadores de Columbia notaram que, entre os três trânsitos observados pelo Kepler, haviam variações que podiam ser bem explicadas por uma lua orbitando ao seu redor. Mas seria uma lua monstruosa, pelos nossos padrões atuais.

No Sistema Solar, a maior das luas é Ganimedes, de Júpiter, com 5.268 km de diâmetro. Ela é maior que o planeta Mercúrio, com seus 4.879 km de diâmetro, mas perde em tamanho de todos os demais planetas, e seu porte se encaixa bem ao processo de formação sugerido pelos cientistas para explicar luas ao redor de planetas gigantes. Já a hipotética exolua de Kepler-1625b seria mais ou menos do tamanho do planeta Netuno, ou seja, teria ela mesma o porte de um mundo gigante gasoso!

Desnecessário dizer que ninguém sabia (ou sabe) como um exoplaneta poderia ter uma lua tão grande. Daí a cautela dos pesquisadores. Eles decidiram que o próximo passo deveria pedir tempo no disputado Telescópio Espacial Hubble, para conferir com mais precisão um trânsito de Kepler-1625b à frente de sua estrela.

O novo artigo, publicado nesta quarta-feira (3), traz justamente essa nova observação, feita em outubro do ano passado e 3,8 vezes mais precisa que as obtidas originalmente com o Kepler. E ela tem elementos que favorecem a hipótese de que a tal exolua gigante é real, embora ainda não permita cravar a descoberta.

Dois fatos ligados à observação parecem corroborar a ideia. O primeiro foi que o planeta chegou “adiantado” para o trânsito, começando a passar à frente de sua estrela-mãe 77,8 minutos antes do esperado. É o que os cientistas chamam de TTV, sigla inglesa para variação no tempo do trânsito. Em geral, ela indica que há alguma interação gravitacional responsável por causar atrasos o adiantamentos do planeta observado. No caso em questão, é bem possível que essa interação seja causada pela presença de uma lua bem grande. (Tenha em mente que dois objetos astronômicos na verdade não giram exatamente um ao redor do outro, mas ambos ao redor do centro de massa do sistema que compõem; se o sistema é de uma lua relativamente grande, se comparada ao planeta, a oscilação ao redor do centro de massa do sistema por parte do planeta podia explicar como ele pode às vezes transitar adiantado, e às vezes atrasado, com relação a uma dada medição.)

Também é verdade que TTVs podem ser explicadas pela presença de outros planetas, em vez de luas, e por isso a evidência apresentada não é conclusiva — talvez exista um planeta adicional ainda não descoberto que explique a variação.

Já o segundo fato revelado pela observação do Hubble é mais difícil de explicar. Acompanhe comigo: se o exoplaneta chegou muito adiantado no trânsito pela presença de uma exolua, é de se supor que a exolua estivesse no lado oposto ao do movimento de translação do planeta. Isso significa que, após o trânsito dele, talvez fosse possível observar um trânsito dela, vindo logo atrás.

E é isso que o gráfico de luminosidade da estrela parece revelar — logo após a grande redução de brilho causada pela passagem do planeta, vem uma redução de brilho menor, mas clara, que… não chegamos a ver terminar porque o tempo de observação alocado para os pesquisadores (40 respeitáveis horas, para um trânsito planetário que duraria 19 horas) terminou antes do fim do possível trânsito da exolua!

Imagem ajuda a entender o que o Hubble teria visto, caso o sinal seja mesmo de uma exolua. (Crédito: ESA/Nasa/STScI)

“Uma lua companheira é a explicação mais simples e natural para a segunda redução na curva de luz e o desvio no tempo da órbita”, disse Kipping em nota. “Foi definitivamente um momento chocante ver aquela curva de luz do Hubble, meu coração começou a bater um pouco mais depressa quando eu continuava a olhar para aquela assinatura. Mas sabíamos que nosso trabalho era manter a cabeça no lugar e essencialmente presumir que era um erro, testando todos os modos concebíveis pelos quais os dados podiam estar nos enganando.”

Por esse invejável e muito sensato excesso de zelo, ainda não dá para cravar que encontramos a primiera exolua. Os próprios pesquisadores deixam isso claro em seu artigo científico, dizendo: “advogamos que se façam monitoramentos futuros do sistema para chegar as predições do modelo e confirmar a repetição do sinal similar ao de uma lua”.

A BIZARRICE
Partindo de modelos, os pesquisadores sugerem que a exolua teria diâmetro e massa similares aos de Netuno, e orbitaria um planeta com diâmetro um pouco maior que o de Júpiter, mas com massa bem maior. Imagina-se que a exolua de Kepler-1625b responda por apenas 1,5% da massa atribuída ao planeta — uma proporção mais ou menos igual à do sistema Terra-Lua, mas em versão tamanho família.

Os dinamicistas não têm a menor ideia de como um Netuno poderia se formar ao redor de um superjúpiter. A hipótese mais simples seria imaginar que ambos nasceram como planetas e um acabou capturado pela gravidade de outro e convertido em lua, mas é bem complicado fazer isso “funcionar” em simulações.

Curiosamente, Kepler-1625b está na zona habitável de sua estrela, completando uma volta ao redor dela a cada 287 dias. Evidentemente, como se trata de um gigante gasoso (assim como sua potencial exolua), não poderia abrigar vida. Mas e se houver uma outra lua, menorzinha e rochosa, capaz de manter água em estado líquido na superfície e, por consequência, uma biosfera? Podemos aí ter certeza de que, se ela existe, deve proporcionar a seus habitantes um dos espetáculos celestes mais bonitos da Via Láctea.

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Google entra no negócio de achar exoplanetas e identifica estrela que tem ao menos oito, como o Sol https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/12/14/google-entra-no-negocio-de-achar-exoplanetas-e-identifica-estrela-que-tem-ao-menos-oito-como-o-sol/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/12/14/google-entra-no-negocio-de-achar-exoplanetas-e-identifica-estrela-que-tem-ao-menos-oito-como-o-sol/#comments Thu, 14 Dec 2017 20:20:38 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/12/17-098-180x54.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7175 Nesta quinta-feira (14), a gigante Google entrou oficialmente no negócio de descobrir planetas fora do Sistema Solar. Um engenheiro de software do departamento de inteligência artificial da empresa é um dos dois autores de um artigo científico anunciando a descoberta de dois novos mundos cuja presença estava escondida nos dados brutos do satélite Kepler, da Nasa.

O Kepler-90i é um planeta rochoso e quente que orbita uma estrela um pouco maior que o Sol em apenas 14,4 dias. É um inferno escaldante, mas tem um particular: ele se soma a um sistema que já tinha sete planetas conhecidos. Com isso, a estrela Kepler-90 atinge a marca de oito planetas — a mesma do Sistema Solar.

Comparação do tamanho dos planetas de Kepler-90 aos do Sistema Solar. (Crédito: Nasa)

É a primeira vez que encontramos oito mundos num único sistema, fora o nosso próprio. O recorde anterior, sete, pertencia ao famoso sistema Trappist-1, a cerca de 40 anos-luz da Terra. Mas Kepler-90 está bem mais longe, a cerca de 2.500 anos-luz de distância.

A outra descoberta é no sistema Kepler-80. O Kepler-80 g é o sexto planeta encontrado ao redor da estrela, que é bem menor que o Sol, provavelmente uma anã vermelha. Ele tem o tamanho da Terra, mas também não tem perspectiva de ser habitável, ou seja, de ter uma faixa de temperaturas que permita a existência de água em estado líquido na superfície.

A descoberta é importante por revelar o potencial de redes neurais — algoritmos de computador que são grosseiramente baseados no funcionamento do cérebro humano — para a análise de vastas quantidades de dados astronômicos em busca de sinais interessantes, como é o caso do conjunto de informações brutas colhido pelo satélite Kepler em sua missão original, entre 2009 e 2013.

A técnica consistiu em basicamente “treinar” um computador para identificar sinais de planetas nos dados do Kepler e então deixá-lo analisar os dados colhidos de 670 estrelas, das 150 mil que o satélite observou na região das constelações Lira e Cisne. Ou seja, devem vir mais descobertas por aí.

O trabalho foi feito por Christopher Shallue, da Google IA, e Andrew Vanderburg, da Universidade do Texas em Austin, e foi apresentado numa teleconferência realizada pela Nasa nesta quinta-feira (14). Os resultados já foram aceitos para publicação no “Astronomical Journal”.

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AO VIVO: Nasa apresenta novas descobertas feitas com o Kepler, satélite caçador de exoplanetas https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/12/14/ao-vivo-nasa-anuncia-novas-descobertas-com-o-kepler/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/12/14/ao-vivo-nasa-anuncia-novas-descobertas-com-o-kepler/#comments Thu, 14 Dec 2017 16:34:38 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2013/08/kepler-150x150.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7169 Em coletiva realizada nesta quinta-feira (14), a partir das 16h, a Nasa deve apresentar novas descobertas feitas com dados do satélite Kepler, o caçador de exoplanetas. De acordo com o comunicado da agência espacial americana, o avanço foi possível graças ao uso de inteligência artificial. Confira a coletiva ao vivo, com tradução simultânea do Mensageiro Sideral.

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As cinco lições da missão Kepler https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/06/20/as-cinco-licoes-da-missao-kepler/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/06/20/as-cinco-licoes-da-missao-kepler/#comments Tue, 20 Jun 2017 06:00:37 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/06/IMG_0369-180x101.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6510 Nesta segunda-feira (19), a Nasa em essência passou a régua na missão original do telescópio espacial Kepler, com a divulgação do catálogo final de descobertas feitas pelo satélite.

Durante quatro anos, entre 2009 e 2013, o Kepler ficou olhando fixamente para uma pequena região do céu, a fim de registrar pequenas reduções momentâneas de brilho em alguma das estrelas em seu campo de visão que indicassem a presença de planetas ao seu redor.

Conforme a missão progredia, catálogos periódicos de “candidatos a planetas” foram sendo divulgados, enquanto métodos eram desenvolvidos e aplicados para confirmar as descobertas. Chegamos agora ao oitavo e último desses grandes conjuntos de dados, que adicionou 219 “candidatos a planeta” à lista final, dez deles com tamanho comparável ao da Terra (igual ou menor que o dobro do diâmetro terrestre) na chamada zona habitável ao redor de suas estrelas — a região em que um planeta recebe o nível de radiação ideal para manter água em estado líquido na superfície, condição tida pelos cientistas como essencial à vida.

O satélite Kepler detecta planetas observando trânsitos deles à frente de suas estrelas-mães. (Crédito: Nasa)

O resultado tem meio cara de fim de festa: nenhum planeta novo foi confirmado, a despeito dos novos “candidatos”. Mas não se iluda, o catálogo final — que ainda deve passar por uma “limpeza” e pequenos ajustes — tem grande importância. Não só ele marca o fim de uma era na busca aos exoplanetas como também servirá de trampolim para estudos estatísticos importantes.

Eis, portanto, o placar final e oficial da missão Kepler.

Observando cerca de 180 mil estrelas por quatro anos o satélite encontrou:

– 4.034 candidatos a planeta

– 2.335 planetas confirmados

– 49 candidatos a planeta de pequeno porte (até 2 raios terrestres) na zona habitável

– 30 planetas de pequeno porte confirmados na zona habitável

São números superlativos, ainda mais se considerarmos que o Kepler só podia detectar sistemas planetários que estivessem de tal modo alinhados de modo que os planetas transitassem periodicamente à frente de sua estrela-mãe com relação ao ponto de vista do satélite — o que significa, estatisticamente, detectar em média apenas 5% de todos os planetas de período orbital relativamente curto (no máximo 3,5 anos) que deveriam existir na pequena região do céu entre as constelações de Cisne e Lira, representando 0,25% do total da abóbada celeste, e apenas para as estrelas mais próximas ali localizadas.

Mesmo lidando com essas frações de frações de frações de planetas, o telescópio espacial produziu estatística suficientes para tirarmos uma série de conclusões importantes. Confira as cinco mais relevantes, que mudaram para sempre a forma como encaramos o Universo lá fora.

1. Planetas do porte da Terra são extremamente comuns

Antes do Kepler, quase nada se sabia sobre planetas de pequeno porte, como o nosso. Usando um método alternativo de detecção (que envolvia medir o “bamboleio gravitacional” que planetas causam sobre suas estrelas), astrônomos estavam paulatinamente aumentando a sensibilidade de suas pesquisas para encontrar superterras — mundos apenas ligeiramente maiores que o nosso — na zona habitável, mas os resultados do satélite foram uma avalanche de planetas pequenos. Ainda não podemos afirmar com certeza quantos mundos do tamanho da Terra existem na Via Láctea, mas a essa altura já se pode cravar que é na casa de muitos bilhões. Antes do Kepler, não tínhamos ainda uma ideia clara dessa abundância.

2. A zona habitável é com frequência morada de mundos rochosos

Outro possível preconceito que o Kepler derrubou é a noção de que, de algum modo, planetas localizados na distância certa de suas estrelas para abrigar vida seriam incomuns. Na verdade, eles são bastante corriqueiros. Para as estrelas anãs vermelhas, astros menores que o Sol que correspondem a cerca de 75% da população de estrelas da Via Láctea, o Kepler mostrou que uma em cada quatro tem ao menos um planeta rochoso na região “nem muito quente, nem muito fria” do sistema. Então, faça só este cálculo rápido: há no mínimo 75 bilhões de anãs vermelhas na Via Láctea, o que sugere a presença de pelo menos 18 bilhões de planetas rochosos potencialmente habitáveis. Ainda assim, tenha em mente a ênfase no “potencialmente”. Afinal, muitos astrônomos ainda questionam o potencial para a vida ao redor de anãs vermelhas: como elas são muito frias e pequenas, sua zona habitável é muito próxima. Só que essas estrelas também têm o hábito de produzir enormes tempestades estelares, capazes de varrer e quiçá esterilizar mundos que, de outro modo, poderiam ser abrigos para a vida.

3. Planetas na zona habitável não são exclusividade das anãs vermelhas

Por razões óbvias, sabemos que mundos rochosos na zona habitável ao redor de estrelas anãs amarelas, tipo espectral G, como o Sol, têm potencial para abrigar vida. Elas não são tão comuns quanto as anãs vermelhas, mas ainda assim respondem por quase 8% das estrelas da Via Láctea. E uma das grandes revelações do Kepler, sobretudo em seu catálogo final, é que anãs amarelas também abrigam frequentemente planetas na zona habitável. Dos 49 “candidatos a planeta” de pequeno porte identificados na zona habitável, 12 estão ao redor de estrelas de tipo G. Desses, 3 foram confirmados, 2 eram “candidatos” já conhecidos, e 7 foram agregados no último catálogo.

4. Planetas de pequeno porte vêm em dois sabores

Se o Kepler, por si só, mostrou que planetas com até quatro vezes o raio da Terra (tamanho aproximado de Netuno) são muito comuns, bem mais frequentes que gigantes gasosos de grande porte, como Júpiter, uma análise recém-concluída por Benjamin J. Fulton e colegas do Caltech, mostrou que esses mundos tendem a se dividir em duas categorias muito claras. Ao usar o Observatório Keck, no Havaí, para estudar o tamanho exato de cerca de 2 mil estrelas do campo original de observação do Kepler, o grupo demonstrou que planetas até 1,75 raio terrestre formam uma população. A partir desse tamanho, a quantidade de planetas decresce de forma acentuada, e só volta a crescer quando o raio passa de 2 vezes o terrestre. Enquanto o primeiro grupo tende a ter alta densidade e, portanto, ser rochoso como a Terra, o segundo grupo tende a ter baixa densidade, lembrando mais versões em miniatura de Netuno, com grandes invólucros e gás e provavelmente inabitáveis. Os astrônomos já começam a formular hipóteses para entender a divisão clara, que parece estar ligada à capacidade de cada planeta de agregar hidrogênio e hélio durante seus estágios inicias de formação. Se o mundo consegue reunir 1% ou mais de sua massa na forma desses gases, tenderia a preservá-los e se tornar um mininetuno. Se juntasse menos, tenderia a perdê-los e viraria rochoso.

5. As surpresas estão só começando

Os catálogos do Kepler são produzidos de forma automatizada por computador, e este oitavo e último teve um bônus especial: além dos potenciais planetas identificados, ele envolveu um estudo estatístico mais aprofundado, que avaliava a porcentagem de sinais potencialmente perdidos pela “peneiragem digital” dos dados, assim como o potencial para falsos positivos. Então, a base de dados tem o enorme valor de indicar não só os “candidatos a planeta” detectados, mas a chance estatística de eles serem um falso positivo ou de haver mais como eles que escaparam à detecção. Esses números permitirão, por exemplo, estimar de forma bastante razoável o número total de planetas como a Terra, em órbitas similares à terrestre, em órbita de estrelas como o Sol, existentes na Via Láctea. Mas estar em circunstâncias similares não equivale a ser igual. Estamos agora entrando em uma segunda fase do estudo dos exoplanetas, que não envolve mais só descobri-los e estimar sua massa ou seu raio. Passaremos a caracterizá-los, estudando sua densidade e tentando investigar a composição de sua atmosfera. Fora isso, o acervo de dados do Kepler conta ainda com muitas descobertas inesperadas a serem feitas, que não seriam detectados na produção dos catálogos automatizados. Um exemplo é a famosa Estrela de Tabby, que tem reduções bizarras de brilho que desafiam explicações convencionais. Será que há mais surpresas escondidas em meio às 180 mil estrelas estudadas originalmente pelo Kepler? Só o futuro poderá responder.

Por ora, como consolo imediato temos o fato de que a missão original do Kepler acabou em 2013, por problemas técnicos, mas o satélite foi reconfigurado (e rebatizado como K2) para seguir na busca por planetas em outras regiões do céu. E nessa nova etapa já foram 520 candidatos a planeta, e 148 confirmados. A saga continua!

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Kepler ‘renascido’ acha mais 104 planetas, cinco com potencial para a busca de vida https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2016/07/18/kepler-renascido-acha-mais-104-planetas-cinco-com-potencial-para-a-busca-de-vida/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2016/07/18/kepler-renascido-acha-mais-104-planetas-cinco-com-potencial-para-a-busca-de-vida/#comments Mon, 18 Jul 2016 18:17:40 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2016/07/k2_100planet_header-180x105.png http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=5018 Como diria Mark Twain, os rumores sobre a morte do satélite Kepler foram enormemente exagerados. No primeiro grande trabalho de consolidação dos resultados obtidos após a “ressurreição” do telescópio espacial na forma da missão K2, um grupo internacional de astrônomos anunciou a descoberta de mais 104 planetas — alguns deles potenciais alvos para a busca por vida fora do Sistema Solar.

Essa é a diferença crucial entre os mundos identificados agora e os que foram revelados durante a missão original do Kepler — eles estão mais próximos e em estrelas potencialmente mais brilhantes que permitirão a futura análise de sua composição atmosférica. E nela poderemos encontrar a “assinatura” característica de biologia. (Na Terra, as grandes quantidades de oxigênio só poderiam ser explicadas pela presença de seres capazes de fotossíntese. Um ET que nos estudasse a alguns anos-luz de distância seria capaz de dizer isso, mesmo sem jamais nos visitar.)

Dos 104 planetas, 64 não haviam sido investigados antes, 37 são de porte relativamente pequeno — com no máximo duas vezes o diâmetro terrestre — e 5 deles recebem nível de radiação de suas estrelas similar ao que a Terra recebe do Sol. Ou seja, em princípio, poderiam ter um ambiente capaz de manter água em estado líquido, condição essencial para a vida como a conhecemos. Mas será que é esse o caso? Com alvos como esses, poderemos tentar obter a resposta a partir de 2018, quando a Nasa pretende lançar o Telescópio Espacial James Webb. Mais sensível que o Hubble e operando no infravermelho, ele terá o poder de detectar ao menos alguns traços da composição atmosférica desses mundos.

O artigo que reporta as descobertas contempla os cinco primeiros “campos” de observação da missão K2 (Campanhas 0 a 4), realizados entre março de 2014 e abril de 2015. Desde então, novas campanhas seguem em andamento, de modo que podemos esperar muito mais descobertas nos quatro anos previstos de operação para a missão. “Extrapolações da coleta planetária atual sugerem que o K2 descobrirá entre 500 e 1.000 planetas”, escrevem Ian Crossfield, da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, e seus colegas, em longo artigo científico aceito para publicação no “Astrophysical Journal Supplement Series”.

Os cinco campos das campanhas 0 a 4 do Kepler, e seus 104 planetas confirmados (Crédito: Karen Teramura/UHIfA)
Os cinco campos das campanhas 0 a 4 do Kepler, e seus 104 planetas confirmados (Crédito: Karen Teramura/UHIfA)

O RENASCIMENTO
O trabalho consolida diversas descobertas dispersas feitas recentemente, com um esforço mais rigoroso de confirmação e validação dos resultados. Para a análise, os cientistas contaram com observações de apoio feitas com os telescópios Gemini e Keck, no Havaí, além dos dados colhidos pelo K2, o “Kepler renascido”.

Maior satélite descobridor de planetas da história, o Kepler foi lançado em 2009, e seu objetivo era justamente produzir números superlativos. Ele foi projetado para se manter o tempo todo apontado para a mesma região do céu, um pequeno campo estelar que representava apenas 1/400 de toda a abóbada celeste. Lá, ele monitoraria o brilho de cerca de 150 mil estrelas, em busca de “mini-eclipses” — planetas que passassem à frente da estrela e bloqueassem parte de sua luz.

E foi isso o que ele fez, entre 2009 e 2013, colhendo uma amostra significativa dos tipos de sistema planetário existentes lá fora. A ideia era essa mesmo, realizar um censo, produzindo estatísticas que nos permitissem responder a uma pergunta simples: com que frequências planetas como a Terra se encontram em circunstâncias similares às do nosso planeta?

A missão foi um sucesso, mais de 2.300 planetas foram descobertos, e a questão crucial foi respondida. Hoje sabemos que, em média, uma em cada cinco estrelas similares ao Sol têm um planeta com diâmetro e nível de radiação comparáveis aos da Terra — o que sugere a presença de bilhões de mundos parecidos com o nosso, só na nossa Via Láctea.

Contudo, uma coisa que o Kepler não havia sido projetado para fazer era se concentrar em estrelas mais próximas, que permitissem estudos posteriores de caracterização dos planetas ao seu redor. Ao se manter sempre apontado na mesma direção, ele não podia “escolher” seus alvos.

E então veio o defeito que quase acabou com ele. Para manter seu apontamento preciso, o satélite era equipado com quatro giroscópios (dispositivos giratórios que ajudam a apontar a estabilizar o veículo no espaço), dos quais no mínimo três eram necessários para a operação bem-sucedida. Só que dois deles falharam, deixando o Kepler com apenas dois funcionais. Fim da missão?

Os engenheiros tiveram então uma ideia brilhante para trazê-lo de volta à ativa. Reapontar o Kepler de forma que a pressão exercida pela luz solar funcionasse como o terceiro giroscópio, estabilizando-o num dos eixos. Assim, o satélite poderia voltar às observações, com algumas diferenças. Conforme ele avançasse em sua órbita ao redor do Sol, a luz solar estaria vindo de uma região diferente do céu, de forma que ele teria de ser reapontado em outra direção.

Nasceu então a missão K2, em que o telescópio espacial permanece apontado durante cerca de 80 dias de cada vez para uma dada região do céu ao longo das constelações do zodíaco. Os resultados agora apresentados refletem o sucesso obtido nas primeiras cinco campanhas — pouco mais de um ano de observações.

Em sua nova missão, o telescópio espacial busca planetas nas constelações do zodíaco (Crédito: Nasa)
Em sua nova missão, o telescópio espacial busca planetas nas constelações do zodíaco (Crédito: Nasa)

OS ALVOS MAIS SABOROSOS
Números superlativos deixaram de ser o principal atrativo da missão. Agora o objetivo é se concentrar em estrelas mais brilhantes e encontrar planetas que possam ser futuros objetos de caracterização detalhada. Os dados do Kepler oferecem apenas uma estimativa do tamanho e da órbita dos mundos descobertos. Mas queremos saber mais: qual a composição desses planetas? O que há no ar por lá? Algum deles tem oceanos de água? Existe vida neles?

A missão K2 se concentra agora em encontrar essas joias planetárias, que estão na distância certa para que possamos estudá-las mais a fundo com os telescópios de próxima geração — não só o James Webb, mas também os grandes telescópios terrestres que devem entrar em operação na próxima década, como o E-ELT, do ESO (Observatório Europeu do Sul), e o GMT, de um consórcio internacional com participação paulista.

O Mensageiro Sideral perguntou a Ian Crossfield que planetas dessa baciada ele acha mais atraentes para futuros esforços de caracterização e detecção de composição atmosférica. “Sim, estamos muito empolgados de achar vários alvos excelentes para o James Webb em nossos esforços com o K2”, disse. “Vários planetas especialmente interessantes que são bons alvos são os três planetas pequenos e frios orbitando [a estrela] K2-3, o planeta K2-18b e os dois maiores gigantes gasosos em órbita de K2-24.”

Quer conhecê-los? Vamos lá!

A estrela K2-3 é uma anã vermelha com cerca de 60% do diâmetro do Sol, a cerca de 150 anos-luz da Terra. E o sistema de três planetas foi um dos primeiros a ser descobertos pela missão renascida — o Mensageiro Sideral mesmo já falou nele quando Crossfield anunciou sua primeira identificação, no ano passado. O terceiro e mais interessante deles tem diâmetro 50% maior que o da Terra e está numa região que poderia em tese permitir que fosse habitável. A conferir nos próximos anos.

Já o planeta K2-18b tem um tamanho intermediário entre a Terra e Netuno, recaindo sobre uma categoria que não tem igual no Sistema Solar. Daí o interesse dos cientistas por ele e por sua caracterização. Ele tem cerca de 30 mil km de diâmetro e completa uma volta em torno de sua estrela, outra anã vermelha, a cada 32,9 dias.

Por fim, os planetas K2-24b e c têm respectivamente 52% e 72% do diâmetro de Júpiter e completam uma volta em torno de sua estrela a cada 20,8 e 42,3 dias, respectivamente. E o interessante é que estão em torno de uma estrela cerca de 20% maior do que o Sol.

Ou seja, veja você que os cientistas não estão interessados meramente em planetas com potencial para vida. Na verdade, eles querem entender que tipos de planetas há lá fora e como eles se formam. Tudo numa busca por entender o contexto da nossa própria existência num Universo muito, muito grande. Responder se estamos sós ou não é apenas parte dessa resposta.

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Astrônomos acham planeta gigante com dois sóis na zona habitável de seu sistema https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2016/06/13/astronomos-acham-planeta-gigante-com-dois-sois-na-zona-habitavel-de-seu-sistema/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2016/06/13/astronomos-acham-planeta-gigante-com-dois-sois-na-zona-habitavel-de-seu-sistema/#comments Mon, 13 Jun 2016 19:53:31 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2016/06/kepler-1647b-180x135.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=4896 Já estamos fartos de saber que há planetas que orbitam em torno de duas estrelas simultaneamente. Também cansamos de ver planetas gigantes, e conhecemos um bocado de planetas na zona habitável. Mas agora encontramos tudo isso num único pacote: um planeta do tamanho de Júpiter girando em torno de uma estrela binária na região ideal para o surgimento da vida.

O planeta em si, como um inóspito gigante gasoso, não seria um propício ao surgimento de formas biológicas. Mas ele provavelmente tem luas, e esses satélites naturais, se fossem grandes o suficiente, poderiam ser capazes de abrigar vida. Agora sinta um frio na espinha ao pensar na visão do céu que teríamos numa lua-oceano orbitando um gigante gasoso que por sua vez gira em torno de dois sóis. Uau.

O anúncio da descoberta foi feito nesta segunda-feira (13), durante a 228a Reunião da AAS (Sociedade Astronômica Americana), que está rolando a todo vapor na cidade de San Diego, na Califórnia, e terá ainda outras novidades incríveis para os próximos dias (e o Mensageiro Sideral está de olho, pode apostar).

O planeta recebeu o nome de Kepler-1647b e está a cerca de 3.700 anos-luz de distância, localizado num sistema planetário na constelação do Cisne.

Como a nomenclatura sugere, esse mundo foi flagrado pelo telescópio espacial Kepler, da Nasa, conforme passava à frente de suas duas estrelas-mãe, entre 2009 e 2013. Mas não foi fácil confirmar sua existência, pois ele só completa uma volta a cada 1.107 dias terrestres — pouco mais de três anos –, o que significa dizer que o satélite só conseguiu ver duas passagens do planeta por cada uma das estrelas. É muito pouco para descartar, só com isso, um alarme falso.

Por essa razão, foi necessário um esforço de observação adicional em terra, a fim de confirmar o achado, agora reportado simultaneamente na conferência da AAS e em um artigo aceito para publicação no “Astrophysical Journal”.

DENTRE OS GRANDES, ÉS O PRIMEIRO
O Kepler-1647b é o maior dos planetas circumbinários (ou seja, que orbitam duas estrelas) a ser detectado pelos astrônomos. Seu raio é apenas 6% maior que o de Júpiter (com margem de erro de 1% para baixo ou para cima). Sua massa, por sua vez, está em torno de uma a duas vezes a de Júpiter.

Ele também é o planeta circumbinário com a órbita mais larga já descoberto pelo Kepler. E, como seria de se esperar, as duas estrelas que compõem o sistema também produzem eclipses ao passar uma à frente da outra, conforme giram em torno de um centro de gravidade comum. Ambas similares ao Sol (uma um pouco maior, a outra um pouco menor) e muito próximas, elas produzem um eclipse a cada 11 dias.

Curiosamente, um dos trânsitos detectados do planeta aconteceu justamente num momento em que uma estrela eclipsava a outra, conforme a ilustração acima!

Órbitas de todos os planetas circumbinários conhecidos. A linha pontilhada delimita o limite interno para órbitas estáveis; a vermelha é a do Kepler-1647b (Crédito: B. Quarles, Univ. Oklahoma)
Órbitas de todos os planetas circumbinários conhecidos. A linha pontilhada delimita o limite interno para órbitas estáveis; a vermelha é a do Kepler-1647b (Crédito: B. Quarles, Univ. Oklahoma)

Estima-se que o sistema Kepler-1647 tenha cerca de 4,4 bilhões de anos — praticamente um contemporâneo do nosso Sistema Solar, com seus 4,6 bilhões de anos. Houve, portanto, tempo mais do que suficiente para que a vida possa ter emergido numa lua que existisse ao redor do gigante Kepler-1647b.

A importância maior da descoberta, contudo, é confirmar a predição teórica feita pelos cientistas de que deveria haver planetas circumbinários em órbitas mais alongadas. Até então, os pesquisadores só haviam descoberto mundos de dois sóis em órbitas mais compactas. Esse mundo está quase três vezes mais afastado de seus sóis do que a Terra com relação ao nosso (e só se encontra na zona habitável justamente porque há duas estrelas no sistema, produzindo muito mais energia do que o nosso Sol solitário).

“Apesar da importância que a nova descoberta de um planeta circumbinário tem ao aguçar nossa curiosidade humana básica sobre mundos distantes, sua principal significância é expandir nossa compreensão do funcionamento interno de sistemas planetários nos ambientes dinamicamente ricos de estrelas binárias próximas”, escreveram os pesquisadores.

Com efeito, mundos circumbinários são um tema fascinante e uma das grandes surpresas que o estudo dos exoplanetas trouxe aos astrônomos.

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Kepler-452b e o futuro da Terra https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/07/23/kepler-452b-e-o-futuro-da-terra/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/07/23/kepler-452b-e-o-futuro-da-terra/#comments Thu, 23 Jul 2015 16:00:10 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=3800 Imagine poder observar, de uma distância segura, o futuro longínquo da Terra, daqui a 1 bilhão ou 2 bilhões de anos — um futuro potencialmente fervilhante e inóspito, diga-se de passagem. O satélite Kepler, da Nasa, aparentemente fez algo parecido.

Concepção artística de Kepler-452b, um planeta que pode estar se superaquecendo, algo que aconterá à Terra em mais 1 bilhão de anos (Crédito: SETI Institute)
Concepção artística da superfície de Kepler-452b, um planeta que pode estar se superaquecendo, algo que acontecerá à Terra em mais 1 bilhão de anos (Crédito: SETI Institute)

Ele descobriu um mundo um pouco maior que a Terra, em torno de uma estrela parecida com o Sol, numa órbita similar à que nosso planeta executa. Ou seja, lá, como aqui, uma volta inteira leva um ano para se completar (385 dias, para ser mais exato). A principal diferença: a estrela-mãe lá tem cerca de 6 bilhões de anos — 1,5 bilhão a mais que o Sol.

O exoplaneta, localizado a 1.400 anos-luz daqui, recebeu a designação Kepler-452b, e é uma das mais interessantes descobertas feitas durante a última atualização do catálogo de potenciais exoplanetas do satélite, recém-divulgada pela agência espacial americana.

O Kepler detecta planetas-candidatos observando pequenos eclipses causados pela passagem deles à frente de suas respectivas estrelas. Na última parcial, o catálogo de potenciais exoplanetas contava com 4.175 exemplares. A nova atualização — a primeira a levar em conta o total de dados colhidos pelo Kepler em sua missão original, entre 2009 e 2013 — adicionou cerca de 500 novos objetos.

Estima-se que cerca de 90% das detecções sejam reais, e não algum falso positivo, mas mesmo assim os cientistas usam todos os meios à disposição para verificar o achado de forma independente. Isso já foi feito para o Kepler-452b, uma possível “Terra do futuro”.

O satélite Kepler detecta planetas observando trânsitos deles à frente de suas estrelas-mães. (Crédito: Nasa)
O satélite Kepler detecta planetas observando trânsitos deles à frente de suas estrelas-mães. (Crédito: Nasa)

NA DIVISA
As detecções feitas pela observação de “trânsitos planetários” permitem estimar com alguma precisão o tamanho do astro, mas não sua massa. Com apenas uma das duas informações, fica difícil estimar sua composição. Então, é bom avisar: não sabemos se o Kepler-452b de fato se parece com a Terra.

Contudo, estudos feitos com exoplanetas que tiveram tanto sua massa como seu volume medidos sugerem que existe uma fronteira, mais ou menos na marca de 1,6 diâmetro terrestre. Os mundos que têm esse tamanho ou menos tendem a ser rochosos, como o nosso, e os maiores que isso provavelmente são versões em miniatura de Netuno, o menor dos gigantes gasosos do nosso Sistema Solar.

Kepler-452b cai bem na linha divisória: 1,6 diâmetro terrestre. Isso significa que ele tende a ser rochoso. Mas não há como ter certeza no momento.

OS 10% QUE FAZEM A DIFERENÇA
A estrela Kepler-452, por sua vez, é uma anã amarela, como o Sol, e tem apenas 4% mais massa que o nosso astro-rei. Em compensação, como é mais velha, é também um pouco mais brilhante. Isso significa que o Kepler-452b recebe atualmente 10% mais radiação que a Terra. E pode ser uma diferença fatal.

Modelos de evolução solar sugerem que, em mais ou menos 1 bilhão de anos, o aumento de brilho do Sol fará com que a Terra se torne inabitável. A radiação adicional emitida aquecerá o planeta de forma a evaporar os nossos oceanos. Com tanto vapor d’água na atmosfera, a temperatura subirá centenas de graus com relação a atual. Nosso planeta se tornará tão inóspito quanto Vênus.

“Se o Kepler-452b é de fato um planeta rochoso, sua localização com relação a sua estrela pode significar que ele está entrando numa fase de efeito estufa descontrolado”, disse Doug Caldwell, cientista do Instituto SETI envolvido com a missão da Nasa. “O Kepler-452b pode estar experimentando agora o que a Terra sofrerá daqui a mais de um bilhão de anos, conforme o Sol envelhecer e se tornar mais brilhante.”

Concepção artística do Kepler-452b visto do espaço (Crédito: Nasa)
Concepção artística do Kepler-452b visto do espaço (Crédito: Nasa)

A descoberta ilustra alguns pontos importantes. Um deles é um que, com base em estudos estatísticos, na prática já sabemos desde 2013: planetas com porte similar ao da Terra em órbitas similares às da Terra em torno de estrelas similares ao Sol são comuns no Universo.

Outro ponto importante, e talvez menos apreciado, seja o fato de que a região conhecida como “zona habitável” é um conceito bem flexível. Kepler-452b hoje possivelmente está se tornando um inferno escaldante, mas, no passado, quando sua estrela era menos brilhante, seu clima pode ter sido tão ameno quanto o da Terra. A vida pode ter florescido lindamente lá, muito antes que surgissem os primeiros animais em nosso próprio mundo. E se, em vez dele, tivéssemos por lá um mundo como Marte, com porte menor e atmosfera mais rarefeita, o ambiente provavelmente seria propício à vida até hoje. Ou seja, habitabilidade não depende só da região do sistema em que o planeta orbita, mas de características intrínsecas do próprio mundo e da evolução de sua estrela-mãe.

Comparação entre a Terra e o Sol, e Kepler-452b e sua estrela-mãe (Crédito: Nasa)
Comparação entre a Terra e o Sol, e Kepler-452b e sua estrela-mãe (Crédito: Nasa)

MUITO MAIS DE ONDE VEIO ESSE
Além de Kepler-452b, o novo catálogo de objetos de interesse inclui 11 novos candidatos a planeta com menos de duas vezes o diâmetro da Terra orbitando na zona habitável de suas estrelas.

Até agora, o satélite da Nasa já identificou oito planetas confirmados com potencial para serem habitáveis, ou seja, capazes de manter água em estado líquido na superfície. Desses, o mais interessante é Kepler-186f, que tem praticamente o mesmo tamanho da Terra.

Uma comparação dos sistemas Kepler-186, Kepler-452 e o Solar. (Crédito: Nasa)
Uma comparação dos sistemas Kepler-186, Kepler-452 e o Solar. (Crédito: Nasa)

Embora sua missão original tenha sido concluída em 2013, após a pifada de dois dos giroscópios do satélite, o Kepler segue em operação num novo projeto, denominado K2. Em vez de olhar fixamente para uma só posição do céu, como ele fez entre 2009 e 2013, ele agora se alterna entre diversos pedaços do firmamento ao longo das constelações do zodíaco. E pode apostar que novas descobertas vêm por aí. É só esperar.

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Bilhões de planetas na zona habitável https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/03/18/bilhoes-de-planetas-na-zona-habitavel/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/03/18/bilhoes-de-planetas-na-zona-habitavel/#comments Wed, 18 Mar 2015 08:57:23 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=3145 Para cada estrela no Universo, deve haver entre um e três planetas em sua zona habitável — a região nem muito quente, nem muito fria, que permite a presença de água em estado líquido na superfície. É basicamente a condição essencial para a existência de vida. Apenas na Via Láctea, a nossa galáxia, são cerca de 200 bilhões de estrelas. Faça as contas e pare para pensar no que isso significa, só por um instante.

O sistema Kepler-62 é um dos casos conhecidos em que dois planetas ocupam a zona habitável. Combinação deve ser comum no Universo. (Crédito: Nasa)
O sistema Kepler-62 é um dos casos conhecidos em que dois planetas (um deles visto como um ponto brilhante ao fundo) ocupam a zona habitável em torno de uma estrela similar ao Sol. Caso deve ser comum no Universo. (Crédito: Nasa)

Pensou? Agora vamos em frente. A estimativa extraordinária acaba de ser apresentada por um trio de astrônomos na Austrália e na Dinamarca, aliando alta tecnologia do século 21 — dados do satélite Kepler — a ciência do século 18.

É isso mesmo que você leu. Ciência do século 18. Faz algum tempo que os astrônomos Charley Lineweaver e Timothy Bovaird, da Universidade Nacional Australiana, andam brincando com um conceito conhecido como a relação de Titius-Bode. Ela foi descoberta em 1766 por Johann Titius e popularizada por Johann Bode em 1772, numa época em que apenas um sistema planetário era conhecido: o nosso. A dupla notou que as órbitas dos planetas pareciam obedecer a uma regra matemática simples.

(Você se interessa pelo tema busca por vida extraterrestre e deseja se aprofundar no assunto? Dê uma olhadinha nisto aqui!)

Olhe para esta sequência de números:

0, 3, 6, 12, 24, 48, 96, 192, 384…

À exceção dos dois primeiros, todos os outros são o dobro do anterior. Baba. Agora, mais uma operação matemática simples. Some 4 a todos eles. Terminamos com:

4, 7, 10, 16, 28, 52, 100, 196, 388…

Agora divida tudo por dez. E eu juro que esta é a última conta que você vai precisar fazer aqui hoje. Pois agora, como num truque de mágica, você pode usar esta sequência para prever as distâncias médias que cada um dos planetas do nosso Sistema Solar guarda do Sol, em unidades astronômicas (UA). Uma unidade astronômica é, por definição, a distância média da Terra ao Sol, cerca de 150 milhões de km. Mas veja como (quase) tudo se encaixa.

Planeta Distância T-B (UA) Distância real (UA)
Mercúrio 0,4 0,39
Vênus 0,7 0,72
Terra 1,0 1,00
Marte 1,6 1,52
Ceres (cinturão de asteroides) 2,8 2,77
Júpiter 5,2 5,20
Saturno 10,0 9,54
Urano 19,6 19,20
Netuno 38,8 30,06

Note que, quando Titius e Bode primeiro revelaram essa estranha coincidência, a posição entre Marte e Júpiter estava vazia, e o último planeta conhecido era Saturno. Não só Urano, descoberto em 1781, seguia bem de perto a tal regra, como o astrônomo Giuseppe Piazzi encontraria, em 1801, o planeta anão Ceres (feito famoso recentemente pela espaçonave Dawn) bem onde a singela relação matemática sugeriria a possível presença de alguma coisa.

Acabou que eram algumas coisas — havia um cinturão de asteroides inteiro naquele espaço, o que roubou parte da magia da previsão. E Netuno, o oitavo planeta, descoberto em 1846, também não seguia de perto a regra, o que acabou levando os astrônomos a tratá-la como nada mais que uma grande, enorme, imensa coincidência.

SÓ QUE NÃO
Lineweaver e Bovaird parecem determinados a reabilitar a velha relação, usando para isso os planetas fora do Sistema Solar. Em 2013, o Mensageiro Sideral descreveu um trabalho da dupla que demonstrava que uma versão genérica da regra de Titius-Bode (em que os parâmetros iniciais e de multiplicação variam) parecia se encaixar incrivelmente às arquiteturas dos sistemas multiplanetários descobertos até então.

À moda dos astrônomos do século 18, os australianos então usaram os espaços “vazios” indicados pela regrinha para “prever” a existência de 141 exoplanetas ainda não descobertos em sistemas previamente estudados.

Em seguida, outros astrônomos foram procurá-los, fuçando nos dados públicos do satélite Kepler, o caçador de planetas da Nasa. De 97 planetas previstos pela dupla da Austrália, Chelsea Huang e Gáspár Bakos, da Universidade de Princeton, puderam encontrar apenas cinco. E um sexto que parecia estar ligeiramente no lugar errado, a julgar pela previsão. Na opinião deles, uma confirmação de só cinco planetas, em meio a 97, é muito pouco para redimir a relação de Titius-Bode. “A taxa de detecção está aquém do limite inferior do número esperado, o que indica que o poder de previsão da relação de Titius-Bode é questionável”, escreveram.

Ainda assim, o fato de que cinco planetas candidatos foram descobertos desse modo e estavam todos onde a regrinha sugeria que deveriam estar ainda deixa uma ponta de dúvida (sobretudo porque o sexto, que não obedeceu à relação, se mostrou bem esquisito). Por isso, Lineweaver e Bovaird voltaram à carga, aliados a Steffen Jacobsen, da Universidade de Copenhague.

VIÉS DE SELEÇÃO
O novo estudo leva em conta uma amostra ainda maior de sistemas multiplanetários descobertos, mas que parecem “incompletos”, a julgar pela relação de Titius-Bode. E analisa os achados de Huang e Bakos sob a perspectiva de qual deveria ser a taxa de sucesso esperada, chegando à conclusão de que era mais ou menos isso mesmo: 5% das previsões. Afinal, há várias limitações de tamanho dos planetas e de alinhamento dos sistemas que impedem a detecção da maior parte dos planetas “perdidos”.

“Eu considero a detecção de 5% uma evidência de apoio interessante para nossas previsões, porque é isso mesmo que se deveria esperar”, disse Lineweaver ao Mensageiro Sideral. “Também é importante considerar o fato de que todos os outros pesquisadores que estão analisando os sistemas multiplanetários do Kepler sem usar nossas previsões só conseguiram achar dois novos exoplanetas, e esses dois também são consistentes com nossas previsões.”

Na nova lista, os astrônomos foram mais cautelosos, limitando-se a sistemas cuja inclinação favoreça mais a detecção dos planetas “previstos”. No total, eles apresentam 228 mundos “perdidos” em torno de 151 estrelas e fazem uma afirmação ousada, ao prever a taxa desses planetas que deve ser encontrada numa análise mais cuidadosa dos dados brutos do Kepler: 15%.

120 BILHÕES DE TERRAS?
O que nos leva de volta ao começo da história. Se Lineweaver e seus colegas estiverem certos, e a relação de Titius-Bode for mesmo uma boa pista de como se configuram as arquiteturas dos sistemas planetários, juntando as descobertas já confirmadas do Kepler às previsões, cada estrela deve ter em média entre um e três planetas na zona habitável de sua estrela. E logo saberemos se isso está mesmo certo, porque os astrônomos australianos já estão mais uma vez fuçando os dados do satélite em busca das confirmações — e elas devem ser representativas do estado geral dos planetas em toda parte.

“Nosso resultado de um a três planetas é baseado somente nos sistemas descobertos pelo Kepler. Contudo, baseando-nos nas formas mais plausíveis de corrigir os efeitos de seleção do satélite, a evidência favorece fortemente a ideia de que todas as estrelas têm sistemas planetários e que esses sistemas são provavelmente quase todos multiplanetários. Fingir que tudo que o Kepler é capaz de ver é tudo que existe é irrealista.”

O argumento de Lineweaver faz todo sentido. Para detectar planetas, o sistema precisa estar de tal modo alinhado que esses mundos passem periodicamente à frente de suas estrelas com relação ao satélite. Como esses alinhamentos se distribuem aleatoriamente, sabemos que o Kepler só é capaz de, na melhor das hipóteses, detectar 5% dos sistemas existentes numa dada região do céu, e mesmo assim só a poucos milhares de anos-luz de distância. Ou seja, tudo de fascinante que foi descoberto pelo satélite até agora representa 5% do que existe naquela pequena região do céu, e só nas vizinhanças mais próximas do Sistema Solar.

Importante ressaltar que a relação de Titius-Bode não diz nada sobre o tamanho dos objetos que ocupam as faixas indicadas. O que significa dizer que nem todos os planetas presentes na zona habitável de suas estrelas serão rochosos, como a Terra. Em seu novo artigo, publicado no periódico “Monthly Notices of the Royal Astronomical Society”, Lineweaver e seus colegas estimam que um terço desses mundos sejam de fato rochosos (com no máximo 1,5 diâmetro terrestre). Ainda assim, quando você multiplica 2 (média de planetas por sistema) por 0,3 (percentual de planetas rochosos) por 200 bilhões (estimativa do número de estrelas na Via Láctea), terminamos com nada menos que 120 bilhões de mundos similares em composição à Terra e posicionados numa região do sistema planetário compatível com a presença de água líquido — requisito essencial para a vida.

É um pensamento tão assustador quanto encantador. Como não perder algum tempo refletindo sobre esses números e imaginando a incrível variedade de sistemas existentes lá fora? A cada momento descobrimos algo incrível sobre os diversos mundos que orbitam o nosso Sol, aqui no quintal de casa. Imagine isso multiplicado por centenas de bilhões, só para a nossa Via Láctea. E então imagine centenas de bilhões de galáxias como a nossa. Este é o Universo em que vivemos. Não dá para não se apaixonar. E tenho certeza de que Titius e Bode teriam ficado encantados com tudo isso, estivessem aqui conosco.

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Os planetas mais antigos do Universo https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/01/28/os-planetas-mais-antigos-do-universo/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/01/28/os-planetas-mais-antigos-do-universo/#comments Wed, 28 Jan 2015 08:00:06 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=2904 Astrônomos usando dados, adivinhe só, do telescópio espacial Kepler, da Nasa, fizeram mais uma descoberta extraordinária. Eles encontraram o mais antigo sistema planetário de que se tem notícia, com cerca de 11,2 bilhões de anos.

Concepção artística do sistema Kepler-444, o mais antigo já descoberto (Crédito: Universidade de Birmingham)
Concepção artística do sistema Kepler-444, o mais antigo já descoberto (Crédito: Universidade de Birmingham)

É verdade que a margem de erro é do naipe “ibope” — 1 bilhão de anos para mais ou para menos. Ainda assim, é um sistema muito antigo, concebido numa época em que o Universo era bem jovem. E os planetas são rochosos, como a Terra, o que nos dá a confiança de que astros favoráveis ao surgimento da vida têm sido criados há muito, muito tempo no cosmos. Compare os 11,2 bilhões de anos do sistema Kepler-444, recém-descoberto, aos 4,6 bilhões de anos do Sol e sua família de planetas. É quase o triplo.

Trocando em miúdos: a vida pode ter florescido em nossa galáxia muito tempo antes que nosso planeta sequer existisse. Mas não em Kepler-444, que fique claro. É um sistema para lá de complicado, e todos os planetas são quentes demais para abrigar água líquida e vida como a conhecemos.

VAMOS ATÉ LÁ?
Normalmente, muitas pessoas reagem negativamente às distâncias interestelares. “De que adianta descobrir esses planetas se não podemos ir até lá?” É bem verdade que ainda não sabemos nem como viajar até a estrela mais próxima, a meros quatro anos-luz de distância, num tempo inferior a dezenas de milhares de anos. Mas para muitas pessoas a imaginação, estimulada pelo conhecimento, já ajuda a transpor os vastos vazios que separam as estrelas.

Você é uma delas? Façamos, pois, uma visita virtual a esse sistema, localizado a modestos 120 anos-luz de distância, na constelação de Lira. A primeira coisa que notaremos ao nos aproximar é que Kepler-444 não é um sistema de uma estrela solitária, como o Sol. Notaremos, como fez a equipe do astrônomo português Tiago Campante, da Universidade de Birmingham no Reino Unido, ao realizar observações posteriores com telescópios em solo, que há uma segunda estrela, menos brilhante, em torno do astro principal.

Verificando a separação aparente entre elas, os computadores de bordo de nossa espaçonave virtual nos informam que a menor deve estar girando em torno da maior a uma distância relativamente grande, completando uma volta a cada 430 anos, aproximadamente.

Imagem feita com o telescópio Keck II, no Havaí, revela uma estrela menos brilhante ao redor de Kepler-444. (Crédito: Campante et al.)
Imagem feita com o telescópio Keck II, no Havaí, revela uma estrela menos brilhante ao redor de Kepler-444. (Crédito: Campante et al.)

Mas conforme nossa distância do sistema diminui, temos mais uma surpresa. O astro menor não é uma estrela, mas duas — duas anãs vermelhas, bem menores e mais frias que o Sol. Elas giram em torno de um centro comum enquanto avançam juntas ao redor do astro maior, uma anã laranja, apenas ligeiramente menor que nossa estrela-mãe. Tudo isso nós descobrimos ao analisar a luz vinda desses astros, que revela sua temperatura e seu tipo espectral.

Partimos então para uma análise mais sofisticada do espectro da estrela principal. Ao detectar pequenas vibrações internas, que se refletem em sutis alterações de brilho na estrela — algo que o astrônomo brasileiro Eduardo Janot, da USP, gosta de chamar de “estelemotos” — os pesquisadores puderam estimar a idade (a técnica é conhecida como “asterossismologia”). E aí chegaram aos 11,2 bilhões de anos.

Seguindo em frente, avançamos até as proximidades da estrela maior e lá encontramos nosso tesouro: cinco pequenos planetas, todos rochosos e menores que a Terra. O menor deles é o mais interno, Kepler-444b, que completa uma volta em torno de sua estrela em apenas 3,6 dias terrestres. Ele tem o tamanho aproximado de Mercúrio, o menor dos planetas do nosso Sistema Solar, mas é bem mais quente, pois está bem mais próximo de sua estrela. Aliás, todos os cinco planetas caberiam num círculo com um quinto do tamanho da órbita de Mercúrio — é o que os astrônomos chamam de um sistema altamente compactado. O segundo planeta completa uma volta em 4,5 dias, o terceiro em 6,2 dias, o quarto em 7,7 e o quinto em 9,7. O maior é o último, com cerca de três quartos do diâmetro da Terra.

Embora sejam inabitáveis, eles trazem uma confirmação importante — os ingredientes básicos para a formação de planetas como a Terra já existiam 11 bilhões de anos atrás.

NÃO BASTA A RECEITA
Esse é um dos grandes enigmas da astronomia dos exoplanetas — quando eles começaram a se formar? O drama é que, no princípio do Universo, 13,8 bilhões de anos atrás, só havia três elementos químicos: hidrogênio, hélio e uma pitada de lítio.

Com esse trio, já dava para fabricar estrelas — grandes bolas de gás que convertem hidrogênio em elementos mais pesados por fusão nuclear –, mas não planetas — que exigem átomos mais pesados, como carbono e oxigênio. Para que mundos como o nosso pudessem existir, primeiro as estrelas primordiais tiveram de “construí-los” em suas fornalhas internas e depois semeá-los pelo Universo, principalmente por meio das explosões violentas conhecidas como supernovas.

Espalhados pelo espaço, esses estilhaços atômicos acabaram semeando nuvens de gás que formariam outras estrelas. E o processo seguiria adiante, gradualmente tornando o Universo um lugar com maior variedade química. Mas em que momento exatamente já havia concentração suficiente de elementos pesados para o surgimento de planetas rochosos?

Essa é a importância do novo achado — ele empurra ainda mais para trás esse momento de transição. Já conhecíamos alguns sistemas planetários com idade estimada em coisa de 10 bilhões de anos (Kepler-10 e Kapteyn, para citar dois exemplos), mas o Kepler-444 parece ser ainda mais antigo.

“A descoberta de um sistema antigo de planetas de tamanho terrestre em torno da estrela Kepler-444 confirma que os primeiros planetas se formaram muito cedo na história da galáxia, e com isso ajuda a determinar o início da era da formação planetária”, escrevem os pesquisadores, em artigo publicado ontem no “Astrophysical Journal”.

Para o Mensageiro Sideral, a descoberta representa mais um triunfo do princípio copernicano. Inspirado originalmente pela constatação de Copérnico de que a Terra estava longe de ser o centro do Universo, e em vez disso era apenas mais um planeta a girar em torno do Sol, consolidou-se a noção de que não há nada de especial sobre nosso mundo que o torne melhor ou mais interessante que outros espalhados pelo Universo.

A descoberta, nos últimos anos, de que planetas similares em composição à Terra e com níveis de radiação similares existem em grandes quantidades foi mais uma confirmação desse princípio. E agora vemos que nem mesmo numa época especial nós vivemos. A vida pode ter emergido pela primeira vez no Universo vários bilhões de anos antes que nosso planeta tenha sequer nascido. Não somos únicos. Somos, em vez disso, apenas mais um exemplo da obsessão criativa do cosmos.

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