Mensageiro Sideral https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br De onde viemos, onde estamos e para onde vamos Sat, 04 Dec 2021 19:09:39 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Tomografia 3D criada por brasileiros pode ajudar a caçar fósseis de Marte https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2020/05/18/tomografia-3d-criada-por-brasileiros-pode-ajudar-a-cacar-fosseis-de-marte/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2020/05/18/tomografia-3d-criada-por-brasileiros-pode-ajudar-a-cacar-fosseis-de-marte/#respond Mon, 18 May 2020 09:00:00 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2020/05/Fig2cy.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=9311 Um grupo internacional de pesquisadores, liderado por brasileiros, acaba de desenvolver um método para investigar microfósseis no interior de rochas sem destruí-los, criando uma nanotomografia 3D de sua estrutura. Os cientistas esperam futuramente usar a técnica para a busca por sinais de vida em amostras vindas de Marte.

O trabalho tem como primeira autora Lara Maldanis, pesquisadora do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), órgão do CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais), localizado em Campinas (SP). Ela atualmente faz pós-doutorado na Universidade de Grenoble, França. O artigo descrevendo os resultados foi publicado na edição desta semana do periódico Scientific Reports.

Os pesquisadores trabalharam com uma amostra da Formação Gunflint, no Canadá. “É um verdadeiro ícone no estudo da vida antiga na Terra”, conta Maldanis. Trata-se de uma das regiões mais bem documentadas de fósseis antigos, remontando a uma época em que a Terra era habitada tão somente por microorganismos simples, como bactérias e arqueias.

A técnica envolve recortar um pequeno pedaço da rocha, contendo as estruturas de interesse, na forma de um tubinho de apenas 25 micrômetros (milésimos de milímetro), e então submetê-lo a uma varredura de raios X gerados por uma fonte de luz síncrotron (os pesquisadores usaram a da SLS, Fonte de Luz Suíça, no Instituto Paul Scherrer, em Viligen).

O resultado é uma nanotomografia computadorizada de raios X que produz uma imagem 3D do que restou de células bacterianas que viveram há bilhões de anos. No caso em questão, 1,88 bilhão de anos. “A técnica nos permite ver a célula por todos os ângulos, e isso é muito importante quando se tenta diferenciar uma bactéria fóssil, que às vezes não passa de uma minúscula esfera ou filamento sem nenhuma ornamentação, de cristais ou simples aglomerados de matéria orgânica”, diz Maldanis.

Fotografia da amostra (a) e resultado da nanotomografia 3D, na mesma orientação do que se vê na foto (b) e em outros ângulos (c e d). A barra de escala tem 5 micrômetros. (Crédito: Maldanis et al.)

Até então, a única técnica capaz de produzir algo parecido envolvia microscopia eletrônica de varredura, com um agravante: “Para poder ver o fóssil em 3D, era preciso remover camada por camada, destruindo-o completamente”, destaca a pesquisadora. “Nossa técnica, além de não ser destrutiva, tem o adicional de ter um ótimo contraste para a matéria orgânica das células.”

Pelo lado brasileiro, o trabalho tem financiamento da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do Instituto Serrapilheira, no âmbito do projeto de astrobiologia liderado por Douglas Galante, pesquisador do LNLS (CNPEM). E a expectativa, claro, é que esse seja apenas o começo. Com a técnica devidamente demonstrada, os pesquisadores esperam explorar outras amostras e explorar algumas das questões que perturbam os estudiosos dos primeiros passos da vida na Terra.

“Agora temos convicção de que essa técnica poderá contribuir muito em algumas discussões muito interessantes”, diz Maldanis. “Gostaríamos muito de testar, por exemplo, os microfósseis de Apex Chert, na Austrália, descritos como os fósseis mais antigos da Terra, mas que são alvo de discussão e controvérsia há mais de 20 anos!”

E por que parar em amostras terrestres? O grupo tem esperança de aplicar o método, por exemplo, em alguma amostra do famoso meteorito ALH84001, proveniente de Marte. Pesquisadores da Nasa, em 1996, disseram ter identificados nanofósseis de possíveis micróbios marcianos nele. Hoje o consenso científico é de que se tratam de estruturas não biológicas, mas os autores da pesquisa até hoje apostam em sua conclusão original e talvez uma técnica mais sofisticada de imageamento possa colocar ponto final à questão, para um lado ou para o outro. Não é fácil a Nasa emprestar um farelinho que seja do ALH84001, mas os pesquisadores brasileiros ainda não desistiram.

E a perspectiva de estudar rochas marcianas ganha contornos ainda mais interessantes conforme as agência espaciais começam a por em marcha um plano para trazer novas amostras de Marte. O jipe Perseverance, que parte em julho, tem como um de seus objetivos colher amostras de interesse, para futuro envio de volta à Terra. “Queremos mostrar com esse trabalho, e os que ainda virão, que um síncrotron pode ser o melhor lugar para estudá-las”, diz Maldanis. “E quem sabe até, se não for sonhar muito, algumas dessas análises não possam ser feitas no nosso Sirius [novo acelerador de luz síncrotron em construção no LNLS]?”

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Estudo com estrela similar ao Sol ajuda a explicar evolução da vida na Terra https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/30/estudo-com-estrela-similar-ao-sol-ajuda-a-explicar-evolucao-da-vida-na-terra/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/30/estudo-com-estrela-similar-ao-sol-ajuda-a-explicar-evolucao-da-vida-na-terra/#respond Wed, 30 May 2018 18:37:19 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/cme-2012-sdo-320x213.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7754 Um novo trabalho feito por uma dupla de astrônomas brasileiras a partir de dados colhidos pelo satélite Kepler ajuda a entender as agruras pelas quais a vida na Terra teve de passar para lidar com o mau humor do Sol, bilhões de anos atrás.

O estudo, feito por Raissa Estrela e Adriana Valio, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, se concentrou na estrela Kepler-96, onde o telescópio espacial da Nasa descobriu um planeta do tipo superterra numa órbita curta de apenas 16 dias.

A estrela Kepler-96 é bastante parecida com o Sol — mesma massa, diâmetro quase igual –, mas significativamente mais jovem: ela tem 2,3 bilhões de anos, enquanto nosso Sistema Solar tem 4,6 bilhões de anos.

Hoje, o Sol é uma estrela relativamente quieta, produzindo apenas ocasionalmente grandes explosões solares. Mas, de forma geral, os astrônomos acreditam que essa calmaria venha com a idade. Com efeito, Kepler-96 é mais agitada que o Sol — e provavelmente representativa do que nossa estrela já foi no passado.

Vasculhando os dados do Kepler, as pesquisadoras perceberam que, em 3 das 84 ocasiões em que o satélite flagrou a passagem do planeta Kepler-96b à frente de sua estrela, o astro central também estava produzindo uma explosão estelar. A mais potente se revelou mais de 50 vezes mais intensa que a explosão solar mais potente já registrada: uma superexplosão.

Qual teria sido o efeito de um evento desses sobre a Terra do passado? Isso foi o que a dupla estudou a seguir, ao investigar o que aconteceria a um planeta como o nosso se ele estivesse na zona habitável da estrela Kepler-96.

Elas modelaram duas possíveis atmosferas — uma sem camada de ozônio, como a atmosfera terrestre primitiva, e outra já devidamente oxigenada pela vida, como é o caso da nossa hoje. Calcularam a quantidade de radiação ultravioleta nociva chegaria à superfície e compararam à capacidade de sobrevivência de dois micróbios bastante estudados pelos cientistas: E. coli e D. radiodurans.

E aí é o tal negócio: só ozônio salva. Ambos poderiam sobreviver tranquilões na superfície, se houvesse essa camada atmosférica protetora. Em compensação, sem ela, nem mesmo a dura na queda D. radiodurans aguentaria o tranco. A não ser, claro, que os micróbios estivessem debaixo d’água. Água é ainda melhor que atmosfera para barrar ultravioleta.

O trabalho mostrou que E. coli poderia sobreviver a uma superexplosão solar se estivesse a 28 metros de profundidade, e a D. radiodurans, a modestos 12 metros.

Os resultados, aceitos para publicação no periódico Astrobiology, ajudam a explicar porque durante tanto tempo a vida na Terra esteve limitada aos oceanos. Somente depois que bactérias descobriram a receita da fotossíntese e começaram a oxigenar a atmosfera, criando uma camada protetora de ozônio, outras formas de vida tiveram chance real de colonizar terra firme.

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Sapiens compartilhou a Terra com outras espécies humanas no passado recente, diz antropólogo https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/08/17/sapiens-compartilhou-a-terra-com-outras-especies-humanas-no-passado-recente-diz-antropologo/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/08/17/sapiens-compartilhou-a-terra-com-outras-especies-humanas-no-passado-recente-diz-antropologo/#comments Thu, 17 Aug 2017 09:00:14 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/08/conexao-walter-neves-180x101.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6738 Apenas 30 mil anos atrás — um piscar de olhos do ponto de vista evolutivo –, falar em espécie humana imediatamente traria uma outra pergunta: qual das espécies humanas? De acordo com o antropólogo evolutivo Walter Neves, da Universidade de São Paulo, a situação atual, em que só há um tipo de humano no planeta inteiro, o Homo sapiens, é um ponto completamente fora da curva na nossa linhagem evolutiva.

“Esse negócio de ter só uma espécie [humana] no planeta — nós, infelizmente — é de 30 mil anos para cá”, disse Neves ao Mensageiro Sideral. “É uma exceção absoluta à evolução da linhagem humana. Há 30 mil anos — só 30 mil, não é nada — nós tínhamos no planeta: Homo sapiens, Homo neanderthalensis, Homo erectus, denisovanos, Homo floresiensis e talvez algum resquício de Homo heidelbergensis. Então, essa coisa de ter só uma espécie humana no planeta no mesmo momento é uma exceção.”

Todas essas espécies humanas do passado tiveram grande sucesso evolutivo, e algumas delas até fazem com que o Homo sapiens não pareça grande coisa. Se por um lado os mais antigos fósseis do ser humano moderno têm cerca de 200 mil anos, por outro lado sabemos que os Homo erectus existiram na Terra por mais de 1 milhão de anos. Ainda temos que comer muito feijão com arroz para quebrar esse recorde de sobrevivência, e há quem duvide que Kim Jong-un e Donald Trump estejam a fim de permitir que a gente chegue lá. (Em tempo: o Mensageiro Sideral é otimista a esse respeito.)

De toda forma, uma dos traços marcantes da evolução humana é o crescente aumento do cérebro e da inteligência. Por que isso aconteceu? Segundo Neves, o resultado não é tão inesperado.

“Existem algumas estruturas que, quando surgem, trazem grande adaptabilidade ao organismo. Um exemplo disso são os olhos. A estrutura ‘olho’ surgiu 40 vezes de forma independente na evolução. Por quê? Oras, você conseguir enxergar ao seu redor tudo que está acontecendo, principalmente a presença de predadores, dá uma grande adaptabilidade”, afirma.

Para o antropológo evolutivo, o surgimento do cérebro mais avantajado e uma inteligência mais sofisticada entram nessa categoria. “Inteligência é uma dessas coisas que traz grande adaptabilidade, não só porque isso permite você viver e manejar contextos sociais mais complexos, manejar tudo que está acontecendo em volta e inclusive arrumar soluções tecnológicas”, diz Neves.

E essa tendência não estaria limitada à linhagem humana, segundo o pesquisador. “Parece que há outros exemplos na linhagem de mamíferos onde você vê também um aumento, não tão exagerado quanto o nosso, do tamanho do cérebro ao longo do tempo. E se forças seletivas ambientais existirem e existir variabilidade na população para isso, provavelmente é um traço que vai ser fixado pela seleção natural. Então eu acho que [a nossa inteligência] não é simplesmente obra de deriva genética. Eu acho que de fato você tem uma seleção para adaptabilidade.”

Isso, é claro, interessa diretamente a quem se pergunta sobre a possibilidade de haver vida inteligente fora da Terra. Mesmo que haja condições adequadas para a evolução biológica em outros planetas, ainda há grande incerteza sobre a probabilidade de evolução de civilizações tecnológicas como a nossa lá fora justamente porque, ao menos na história da Terra, o surgimento de tecnologia sofisticada foi um fenômeno até agora restrito a uma única linhagem — a nossa –, em cerca de 4 bilhões de anos de evolução. Não é decerto algo tão comum quanto “olhos”, mas pode também não ser puramente um acidente evolutivo.

Confira a seguir a entrevista completa com Walter Neves, em que ele comenta, entre outras coisas, a descoberta recente de fósseis ancestrais do Homo sapiens com 300 mil anos em Marrocos e os progressos da compreensão que os antropólogos têm da evolução humana, em mais um episódio da série CONEXÃO SIDERAL.

Para ver episódios anteriores da série, clique aqui.

E uma dica para quem se interessa para valer por este assunto: a reportagem de capa da edição de agosto da revista “Superinteressante”, que já está nas bancas, é justamente sobre a saga da evolução humana. Assinada por este escriba, ela vai além do breve resumo da evolução biológica que abre o best-seller “Sapiens”, do historiador Yuval Harari, e aborda os mais novos achados de fósseis — dentre eles os ancestrais humanos de 300 mil anos de Marrocos –, bem como as mais recentes evidências genéticas — a exemplo do sequenciamento do genoma de neandertais e denisovanos –, para apresentar a noção de que o Homo sapiens não é o resultado de uma simplória escadinha evolutiva, mas sim fruto de um longo processo de miscigenação e convívio de diferentes espécies humanas ao longo dos últimos milhões de anos.

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Talvez as leis da natureza não possam ser explicadas, diz astrofísico israelo-americano https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/07/06/talvez-as-leis-da-natureza-nao-possam-ser-explicadas-diz-astrofisico-israelo-americano/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/07/06/talvez-as-leis-da-natureza-nao-possam-ser-explicadas-diz-astrofisico-israelo-americano/#comments Thu, 06 Jul 2017 23:30:37 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/07/conexao-mario-livio-180x101.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6542 Conforme avançamos na compreensão científica do Universo, temos cada vez mais esperança de entender exatamente o que levou à existência dele e, em última análise, à nossa. Mas isso pode muito bem ser uma missão impossível, segundo o astrofísico israelo-americano Mario Livio.

“Teremos de admitir que talvez nem todas as coisas que chamamos de leis da natureza podem ser explicadas a partir de princípios fundamentais”, disse Livio ao Mensageiro Sideral.

O pesquisador passou boa parte de sua carreira se dedicando ao estudo da energia escura no STScI (Instituto de Ciência do Telescópio Espacial), organização que gerencia a operação do Hubble, nos EUA, e acaba de publicar seu livro mais recente no Brasil.

Chamado “Tolices Brilhantes”, ele aborda cinco grandes erros cometidos por cientistas geniais — Charles Darwin, lorde Kelvin, Linus Pauling, Fred Hoyle e Albert Einstein — e, com isso, tenta mostrar como o progresso da ciência não é aquela linha reta e certeira que costuma ser apresentada, mas um caminho sinuoso, cheio de armadilhas e becos sem saída.

A despeito dos avanços notáveis para explicar os alicerces do Universo, os físicos ainda enfrentam uma barreira fundamental: suas duas teorias-mestras, a relatividade geral e a mecânica quântica, não se bicam. A primeira explica a gravidade, a segunda as outras forças e partículas da natureza, e ambas são extremamente confiáveis, testadas e retestadas em inúmeros experimentos e observações.

Contudo, quando as duas precisam ser combinadas para resolver um problema físico, produzem resultados inconsistentes. Em geral, isso não produz grandes crises, porque as forças quânticas só operam nas menores escalas, e a gravidade só se faz sentir nas maiores. Ou seja, as duas não costumam se encontrar. Mas há exceções. E elas são dramáticas: o interior dos buracos negros e o próprio Big Bang, o grande evento que deu origem ao nosso Universo, há 13,8 bilhões de anos.

A única esperança de jogar luz sobre a raiz desses fenômenos é combinar efetivamente a relatividade geral e a mecânica quântica, e a teoria mais promissora no momento para realizar esse casamento improvável é a teoria das supercordas. É a noção de que o Universo na verdade tem várias dimensões espaciais além das três tradicionais e toda a matéria e energia do cosmos é composta por minúsculas cordas vibratórias nesse espaço-tempo multidimensional.

É uma ideia muito louca e, o que a torna a situação ainda mais mais tensa é que ninguém sabe no momento como testá-la experimentalmente. É o cenário perfeito para mais uma “tolice brilhante”, como as descritas no livro de Livio.

“Oh, tenho certeza de que teremos muitas tolices brilhantes [no futuro]”, diz o astrofísico. “Quer dizer, a teoria inteira das cordas pode acabar sendo uma tolice brilhante. Não há dúvida de que é brilhante, que introduziu fantástica matemática nova, um conjunto inteiro de conceitos maravilhosos, mas a teoria pode acabar não explicando, no fim do dia, a unificação da relatividade geral com a mecânica quântica, então, aquela teoria inteira pode acabar sendo uma tolice brilhante.”

Claro que ninguém está disposto a desistir. Mas Livio admite que talvez as propriedades fundamentais do Universo — as leis físicas que o regem, que viabilizam nossa existência e que são descritas por nossas teorias — não possam ser deduzidas a partir de princípios fundamentais.

A rigor, já aconteceu antes. “Sabe, algumas centenas de anos atrás, Kepler pensou que o número de planetas no Sistema Solar tinha de ser explicado por princípios fundamentais. E agora, claro, nós sabemos agora que isso é um acidente — quantos planetas há num sistema”, diz Livio.

“Então, talvez descubramos que algumas dessas coisas são variáveis acidentais e não coisas que venham de princípios fundamentais. Mas, sabe, ainda temos um bom caminho a trilhar. Espero que encontremos meio de gerar algumas predições.”

Confira a seguir a entrevista completa (legendada) em que Livio fala sobre isso e discute um a um os grandes erros listados em seu livro “Tolices Brilhantes”. E, logo abaixo, a resenha do Mensageiro Sideral sobre a obra, publicada no último domingo na Folha.

Astrofísico lista em livro erros geniais de grandes cientistas

Ideias científicas revolucionárias carregam sempre consigo uma grande dose de risco. Afinal, se são revolucionárias, ninguém as teve antes. Se ninguém as teve, ninguém as testou. E se ninguém as testou, há boa chance de que estejam erradas.

Por isso admiramos os grandes cientistas, aqueles que promoveram saltos no modo de entendermos o mundo. Quando eles acertam em cheio em grandes alvos, tendemos a desprezar seus erros. Cria-se o mito de que grandes mentes não cometem enganos.

Para desmanchar essa impressão, o astrofísico israelo-americano Mario Livio escreveu “Tolices Brilhantes” (350 págs., R$ 52,90, Editora Record), um livro que aborda grandes erros cometidos por grandes cientistas.

Conhecido por seu trabalho de décadas no Instituto de Ciência do Telescópio Espacial (STScI), em Baltimore (EUA), Livio coleciona em seu livro uma lista de exemplos de respeito: Charles Darwin, lorde Kelvin, Linus Pauling, Fred Hoyle e Albert Einstein.

Alguns, naturalmente, são mais conhecidos que outros, mas todos são tidos universalmente como grandes gênios da ciência. E todos tiveram um casca de banana para chamar de sua.

“É reconfortante para o resto de nós saber que até as maiores mentes cometem erros sérios”, disse Livio à Folha, mencionando uma das razões para ter escolhido este tema para o livro.

Ele admite, contudo, que há uma motivação mais profunda.

“O modo como o progresso na ciência e, de fato, nos empreendimentos mais criativos, é descrito quando você aprende sobre ele na escola, na universidade e na imprensa, é sempre como se fosse um tipo de caminho direto, uma marcha para a verdade, de A até B. E qualquer um que já tenha se engajado nesses empreendimentos sabe que nada poderia estar mais longe da verdade.”

Ao enfatizar que, mesmo para os mais bem-sucedidos pesquisadores, esse caminho é tortuoso, Livio espera levar ao público uma visão mais madura de como o edifício da ciência é construído.

“Ela progride em um caminho de zigue-zague”, diz. “Nós temos muitos falsos inícios e muitos becos sem saída. Em muitas ocasiões você precisa retornar ao ponto de partida e assim por diante.”

ERROS GENIAIS

O pesquisador enfatiza –e fica claro no livro– que a intenção jamais foi denegrir a imagem desses cientistas, e sim mostrar o processo natural de progresso científico.

“Você vai notar que meu livro é chamado ‘Tolices Brilhantes’. Não é chamado ‘Tolices Toscas'”, brinca Livio.

“Esses não são erros que as pessoas cometeram porque foram descuidadas. Todos esses enganos foram feitos com reflexão cuidadosa sobre eles, e todos os erros que eu descrevo no livro no fim das contas levaram de fato a avanços.”

Ao eleger seus cinco “alvos”, Livio se preocupou em não recuar demais no tempo, limitando-se a meados do século 19, e em escolher de fato grandes cientistas (“e não só, sabe, cientistas OK”).

Além disso, o leitor há de perceber que há um fio da meada que conecta os escolhidos. “É a palavra ‘evolução'”, explicita o autor. “Evolução da vida na Terra, evolução da própria Terra, evolução das estrelas e evolução do Universo como um todo.”

NOVAS PERSPECTIVAS

Para quem é menos familiarizado com a história da ciência, talvez os nomes de Kelvin e Hoyle soem menos familiares do que os os outros três. Com efeito, esses dois, a despeito de suas realizações notáveis, são mais lembrados por seus erros do que por seus acertos.

Em ambos os casos, Livio promove um salutar esforço de reabilitação. Embora Kelvin estivesse fundamentalmente errado em sua estimativa da idade da Terra, feita no final do século 19, ela foi a primeira tentativa séria –e baseada em física fundamental– de calcular em que época nosso planeta se formou. Um primeiro passo essencial para abrir essa discussão.

No caso de Hoyle, a situação era ainda mais grave. Sua teoria do estado estacionário –formulada de modo a eliminar o Big Bang e manter o Universo mais ou menos igual ao longo de toda a eternidade– era brilhante de fato.

Infelizmente, calhou de estar errada. E quando as evidências penderam para o lado do Big Bang, Hoyle não soube degluti-las.

“Embora [Kelvin e Hoyle] fossem realmente geniais, não há dúvida disso, eles teimosamente continuavam a se apegar às suas coisas que eram erros”, diz Livio.

Ele contrapõe o caso dos dois ao de Linus Pauling, o químico brilhante que decifrou, usando apenas conhecimento teórico e muito pouca informação de observações, a estrutura básica das proteínas.

Quando Pauling tentou aplicar o mesmo método para decifrar a estrutura do DNA, fracassou, dando espaço para James Watson e Francis Crick apresentarem a estrutura correta, em 1953.

“Pauling percebeu que estava errado, reconheceu isso poucos meses depois e admitiu que o modelo de Watson e Crick era melhor, e assim por diante”, diz Livio.

“Lorde Kelvin não aceitou até o dia de sua morte que não estava errado em nada, e Fred Hoyle continuou a acreditar em uma forma ou outra do Universo em estado estacionário também até o dia em que morreu.”

O TOPO DA LISTA

As vedetes do livro, naturalmente, são Darwin e Einstein –indiscutivelmente os dois cientistas mais influentes dos últimos 200 anos.

No caso do primeiro, Livio atribui a ele a dificuldade de perceber uma inconsistência interna em seu próprio trabalho, ao adotar, no bojo da teoria da evolução por seleção natural, um mecanismo de hereditariedade “por mistura”, então vigente na época, mas completamente inconsistente com sua própria teoria.

O problema perseguiria Darwin pelos anos seguinte e só seria resolvido quando os trabalhos de Gregor Mendel fossem descobertos, fornecendo pistas do real mecanismo de hereditariedade –este totalmente compatível com a evolução darwiniana.

Já com Einstein, o caso é bastante conhecido: a famosa constante cosmológica, que ele introduziu às equações da relatividade geral em 1917 por razões puramente ideológicas –para manter o Universo estático.

Depois que Edwin Hubble provou que o cosmos estava em expansão, Einstein abandonou a constante cosmológica, e a rotulou como um grande erro de sua carreira.

Livio, contudo, dá um giro de 180 graus e sugere que o erro de Einstein não foi ter incluído a constante cosmológica, e sim tê-la retirado, depois de tê-la criado.

Hoje, ela é usada rotineiramente para representar a energia escura, uma misteriosa força que acelera a expansão do Universo e foi descoberta em 1998.

Com uma prosa agradável e grandes sacadas, Livio conduz o leitor de forma suave por biologia, geofísica, astrofísica e cosmologia, mostrando as interconexões entre os saberes científicos e a unicidade do mecanismo que permite o progressivo caminhar da ciência –permeado de erros de percurso que, longe de embaraçar, são a chave para que se possa aprender cada vez mais.

Grandes cientistas, erros homéricos

Livro do astrofísico israelo-americano Mario Livio retrata como, a despeito de sua genialidade, heróis da ciência podem cometer grandes equívocos

CHARLES DARWIN (1809-1882)

Ilustração Carolina Daffara/Editoria de Arte/Folhapress
Darwin

O GRANDE SUCESSO: Pai da evolução das espécies por seleção natural, Darwin produziu possivelmente a teoria científica mais influente e bombástica da história da ciência.

O ERRO: Ao construir sua teoria, Darwin não notou que o modelo de hereditariedade de características então em voga, usado por ele mesmo em sua obra, era completamente inconsistente com a ideia central de sua teoria.

A CORREÇÃO: Ela já existia na época de Darwin, mas não era conhecida por ele: os estudos genéticos de hereditariedade feitos por Gregor Mendel.

LORDE KELVIN (1824-1907)

Ilustração Carolina Daffara/Editoria de Arte/Folhapress
Lord Kelvin

O GRANDE SUCESSO: Gênio inconteste e grande pesquisador da termodinâmica, Kelvin era conhecido por sua incrível capacidade de cálculo e foi o primeiro a produzir uma estimativa física da idade da Terra, com base no tempo que ela levaria para se resfriar.

O ERRO: O número a que ele chegou foi de 20 milhões a 100 milhões de anos _muito menos que o real, 4,5 bilhões de anos. Kelvin foi incapaz de admitir que incompreensões sobre a dinâmica interna da Terra podiam levar a uma margem de erro imensa.

A CORREÇÃO: A descoberta da radioatividade e, sobretudo, dos movimentos de convecção no interior da Terra permitiriam explicar por que Kelvin havia errado em seus cálculos.

LINUS PAULING (1901-1994)

Ilustração Carolina Daffara/Editoria de Arte/Folhapress
Linus Pauling

O GRANDE SUCESSO: Químico brilhante, ganhador de dois Nobel, Pauling havia conseguido decifrar, com base apenas nas propriedades dos átomos, a estrutura da alfa-hélice, a base das proteínas.

O ERRO: Aplicando o mesmo método para tentar decifrar a estrutura do DNA, Pauling chegou a uma tripla hélice, estrutura muito mais complexa que a molécula verdadeira e que chegava a contrariar princípios estabelecidos da química.

A CORREÇÃO: Depois de cometerem erro similar ao de Pauling, James Watson e Francis Crick tiveram acesso a imagens de cristalografia do DNA que permitiram guiá-los na direção correta e apresentar a estrutura correta em 1953.

FRED HOYLE (1915-2001)

Ilustração Carolina Daffara/Editoria de Arte/Folhapress
Fred Hoye

O GRANDE SUCESSO: Astrônomo britânico arrojado, Hoyle foi o primeiro a explicar com sucesso como as estrelas podem produzir os átomos mais pesados, a partir dos mais leves, gerando toda a variedade química do Universo.

O ERRO: Hoyle concebeu uma teoria alternativa à do Big Bang, chamada de teoria do espaço estacionário. Nela, o Universo estaria sempre em expansão, mas seria eterno e imutável, com mais matéria sendo criada em seu interior conforme se expandisse.

A CORREÇÃO: Com o tempo, observações adicionais, como a descoberta da radiação cósmica de fundo, descartaram a teoria do estado estacionário, confirmando o Big Bang. Hoyle, no entanto, jamais admitiu seu erro.

ALBERT EINSTEIN (1879-1955)

Ilustração Carolina Daffara/Editoria de Arte/Folhapress
Einstein

O GRANDE SUCESSO: Com sua teoria da relatividade geral, Einstein permitiu pela primeira vez que se estudasse o Universo inteiro e, com isso, especular sobre sua origem e destino. Para isso, ele introduziu um novo termo às equações, a constante cosmológica.

O ERRO: A principal função da constante cosmológica, para Einstein, era permitir a existência de um Universo estático. Quando ficou claro que o cosmos estavam em expansão, o físico alemão abandonou e repudiou a alteração, classificando-a como um erro. Para Livio, contudo, o erro foi tê-la jogado fora, depois de tê-la criado.

A CORREÇÃO: Em 1998, estudando supernovas distantes, astrônomos descobriram que a expansão do Universo era acelerada – algo surpreendente que só pode ser explicado pela existência de algo similar ao que era descrito pela constante cosmológica de Einstein. Os físicos chamam essa força misteriosa de “energia escura”.

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Pesquisadores descobrem fósseis de algas vermelhas com 1,6 bilhão de anos https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/03/16/pesquisadores-descobrem-fosseis-de-algas-vermelhas-com-16-bilhao-de-anos/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/03/16/pesquisadores-descobrem-fosseis-de-algas-vermelhas-com-16-bilhao-de-anos/#comments Thu, 16 Mar 2017 03:02:18 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/03/alga-vermelha-180x101.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6115 Um quarteto de pesquisadores do Museu Sueco de História Natural diz ter identificado, em rochas na Índia, os mais antigos fósseis preservados de algas vermelhas. Eles teriam 1,6 bilhão de anos — 400 milhões de anos mais antigos que o recorde anterior para esse grupo de seres vivos — e sugerem que a vida complexa emergiu na Terra mais cedo do que antes se suspeitava.

Ainda há grande incerteza sobre a época em que surgiram os primeiros eucariontes — o grupo de criaturas mais sofisticadas da Terra, que tem núcleo diferenciado em suas células. Uma estimativa recente com base em análises genéticas sugerem que o último ancestral comum de todos esses seres — que englobam desde as amebas até os seres humanos, passando pelas plantas — viveu entre 1,9 bilhão e 1,6 bilhão de anos atrás.

Por isso é surpreendente a presença de rodófitas, as famosas algas vermelhas, há 1,6 bilhão de anos. Isso porque a maioria delas não só é eucarionte, mas também é multicelular — um segundo salto no caminho da complexidade biológica.

Não é à toa que, durante anos, esses resquícios fósseis localizados na bacia Vindhyan, na Índia central, foram interpretados como sendo muito mais recentes, a despeito das datações de rochas — baseadas em decaimento radioativo e bem confiáveis — indicarem a idade de 1,6 bilhão de anos.

Quem bateu na tecla de que eles eram mesmo tão antigos assim, num estudo publicado em 2009, foi justamente o mesmo grupo que agora voltou à carga, para descrever detalhadamente os resquícios das rodófitas. O trabalho claramente revela a natureza multicelular dos fósseis, ao detalhar sua estrutura tridimensional graças a uma técnica de microscopia tomográfica de raios X com radiação síncrotron.

Reconstrução tridimensional dos fósseis por microscopia tomográfica. (Crédito: S. Bengtson et al.)

“Esses fósseis predatam as algas vermelhas mais antigas reconhecidas por cerca de 400 milhões de anos, sugerindo que os eucariontes podem ter uma história mais longa do que comumente presumido”, dizem Stefan Bengtson e seus colegas, em artigo publicado na “PLoS Biology”.

Apesar do entusiasmo dos autores, não conte com um consenso rápido por parte de toda a comunidade científica. É bem provável que esses fósseis continuem em disputa, assim como outros possíveis traços de criaturas multicelulares encontrados com datas ainda mais antigas.

Aos poucos, no entanto, a pilha acumulada de estudos começa a cristalizar a noção de que os eucariontes podem ter tido um caminho mais longo e tortuoso na árvore da vida do que geralmente se pensava.

Recentemente, inclusive, o Mensageiro Sideral abordou um estudo independente que mostrou que o surgimento de condições para suportar vida complexa, com o aumento de oxigênio no mar e na atmosfera, emergiu na Terra pela primeira vez mais de 2 bilhões de anos atrás. Se isso de fato aconteceu, essas rodófitas estiveram entre as beneficiárias — e contribuintes, uma vez que são seres vivos fotossintetizantes — do ambiente mais amigável à vida complexa.

A descoberta é quase como um trailer de um filme. A história completa de nossa linhagem evolutiva primordial ainda está por ser contada, claro, mas já está claro a essa altura que a saga da vida na Terra, reconstruída passo a passo pela ciência, é fascinante e cheia de nuances. Ficamos no aguardo do próximo emocionante capítulo.

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Minha solução da equação de Drake https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/12/11/minha-solucao-da-equacao-de-drake/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/12/11/minha-solucao-da-equacao-de-drake/#comments Thu, 11 Dec 2014 07:59:01 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=2726 Quantas civilizações comunicativas — ou seja, transmitindo sinais que poderíamos em tese detectar — existem na Via Láctea? Essa talvez seja a pergunta mais intrigante a permear o campo da SETI, sigla inglesa para a busca por inteligência extraterrestre.

Quantas civilizações podemos esperar encontrar lá fora?
Quantas civilizações podemos esperar encontrar lá fora?

A estimativa desse parâmetro — que equivale à chance de encontrarmos outras sociedades alienígenas sem deixarmos nosso próprio Sistema Solar, só mantendo comunicações remotamente por rádio ou por laser, viajando à velocidade da luz — é expressa na famosa equação de Drake.

N = R* x fp x ne x fl x fi x fc x L

Não se assuste. É apenas uma sequência de parâmetros que, multiplicados, poderiam ser interpretados como uma estimativa do número de civilizações comunicativas em nossa galáxia. Veja como não tem muito mistério.

N = número de civilizações comunicativas na Via Láctea
R* = número de estrelas que nascem a cada ano na galáxia
fp = fração das estrelas que têm planetas
ne = número de planetas similares à Terra por sistema
fl = fração de planetas tipo Terra em que a vida evolui
fi = fração de planetas vivos com seres inteligentes
fc = fração de planetas com tecnologia de comunicação
L = tempo de vida médio de uma civilização comunicativa

Criada em 1961 pelo radioastrônomo americano Frank Drake na primeira reunião de SETI feita nos EUA, ela é até hoje a expressão suprema do quanto ainda não sabemos para responder adequadamente à pergunta: “Estamos sós no Universo?”

Em meu novo livro, “Extraterrestres”, apresentei detalhadamente toda a história da equação e algumas das estimativas mais famosas produzidas com base nela. Uma das mais otimistas, feita por Carl Sagan em 1966, sugeria a existência de 1 milhão de civilizações na Via Láctea. Já as mais pessimistas, representadas por pesquisadores como Don Brownlee, Peter Ward e Ernst Mayr, sugere que estamos efetivamente sozinhos na galáxia e, quiçá, no Universo. Na obra, furtei-me a fazer minha própria conta. Mas agora vai.

Recentemente, proferi uma palestra sobre a equação de Drake no ITA, em São José dos Campos, e aproveitei a deixa para refletir um pouco sobre os parâmetros expressos nela. Então aperte os cintos, porque em mais alguns parágrafos você saberá qual é a estimativa do Mensageiro Sideral acerca da possibilidade de detectarmos sinais de rádio de outras civilizações!

R*
(número de estrelas que nascem a cada ano na galáxia)
(grau de confiança: alto)

Esse talvez seja o único parâmetro que nunca foi controverso na equação. Ele consiste em basicamente estimar o total de estrelas na Via Láctea e dividir pelo tempo de existência da galáxia. Mas decidi assumir uma perspectiva conservadora e pensar apenas em estrelas similares ao Sol, dos tipos G e K. Elas correspondem a cerca de 20% do total da Via Láctea. Arredondando os números e calibrando com base em estimativas mínimas, temos que a galáxia tem cerca de 10 bilhões de anos e aproximadamente 20 bilhões de estrelas G e K. Dividindo um pelo outro, temos que:

R* = 2

fp
(fração das estrelas que têm planetas)
(grau de confiança: alto)

Até 1995, não conhecíamos um exemplo sequer de planeta em torno de estrela similar ao Sol. De lá para cá, contudo, aumentamos muito esse valor, além de termos aprofundado a compreensão de como se formam os sistemas planetários. A essa altura, está praticamente confirmada a premissa de Giordano Bruno, segundo a qual cada estrela é um sol e possui sua própria família de planetas. Sabemos que a formação de mundos ao redor de estrelas é um processo natural. Nem todos os sistemas gerados acabarão em configurações estáveis, mas já se pode dizer que, em média, para cada estrela, pelo menos um planeta existe na Via Láctea. Logo:

fp = 1

ne
(número de planetas similares à Terra por sistema)
(grau de confiança: médio)

Um estudo feito por Erik Petigura e colegas, publicado no ano passado na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences”, usou dados do telescópio espacial Kepler para estimar a incidência de planetas potencialmente rochosos — similares em composição à Terra — em órbitas localizadas na zona habitável de suas estrelas — onde a quantidade de radiação é adequada para a manutenção de água líquida na superfície. O resultado foi animador: 22% das estrelas dos tipos G e K devem ter pelo menos um planeta potencialmente habitável. Uma Terra a cada cinco sóis! Logo:

ne = 0,2

fl
(fração de planetas tipo Terra em que a vida evolui)
(grau de confiança: baixo)

Uma coisa que os cientistas não gostam de admitir livremente, embora seja a mais pura verdade, é que não sabemos quais são os passos que levam ao surgimento da vida em planetas como a Terra. Temos uma boa ideia de quais são os pré-requisitos — água, química orgânica complexa e fontes de energia — e de quais as peças necessárias para a produção de vida como a conhecemos (RNA, DNA e aminoácidos encadeados em proteínas). Mas não sabemos em que ordem ou com que facilidade eles se produzem. A única informação que temos a esse respeito vem do registro fóssil na Terra. E ele sugere que a vida apareceu assim que as condições se fizeram adequadas (e um enorme bombardeio de asteroides cessou), cerca de 3,8 bilhões de anos atrás. O fato de que tudo foi rápido por aqui faz parecer que a vida é um desfecho natural de reações químicas. Por outro lado, como só temos um exemplo, talvez a Terra represente um caso à parte. Por isso é tão importante confirmar que Marte (ou qualquer outro lugar) também teve vida. Confirmaria essa premissa de que a vida surge sempre que as condições são adequadas. Por ora, temos indícios fracos e indiretos de que pode ter havido vida em Marte, mas nada conclusivo. Da mesma maneira, a ciência demonstrou em laboratório várias reações químicas essenciais ao surgimento da biologia. Então, ainda que isso seja um tiro no escuro, parece mesmo que não há nada de particularmente improvável com a vida. Dando um salto de fé, o Mensageiro Sideral estima que:

fl = 1

fi
(fração de planetas vivos com seres inteligentes)
(grau de confiança: baixíssimo)

Essa talvez seja uma questão que pode ser mais bem avaliada se a quebramos em duas. Pois são dois os passos necessários para saltar de vida simples, unicelular, para nós. Precisamos primeiro atingir o estágio de vida complexa, multicelular. E somente depois partimos para vida inteligente. Na Terra, o surgimento da vida complexa ainda é um mistério. Depois de cerca de 3 bilhões de anos de vida unicelular, de repente, uma multidão de formas animais e vegetais começou a aparecer. O que levou a isso? Não sabemos, mas há indícios de que esse passo evolutivo esteja atrelado ao aumento de oxigênio atmosférico, que por sua vez teve ligação, ao menos aqui, com o advento da fotossíntese em bactérias. Mas essa oxigenação atmosférica não parece ser um desfecho certeiro da evolução da vida simples. Ela depende das circunstâncias geológicas e astronômicas envolvidas. Exemplo: planetas em torno de estrelas anãs vermelhas podem ter sua atmosfera enriquecida em oxigênio sem nem receber ajuda de formas de vida fotossintetizantes. Por outro lado, dependendo do tamanho dos oceanos e do nível de atividade vulcânica visto num planeta, ele pode ser mais ou menos capaz de absorver o oxigênio produzido sem que ele se acumule no ar. Tomando a vida terrestre como base, durante cerca de três quartos de sua existência o nível de oxigênio foi insuficiente para a vida complexa. Podemos então estimar a probabilidade do salto para a vida complexa em 25% (0,25).

E depois que a vida complexa surge, é certo que uma espécie inteligente como nós irá aparecer? De jeito nenhum. Mais uma vez, deparamos com uma estimativa difícil de fazer. Afinal, não sabemos o que leva à inteligência. Alguns craques da biologia, como Ernst Mayr, sugerem que é um desfecho vastamente improvável, haja vista que apenas uma linhagem evolutiva, dentre bilhões de espécies que já viveram sobre a Terra, chegou lá. O que talvez ele não leve em conta é que qualquer planeta com uma biosfera acabará produzindo bilhões de espécies, o que meio que anula o argumento na base da força bruta. Uma pista que considero mais concreta reside no fato de que, em circunstâncias de estabilidade ambiental, a evolução acaba empacando. Isso explica por que há criaturas que permaneceram praticamente inalteradas por centenas de milhões de anos — o ambiente em que elas vivem também pouco mudou. Ou seja, se vivêssemos num “planeta-marasmo”, em que nada acontece no ambiente, provavelmente a chance de surgir uma espécie inteligente cairia bastante. Mas esse não foi o caso da Terra, nem deve ser o estado geral dos planetas no Universo. Sabemos que, nos últimos 500 milhões de anos, a Terra passou por cinco grandes extinções em massa. São basicamente “resets” na história da vida, em que a evolução é desafiada a começar tudo de novo, quase do zero. Isso, na minha modesta opinião, deve aumentar a chance de evolução de criaturas inteligentes. Exemplo: se os dinossauros não tivessem sido extintos por um asteroide, 65 milhões de anos atrás, não haveria chance para a evolução dos mamíferos de grande porte, dentre os quais a linhagem dos primatas se notabilizaria pelo surgimento de um macaco sem rabo que pegou a mania de se chamar de Homo sapiens. Em resumo, a Terra teve cerca de 500 milhões de anos de vida complexa e, com cinco resets, sabemos que pelo menos um produziu uma espécie inteligente. Tratando como típico um sucesso em cinco tentativas, o Mensageiro Sideral estima a probabilidade de vida complexa se converter em inteligente em 20% (0,2).

Juntando as duas estimativas, temos que fi = 0,25 x 0,2.

fi = 0,05

fc
(fração de planetas com tecnologia de comunicação)
(grau de confiança: baixo)

Não basta ser inteligente; é preciso ser comunicativo. Ou seja, no mínimo precisamos criar radiotelescópios capazes de transmitir e captar sinais com potência para atravessar a distância entre as estrelas. Pergunta: será que o destino manifesto da humanidade (ou de qualquer outra civilização) é desenvolver a tecnologia até no mínimo este ponto?

Difícil dizer. Por um lado, o fato de vermos até hoje culturas de caçadores e coletores convivendo com sociedades movidas a internet sugere que a humanidade não tinha um traçado pré-definido. Por outro lado, vemos muitas invenções e descobertas sendo feitas diversas vezes ao longo da história, sugerindo que há certos padrões incontornáveis, se houver tempo suficiente. Além disso, precisamos levar em conta que o tempo envolvido na evolução cultural é muito pequeno comparado às escalas astronômicas. Ainda que tenhamos levado 200 mil anos para ir de homens das cavernas a tuiteiros, isso é uma fração pequena de tempo diante do tempo de vida do Sistema Solar, ou mesmo do bem mais modesto tempo médio até o próximo reset biológico (considerando a média de um reset a cada 100 milhões de anos, ainda temos 35 milhões de anos pela frente). Isso me leva a pensar que, eventualmente, toda sociedade inteligente acaba por se tornar comunicativa. Logo:

fc = 1

L
(tempo de vida médio de uma civilização comunicativa)
(grau de confiança: baixo)

Quanto tempo vive uma sociedade que já desenvolveu radiotelescópios e os utiliza para comunicação interestelar? Em outras palavras, quanto tempo podemos esperar sobreviver neste planeta e permanecer focados em busca por alienígenas através de ondas de rádio? Aqui também a controvérsia é enorme. Não escapou aos cientistas, desde a primeira formulação da equação de Drake, que as armas nucleares e os mísseis balísticos surgiram na mesma época dos radiotelescópios e das espaçonaves. Será que estamos condenados à autodestruição?

Outra pergunta igualmente sutil diz respeito ao nosso nível tecnológico. Por quanto tempo os radiotelescópios nos parecerão a melhor forma de comunicação interestelar? Será que tecnologias melhores aparecerão no futuro, fazendo parecer que tentar falar com ETs por rádio é tão tosco quanto tentar mandar mensagens de fumaça para contatar potenciais marcianos? Não sei. Talvez a radiação eletromagnética seja mesmo a melhor opção de comunicação. Talvez todas as civilizações morram logo depois de atingir sua maturidade comunicativa. Por isso, decidi ser mais uma vez conservador, baseando meu chute no que acredito ser o mínimo realista para a humanidade. Tivemos praticamente um século de radiotelescópios e podemos perfeitamente ter pelo menos mais um. Logo:

L = 200 anos

 

A RESPOSTA

Aposto que você está louco para multiplicar todos esses fatores. Vamos lá?

N = R* x fp x ne x fl x fi x fc x L

N = 2 x 1 x 0,2 x 1 x 0,05 x 1 x 200 = 4

Ou seja, neste exato momento, na Via Láctea, se os chutes do Mensageiro Sideral estiverem calibrados, devemos ter outras três civilizações além de nós aptas a captar e transmitir sinais de rádio. Levando em conta o tamanho da Via Láctea e o número enorme de estrelas nela, é extremamente improvável que qualquer esforço de SETI produza um resultado. Seria como encontrar ao menos uma de três agulhas num palheiro de 100 bilhões de estrelas. Por essa perspectiva, não surpreende que nenhum dos esforços de escuta nas últimas cinco décadas tenha produzido algum resultado.

Ainda assim, considero esses números extremamente entusiasmantes. Se decidirmos supor que supercivilizações existem e vivem ainda por muito tempo depois que seus radiotelescópios se tornam obsoletos — digamos, 200 mil anos, o tempo de vida da espécie humana –, temos que há 4.000 supercivilizações na galáxia!

Alternativamente, podemos pensar que supercivilizações não existem e que qualquer sociedade se extingue rapidamente depois de adquirir tecnologias comunicativas. Ainda assim, se o tempo de vida de uma espécie inteligente for de 200 mil anos, como o nosso, temos 4.000 civilizações tão modestas quanto a nossa, ou mais, na Via Láctea.

Isso sem falar na implicação para vida de qualquer tipo. Se estimarmos, de forma conservadora, que a vida, uma vez instalada num planeta, subsiste em média por 1 bilhão de anos (na Terra já se foram quase 4 bilhões!), podemos esperar encontrar 400 milhões de planetas com vida na Via Láctea! Uma estrela a cada 50 similares ao Sol teria um mundo vivo. Se você se lembrar do fato de que existem cerca de 1.250 estrelas dos tipos G e K num raio de 100 anos-luz da Terra, temos outros 25 mundos com vida, só nas vizinhanças.

É por isso tudo que, apesar de ser cético quanto às possibilidades de sucesso via SETI, eu acredito muito que descobriremos em breve (coisa de duas décadas) sinais de vida na atmosfera de planetas em sistemas vizinhos.

E, como último lembrete, não custa mencionar que deixei de fora do cálculo as anãs vermelhas, estrelas menores que o Sol que perfazem 76% do total na Via Láctea. Se elas puderem ser incluídas, todos esse números acima podem ser multiplicados por cinco!

É um vasto Universo e, parafraseando um sujeito mais esperto que eu, mal colocamos os pés na água do oceano cósmico. Tempos entusiasmantes estão adiante de nós. Se sobrevivermos para contar a história, claro.

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O segredo da evolução animal https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/11/03/o-segredo-da-evolucao-animal/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/11/03/o-segredo-da-evolucao-animal/#comments Mon, 03 Nov 2014 07:58:22 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=2474 É uma das mais intrigantes perguntas já feitas sobre a biologia: o que fez com que alguns organismos abandonassem a simplicidade da vida unicelular, seguida com rigor durante bilhões de anos, e evoluíssem para atingir a complexidade vista no reino animal hoje? Foi um golpe de sorte? Acaso? Ou algo mais aconteceu? Segundo um grupo de pesquisadores americanos, a mudança estava no ar. Literalmente.

Na Terra primitiva, a atmosfera pobre em oxigênio "barrou" a evolução animal por bilhões de anos.
Na Terra primitiva, a atmosfera pobre em oxigênio “barrou” a evolução animal por bilhões de anos.

Resultados de análises de rochas colhidas em sedimentos antigos na China, na Austrália, no Canadá e nos Estados Unidos mostram que o momento em que o reino animal deu seus primeiros passos coincidiu com um brutal aumento da presença de oxigênio no ar.

Os pesquisadores liderados por Timothy Lyons, da Universidade da Califórnia em Riversidade, e Noah Planavsky, da Universidade Yale, investigaram especificamente a presença de certas variedades de cromo nessas amostras. Sabe-se que a presença de oxigênio no ar oxida esse elemento, deixando uma “assinatura” na rocha que permite estimar sua quantidade na atmosfera.

As rochas analisadas tinham entre 1,8 bilhão e 800 milhões de anos. Ou seja, elas correspondiam a um período em que não havia ainda vida animal em nosso planeta. Não por acaso, esse período é vulgarmente referido pelos pesquisadores como “o bilhão aborrecido”.

Por outro lado, como uma espécie de contraprova, eles testaram também sedimentos mais recentes, com idades entre 445 milhões e 90 milhões de anos, período em que já se sabe que a presença de oxigênio na atmosfera era significativa (dinossauro respirava pra caramba!).

As medições confirmaram isso sobre os períodos mais recentes, mostrando a validade da técnica, mas também revelaram um fato importante sobre o “bilhão aborrecido” — a presença de oxigênio no ar naquela época não chegava a 0,1% da quantidade atual. Só para lembrar, hoje esse gás perfaz cerca de 20% da nossa atmosfera (os outros 80% são nitrogênio, e demais gases figuram apenas em quantidades-traço).

COINCIDÊNCIA OU CONSEQUÊNCIA
O que há de tão interessante nisso? Não é tanto a relação entre oxigênio e vida animal, que já é meio óbvia. (Tente ficar sem respirar.) Já sabíamos que a manutenção de seres multicelulares complexos exige um metabolismo poderoso, que por sua vez, até onde sabemos, obrigatoriamente demanda quantidades significativas de oxigênio.

O que realmente faz os cientistas coçarem a cabeça é o seguinte: uma vez que você tem quantidades significativas de oxigênio na atmosfera, o salto para vida complexa é natural, ou foi preciso também uma grande dose de sorte evolutiva para acontecer?

Se os cientistas tivessem determinado que o “bilhão aborrecido” teve quantidades significativas de oxigênio, seríamos obrigados a imaginar que o salto para a vida complexa foi um golpe de sorte genético, que aconteceu muito tempo depois que as condições se mostraram favoráveis a ela.

Em vez disso, os pesquisadores verificaram que o aumento de oxigênio acontece praticamente na mesma época em que os fósseis animais começam a proliferar pela Terra. Uma coisa parece estar de fato ligada à outra. O desafio da vida complexa é meramente o desafio da oxigenação da atmosfera. A julgar pela coincidência no tempo, o desafio evolutivo, em si, é trivial.

A essa altura, você deve imaginar onde quero chegar. O trabalho sugere que, onde há vida simples e há fotossíntese produzindo oxigênio a ponto de ele se acumular na atmosfera, o surgimento da vida complexa parece ser uma consequência quase inevitável. A natureza, ao que tudo indica, privilegia a complexidade.

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Se o trabalho, publicado na última edição da revista “Science”, estiver certo, temos aí uma grande chance de que muitos planetas espalhados pelo Universo também tenham vida animal. O surgimento de criaturas multicelulares complexas não parece mais ser um improvável acidente evolutivo, mas apenas o desfecho natural de um processo bioquímico relativamente simples. (Só para torturar você ainda mais, saiba que existem evidências de que a atmosfera de Marte chegou a ser altamente oxigenada em seu passado remoto, quando ele era ainda quente e úmido.)

Vida complexa, claro, não é garantia de vida inteligente. Mas trata-se de um passo essencial para chegar lá. (Eu, pelo menos, nunca vi uma bactéria inteligente. E o Doutor Bactéria não conta.)

Claro, uma coisa que não sabemos é por que teria levado tanto tempo para a Terra acumular oxigênio no ar. Ele é fabricado pela fotossíntese, uma invenção antiga implementada por bactérias mais de 3 bilhões de anos atrás. Os cientistas acreditam que o primeiro grande momento de oxigenação do ar se deu 2,3 bilhões de anos atrás, mas não teria perdurado. O que teria acontecido cerca de 800 milhões de anos atrás que levou a uma nova elevação do oxigênio, desta vez um caminho sem volta? Ninguém sabe ao certo.

De toda forma, fico só a imaginar quando, em coisa de uma década, os cientistas começarem a achar mundos fora do Sistema Solar com atmosferas ricas em oxigênio…

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O tic-tac da bomba populacional https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/09/18/o-tic-tac-da-bomba-populacional/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/09/18/o-tic-tac-da-bomba-populacional/#comments Thu, 18 Sep 2014 18:05:40 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=2283 Um novo estudo das Nações Unidas sugere que, ao contrário do que se pensava em análises anteriores, a população mundial não vai parar de crescer neste século. Segundo as projeções, atingiremos o ano de 2100 com 9,6 bilhões a 12,3 bilhões de pessoas vivendo no planeta Terra. Hoje somos 7,2 bilhões.

A população mundial não deve parar de crescer até o fim do século! Haja eletricidade!
A população mundial não deve parar de crescer até o fim do século! Haja eletricidade!

É um baque para quem estava contando com resultados anteriores, que sugeriam uma possível estabilização da população mundial em meados do século. Ao que tudo indica, isso não vai acontecer. Os cientistas apresentam um grau de confiança de 80% para a atual previsão de crescimento populacional.

“Muito do aumento deve acontecer na África, em parte pela fertilidade mais alta e por uma recente redução no ritmo de declínio de fertilidade”, afirma o artigo científico assinado por Patrick Gerland, do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU, e seus colegas. O trabalho foi publicado online hoje pela revista científica americana “Science”.

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Pelas estimativas, a população africana saltará de 1 bilhão para 4 bilhões de pessoas até 2100. Na Ásia, a população deve atingir um pico em 2050, com 5 bilhões de pessoas, e então iniciar o declínio. Nos outros continentes contabilizados (América do Norte, Europa e América Latina), todos devem ficar com menos de 1 bilhão de pessoas em 2100.

BOMBA POPULACIONAL
A história lembra o alerta lançado em 1968 por Paul Ehrlich, da Universidade Stanford, em seu livro “The Population Bomb”. Naquela época, ele sugeria que o aumento acelerado do número de pessoas levaria a uma escassez brutal de alimentos no futuro. A grande questão é que ele previa isso para a década de 1980. E não aconteceu.

O trabalho, por sua vez, foi quase uma ressurreição de uma ideia mais antiga, advogada por Thomas Malthus no fim do século 18, de que uma catástrofe populacional era inevitável, uma vez que a produção de alimentos cresceria em progressão aritmética (2+2+2…) enquanto a população avançaria em progressão geométrica (2x2x2…).

Fosse qual fosse a referência, Malthus ou Ehrlich, o recado era claro: precisamos diminuir o crescimento populacional. Cedo ou tarde, vai dar confusão. A má notícia do novo estudo é que provavelmente ainda não atingiremos isso no século 21.

PARA ONDE AGORA?
A situação é mais dramática do que um conjunto de números. É o famoso “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”. Comecemos do princípio: já há mais humanos na Terra do que o planeta pode suportar, pelo menos segundo os cálculos dos ambientalistas. Costumamos esgotar os recursos terrestres alocados para um ano — se o uso fosse sustentável — em coisa de seis ou sete meses. O que significa que, uma hora, vai faltar recursos. O pesadelo de Ehrlich e Malthus não é permanentemente adiável.

Por outro lado, se reduzirmos a população (como temos feito de forma significativa), temos uma série de problemas, pois a única forma de obter isso é fazer com que nasça menos gente. Isso significa que haverá menos pessoas trabalhando e pagando sua contribuição à previdência, e portanto haverá menos dinheiro para sustentar os aposentados, que por sua vez estão vivendo cada vez mais, graças aos avanços da medicina.

Ou seja, se você levar esse raciocínio às últimas consequências, uma hora o sistema colapsa.

Qual é a solução? A longo prazo, o único jeito é expandirmos a esfera da atuação dos seres humanos. Um planeta só já não nos basta. Precisamos de outros. Pode soar meio exagerado, ou absurdo, mas por que não iniciar a colonização de Marte ainda neste século? Tem gente já propondo isso, e seria uma forma de dar vazão às limitações enfrentadas hoje na Terra.

Convenhamos: funcionou quando a Europa expandiu seus domínios para as Américas. (Claro, isso não foi bom para os nativos americanos, mas ao que parece nenhum marciano estará lá para reclamar desta vez.)

A colonização do espaço é uma ideia que pode não só ajudar a desatar o nó da bomba populacional (e, claro, não espero que seja do dia para a noite, mas ao longo de séculos; para o futuro imediato, teremos mesmo de continuar a conter o avanço da população e encarar os problemas econômicos resultantes disso, que seriam o mal menor), como também garantirá longevidade à humanidade — hoje ameaçada por ter todos os seus ovos numa mesma cesta.

Esta é uma ideia que defendo no meu livro novo, “Extraterrestres”. Mesmo que não exista vida lá fora (e a essa altura a maioria dos cientistas considera bem provável que exista), será nossa missão espalhá-la — junto conosco — pelo Universo. Tenho a convicção de que o problema não está além da capacidade humana. Agora, uma coisa é certa: adotar simplesmente a política do “crescei e multiplicai-vos” não está mais funcionando.

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Complexidade irredutível https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/09/13/complexidade-irredutivel/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/09/13/complexidade-irredutivel/#comments Sat, 13 Sep 2014 15:02:09 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=2232 irredutivel

Num pequeno planeta azul, orbitando uma estrela anã amarela a milhões de anos-luz daqui, vivia uma pacífica sociedade paleolítica. Bem, tão pacífica quanto pequenos grupos isolados de caçadores-coletores podem ser. No relativo conforto de uma úmida caverna, um clã inteiro – homens, mulheres e crianças – se protegia de um temporal inclemente no meio da noite. Trovejava muito. Bebês choravam ao fundo, enquanto dois homens faziam a guarda na entrada do abrigo.

Em meio à chuva torrencial, os dois jamais esperavam que alguém pudesse vir de encontro a eles. Mas se há uma coisa que a vida no paleolítico ensina é que atenção nunca é demais. Eles espremiam os olhos, enquanto gotas de água carregadas pelo ar insistiam em vir de encontro às pupilas dilatadas pela escuridão. E então eles se surpreenderam ao ver duas silhuetas caminhando pela chuva, contornando o terreno pedregoso com dificuldade, paulatinamente se aproximando.

– Você está vendo isso? – perguntou Dareem.

– Alguém – ou alguma coisa – vem vindo aí! – confirmou Ualaco, seu colega de vigília.

– Quem está aí?

Uma voz distante, se aproximando, respondeu.

– Não se preocupem! Somos amigos! Peregrinos à procura de um abrigo da tempestade!

A dupla de guarda ficou receosa em dar tão facilmente entrada ao refúgio de seu clã, mas diante de tamanha inclemência dos céus, que alternativa? Os vigias recuaram dois passos, dando espaço para que os forasteiros saíssem do temporal, mas sem permitir um acesso irrestrito ao interior da caverna.

– Podem aguardar aqui até a chuva passar. – disse Dareem. – Temos frutas, caso estejam com fome. E tenham algo para dar em troca, é claro.

– Claro. Permita que eu nos apresente. Meu nome é Naberlind e este é meu colega Azneso. Naturalmente temos coisas a lhe oferecer que decerto vão interessá–los. Somos sábios em nossa terra e podemos trocar informações.

Dareem e Ualaco se entreolharam. De fato, havia uma coisa que precisavam desesperadamente saber. Algo que seu clã há tempos tentava produzir, sem sucesso. Ou melhor, com resultados apenas parcialmente satisfatórios. Mas poderiam os forasteiros ajudar? E mais: ainda que pudessem, concordariam, dado o tamanho do pedido?

– Há algo que talvez possam nos ensinar. – replicou Dareem. – Estamos tentando resolver isso há anos. Nós queremos… bem, queremos… estamos buscando aprender como… como fazer fogo.

O fim da frase saiu baixinho, quase como um sussurro, interrompido bruscamente por um par de gargalhadas.

– Hahahaha! Fazer fogo! Hahaha! Ouviu isso, Az? Eles querem aprender a fazer fogo!!! Hahahaha! Pois bem, podemos vos dar a mais importante informação a esse respeito: é impossível fazer fogo.

Ualaco estranhou.

– Impossível? Não, não deve ser! Já fizemos progressos importantes nessa direção! Conseguimos produzir pequenas fagulhas de fogo com pedras escuras que encontramos no fundo desta caverna. Falta-nos gerar um fogo contínuo a partir delas. Mas está claro para nós que é perfeitamente possível.

Naberlind e Azneso ainda mantinham um sorriso no rosto, triunfal.

– Não, você está errado. É impossível. Essa história de fazer fogo é apenas uma teoria. Vocês já deviam ter percebido isso, depois de tantos e tantos anos tentando. É impossível. Uma falácia. E vamos dizer por quê. Az, você explica ou eu?

O colega nem esperou e emendou.

– Complexidade irredutível.

– Quê? – franziu a testa Dareem.

– Complexidade irredutível – retomou Azneso. – Veja só. Vocês são sujeitos observadores, estou certo de que já notaram isso. Existem quatro essências possíveis para tudo que existe. Sopro, água, terra e fogo. Essas são essências básicas. Você não pode transformar uma em outra senão por processos muito complexos, que não podem ser gerados por vias naturais. O fogo possui uma complexidade irredutível. Não é possível pegar outros elementos e combiná–los para produzi-lo. Sem um controle muito além das nossas capacidades, não há como sintetizá-los a partir de partes de terra, sopro e água.

Naberlind regojizava-se com a explicação do colega.

– Fabricá-lo seria algo como… um vendaval espalhar folhas molhadas pela sua caverna e com isso produzir uma de suas pinturas rupestres. Nem em incontáveis dias isso poderia acontecer, certo? – prosseguiu, sem esperar uma resposta.

– Não é maravilhoso? – interrompeu Naberlind. – O mundo foi planejado e construído com quatro elementos irredutíveis, todos muito complexos para ser produzidos por vias naturais, pelos Projetistas. E não há meio de obter fogo que não seja por intervenção deles, os únicos capazes de promover a transmutação de algo inanimado, como a terra, em algo animado, como o fogo. Claro, também não há como fazermos terra com água, ou sopro com terra. Vocês sabem disso, lá no fundo. Afinal, vocês já manipularam o fogo antes. De onde ele vem?

Ualaco pensou por um par de segundos antes de responder.

– Bem, todas as vezes que conseguimos trazer fogo pela caverna, ele estava em galhos de árvores secas, queimando após uma grande luz vir do céu e atingi–las. Por isso sempre saímos para procurar fogo depois que ouvimos o barulho da grande luz.

– Exato! – exultou Naberlind. – Esta é a intervenção dos Projetistas, dando-nos o fogo. Não podemos criá-lo a partir de terra, sopro ou água. Você já viu uma árvore virar fogo espontaneamente, sozinha, do nada?

– Bem, não. Mas já vi o fogo começar em lugares secos e sob muito sol. Sem grande luz. Só o sol.

– Az, só o sol! Ele disse “só o sol”! – Naberlind gesticulava negativamente com a cabeça. – Tsc, tsc, tsc. Meus caros amigos, abracem o verdadeiro conhecimento. Esqueçam essa filosofia materialista, que não levará a nada. O sol é feito de quê? Do mesmo material que a grande luz. Sabe qual? Fogo! E quem cria o fogo, lá em cima, e nos cede gentilmente? Os Projetistas! Não há fogo sem os Projetistas!

– Só eles controlam o sol e a grande luz, podendo assim criar o fogo – complementou Azneso. – Não há meio de o surgimento do fogo ser um fenômeno natural. É uma manifestação evidente dos Projetistas! Complexidade irredutível!

Dareem não sabia o que dizer. Será possível? Aquilo contestava todas as observações feitas. Porém, também era verdade que, ao menos em seu clã, nunca ninguém jamais havia produzido o fogo em caverna. Mas…

– Mas e as faíscas que geramos com pedras? – disse Ualaco, tirando as palavras da boca de seu amigo.

– As faíscas, ora, as faíscas! Elas acendem e apagam numa fração de segundo, pois essa é sua natureza. Mas o fogo não. O fogo se mantém queimando. Ele contraria a segunda lei da termodinâmica! – disse Naberlind.

– A segunda o quê? – perguntou Dareem, exasperado com o linguajar sofisticado dos visitantes. Ele desconfiava que o palavrório complicado escondia ideias simples demais. Poderia o mundo ser tão simples assim? Era fácil demais varrer para o fundo da caverna tudo aquilo que não fosse imediatamente explicável, alegando “complexidade irredutível”. Era um argumento-coringa. Seria este o fim de todas as reflexões a respeito do fogo? A conclusão de que ele era fruto de uma intervenção de ordem superior? Dareem não gostava da ideia, mas seus interlocutores eram incansáveis.

– A natureza de todas as coisas é decair, exceto aquelas elementares, que já estão em seu estágio mais simples – disse Azneso, interrompendo os pensamentos do guarda. – A fagulha é o melhor que podemos chegar de produzir o fogo. Mas ela logo decai em ar, que é seu verdadeiro elemento natural. O fogo se mantém de forma indefinida, enquanto houver madeira. Embora não seja, claro, feito de madeira. Ele contradiz a segunda lei da termodinâmica. A natureza não produz coisas assim. A natureza segue suas leis. Só os Projetistas podem contrariá-las.

– Hmm… – respondeu Ualaco, enquanto olhava para fora e notava que a chuva havia dado uma trégua. E, vejam só, ao longe, uma árvore se incendiava. – Bem, a chuva parou, acredito que vocês possam seguir viagem. Dareem, siga de guarda, eu vou buscar o fogo para trazer para dentro da caverna. Sem experimentos com pedras hoje.

Os forasteiros se despediram e partiram, satisfeitos de terem iluminado mais um grupo de ignorantes nessas terras ermas.

Dareem nunca comprou a versão deles. Mas nem todos em sua tribo eram tão questionadores. E ele já não era mais um menino. Eventualmente, o grande experimento da civilização – a fabricação do fogo – foi interrompido. Por todos os agrupamentos humanos, cristalizou-se a noção de que o fogo era produto de um Projetista inteligente e jamais poderia ser obtido de forma natural por algum arranjo apropriado. O sonho de Naberlind e Azneso, convencer a todos da veracidade de suas proposições, havia se tornado realidade.

Sem compreender o fogo, essa civilização jamais cresceu em grande número. Nem sempre era possível cozinhar os alimentos, e doenças proliferavam por conta disso. Os clãs eram pequenos. Contagens, desnecessárias. Nada de escrita. Ninguém jamais compreenderia o fogo e seu fenômeno químico correspondente, a combustão. Não haveria saltos tecnológicos. Agricultura, cerâmica, metalurgia. Imprensa. Automóveis. Foguetes.

E então um dia, sem aviso (não havia telescópios), nem defesa (não havia naves espaciais), um grande asteroide impactou contra aquele idílico planeta azul. Uma nuvem espessa e cinza recobriu o mundo inteiro, para desespero de seus habitantes. Eles apelaram o quanto puderam para os Projetistas, mas ninguém estava lá para ouvi–los. Incêndios globais tomaram de assalto toda a vida, apagando qualquer resquício de habitabilidade. Em alguns milhões de anos, criaturas microscópicas voltariam a subir a ladeira íngreme da evolução. Mas àquela altura estava encerrado, de forma melancólica, mais um experimento conduzido pela natureza sobre a vida inteligente no Universo.

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Cinco provas da evolução das espécies https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/05/26/cinco-provas-da-evolucao-das-especies/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/05/26/cinco-provas-da-evolucao-das-especies/#comments Mon, 26 May 2014 09:04:32 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=1732 Este é um assunto dos mais controversos: a origem das espécies, desde as bactérias mais simples até os orgulhosos seres humanos. A razão básica da confusão é que algumas pessoas querem fazer crer que existe um conflito intrínseco entre a teoria da evolução pela seleção natural e as religiões. É mentira.

Fósseis do gênero Homo de 1,8 milhão de anos encontrados na Ásia: nossos parentes evolutivos.
Fósseis do gênero Homo de 1,8 milhão de anos encontrados na Ásia: nossos parentes evolutivos.

A ciência, aliás, não é inimiga da religião. As duas são naturalmente complementares, e existe beleza no equilíbrio — admirá-las igualmente pelo que são, tentativas de contextualizar a existência humana respectivamente nos níveis natural e espiritual.

Uma diferença importante entre elas é que a ciência, por sua própria natureza, se propõe a estabelecer (tanto quanto possível) fatos objetivos. Já a religião fala de “verdades” pessoais. Por isso cada um de nós pode ter suas próprias crenças, mas temos todos em comum uma única ciência. E também é por isso que neste texto, daqui em diante, vamos discutir apenas ciência. Começando do rasinho. Como se produz o conhecimento científico?

A coisa funciona do seguinte modo: primeiro deparamos com um fenômeno que desejamos compreender. Pode ser qualquer coisa. Um exemplo simples: como acontece a chuva? Diante do enigma, parte-se para formular uma hipótese. Podemos, por exemplo, imaginar que a chuva está ligada à temperatura da água. Se aquecida, ela vira vapor e sobe. Se resfriada, ela cai de volta no chão. Certo, temos nossa hipótese. E agora? A ciência dita que precisamos colocar essa ideia à prova. Testá-la com experimentos e observações.

Podemos esquentar a água com fogo e notar que, a partir de um determinado momento, ela começa a subir para o ar, na forma de fumaça. E se aprisionarmos esse vapor ascendente num recipiente notaremos que, ao entrar em contato com a superfície mais fria, ele volta a virar líquido. E percebemos que isso acontece também no mundo lá fora, embora em ritmo bem mais lento. Uma poça d’água desaparece sob a ação da luz do Sol e volta a se formar quando água cai do céu em forma de chuva. Grosso modo, a confirmação de nossa hipótese a converte em teoria. Ela não é mais só um exercício racional de adivinhação. Ela é uma explicação concreta que nos permite compreender e até mesmo prever fenômenos.

Essa nossa teoria simples da chuva explica toda a história? Claro que não. Sobre ela outros cientistas teriam de formular outras hipóteses, que explicam como a água pode evaporar mesmo que a poça inteira nunca atinja a temperatura necessária, ou como a água se aglutina em nuvens e o que acontece na atmosfera para fazê-la se liquefazer e, enfim, chover de volta ao chão. Essas hipóteses serão postas à prova e gerarão novas teorias, que tornarão nossa compreensão do fenômeno ainda mais refinada. Mas note que novas teorias não substituem as antigas. Elas aprofundam o entendimento, sem anular as conclusões obtidas antes.

É a tal história do Isaac Newton, que ao formular as bases da física moderna se disse “sobre os ombros de gigantes”. Ele construiu sua obra sobre alicerces sólidos. A ciência é um muro de tijolos. Novos tijolos são constantemente colocados no muro. Mas os antigos raras vezes são substituídos. No mais das vezes, eles continuam formando a parede, que fica cada vez mais alta, permitindo que enxerguemos cada vez mais longe.

Por isso é de uma desonestidade intelectual profunda acusar a evolução pela seleção natural de ser “apenas uma teoria”. Em ciência, uma teoria é o máximo que uma ideia pode chegar a ser. E ela atinge esse ponto só depois que foi corroborada por observações e experimentos. Só depois que ela se mostra a melhor explicação possível para um certo conjunto de dados.

É nesse contexto que vamos apresentar aqui cinco provas da evolução das espécies. Os mais atentos talvez queiram criticar meu uso da expressão “provas”, lembrando o filósofo da ciência Karl Popper, que sugere que observações só podem refutar teorias, mas nunca prová-las. Concordo com Popper. Mas uso aqui o termo “provas” no sentido jurídico. Imagine que estamos num tribunal, que julgará a veracidade da teoria da evolução. O Mensageiro Sideral se apresenta como promotor, apontando provas circunstanciais conclusivas. Decerto os opositores apresentarão seus argumentos de defesa nos comentários abaixo. E o juiz do caso? É você, caro leitor. Leia, reflita e julgue os fatos.

ANTES DE MAIS NADA, O QUE É A TEORIA DA EVOLUÇÃO?

Formulada por Charles Darwin e Alfred Russel Wallace independentemente e apresentada em 1858, ela parte de pressupostos simples e incontestáveis.

A primeira premissa é que os seres vivos de uma determinada espécie, por mais parecidos que sejam, apresentam, naturalmente, pequenas diferenças entre si. Isso é mais do que evidente. Basta olhar ao seu redor. Somos todos humanos, mas cada um é um pouquinho diferente do outro. Um mais baixo, um mais alto, um loiro, um moreno, e assim por diante.

A segunda premissa é que os seres vivos podem transmitir essas pequenas diferenças que os caracterizam a seus descendentes. E isso também é mais do que evidente. Por isso filhos de morenos são morenos, filhos de altos são altos, e por aí vai.

A terceira — e crucial — premissa é que, no mundo natural, algumas características são mais vantajosas que outras. Hoje, na população humana, isso não é muito evidente. Mas ainda acontece. Um exemplo: um pequeno número de pessoas na África parece ser imune ao HIV. Muitos esforços têm sido feitos pelos médicos para reduzir o impacto que o vírus da Aids tem na mortalidade humana, mas imagine um mundo sem medicamentos. O que aconteceria na África? Os que não resistem ao HIV morreriam, em muitos casos sem deixar descendentes. Os imunes sobreviveriam e teriam mais filhos. Ao longo das gerações, aumentaria a porcentagem de pessoas com imunidade natural ao HIV.

Isso é seleção natural. É a pressão que a natureza exerce para selecionar certas características e eliminar outras.

Pois bem. Até aí, absolutamente nada de controverso. O salto que Darwin e Wallace deram foi partir dessas premissas e concluir que, ao longo de períodos muito grandes de tempo, esse processo de seleção natural poderia produzir novas espécies a partir de um ancestral comum. Como eles chegaram a essa conclusão? Observando o mundo natural. Note, por exemplo, o clássico exemplo apresentado pelo próprio Darwin, ao refletir sobre os tentilhões — grupo de espécies de pássaro — das ilhas Galápagos, que o naturalista estudou pessoalmente ao passar pela América do Sul, em 1835. Ele notou que cada ilha do arquipélago tinha suas próprias espécies de tentilhões, cada uma com um formato de bico próprio.

Os tentilhões de Darwin, observados nas ilhas Galápagos. Seleção natural em funcionamento.
Os tentilhões de Darwin, observados nas ilhas Galápagos. Seleção natural em funcionamento.

Como explicar isso? Darwin imaginou que todos eles tinham um ancestral comum. Separados em suas respectivas ilhas, eles enfrentaram ambientes naturais ligeiramente diferentes, que por sua vez selecionariam características diversas. Ao fim de milhões de anos, terminamos com espécies diferentes de tentilhão.

O mesmo raciocínio pode ser aplicado a toda a vida na Terra, e foi o que Darwin e Wallace fizeram. Se imaginarmos que todos os seres vivos atuais têm um ancestral comum separado de nós por cerca de 4 bilhões de anos de seleção natural, temos uma explicação para a origem de todas as espécies. Uma explicação que é passível de teste. E que foi testada e corroborada de forma contundente, como veremos a seguir.

Um senão importante é que a teoria diz respeito exclusivamente à origem das espécies. Ou seja, como, a partir de uma única forma de vida, acabamos com uma biosfera tão incrível e diversa como a nossa. A teoria nada fala sobre a origem da vida em si. Como o primeiro ser vivo submetido ao processo de seleção natural veio a ser é outro mistério, um que ainda não tem uma solução científica clara (embora diversos caminhos promissores já se insinuem a esse respeito).

PROVA NÚMERO UM – O DNA

Manja teste de DNA, aquele usado corriqueiramente para determinar paternidade de bebês? Você acredita nele? Pois bem. Hoje temos tecnologia para comparar o DNA não só de humanos diferentes, mas de diversas espécies diferentes. Essa análise revela que todos os seres vivos que já investigamos têm algum grau de parentesco com todos os demais. Trata-se de uma confirmação incrível da teoria da evolução pela seleção natural. Tão contundente como um teste de paternidade diante de um juiz de família.

A história da evolução está escrita no DNA. É só saber ler.
A história da evolução está escrita no DNA. É só saber ler.

É interessante notar que, no tempo de Darwin, o DNA nem era conhecido, muito menos seu papel na transmissão das informações genéticas. Ele e Wallace estavam tateando às escuras, por assim dizer. Quando o DNA foi descoberto e, mais tarde, aprendemos a “lê-lo”, ele poderia ter refutado completamente a evolução. Bastaria para tanto que os organismos tivessem genes tão diferentes entre si que não se estabelecesse grau de parentesco entre eles.

Contudo, não foi o que se observou. Se olharmos para o DNA humano e compararmos com o do chimpanzé, descobrimos que a diferença entre eles é de cerca de 4%. Ou seja, a receita para a fabricação de um chimpanzé é, em 96%, idêntica à que produz um ser humano. O que isso significa, que nós evoluímos dos macacos? Claro que não! A afirmação de que o homem veio do chimpanzé está errada. Tanto o homem como o chimpanzé evoluíram de um ancestral comum, que não era nem uma coisa, nem outra.

O mesmo exercício pode ser feito entre outras espécies, com resultado similar. Também temos um ancestral comum com os camundongos. E com os répteis. E com os insetos. E com as plantas. E com as bactérias. E com todo mundo que já analisamos até hoje. O que nos leva ao motor da evolução por seleção natural — as mutações.

PROVA NÚMERO DOIS – MUTAÇÕES

Hoje conhecemos bem os mecanismos que existem no interior de cada célula para replicar o DNA. Há um sistema integrado de monitoramento e correção que tenta identificar falhas na replicação e impedir que elas se perpetuem — se preciso for, induzindo o próprio suicídio celular. No entanto, sabemos também que esse sistema não é à prova de falha. De vez em quando, pequenas mudanças passam. Acontece direto. Nas suas células. Agora. Na maior parte das vezes, ocorre em trechos do DNA que não codificam informação genética, e aí pode não haver consequência nenhuma. Se acontecem num pedaço de DNA que tem informação importante, podem produzir efeitos bem sérios. Na maior parte das vezes, esses efeitos são ruins — o câncer é resultado de mutações em células, alterações que atingem justamente o sistema que induz ao suicídio celular quando há falhas de replicação do DNA. As células saem de controle e se multiplicam sem parar, às custas do resto do organismo.

Contudo, em alguns casos, as mutações podem produzir manifestações que não incapacitam a pessoa. E, claro, quando acontecem nas células germinativas, precursoras de espermatozoides e óvulos, elas não afetam o sujeito em si, mas afetarão a geração seguinte — para o bem ou para o mal.

Isso não é ficção ou especulação. É fato. Note que os seres humanos diferem entre si no seu DNA em cerca de 0,5%. Ou seja, meu genoma é diferente do seu por essa quantidade. A maioria dessas diferenças consiste em mudanças em uma única letra, o que os cientistas chamam de SNPs (polimorfismos de nucleotídeo único, ou, mais simpático, “snips”). Sabendo que isso acontece e que a vida tem quase 4 bilhões de anos na Terra, o difícil é inventar um mecanismo que impeça a evolução. É muito mais complicado termos espécies estáticas, imutáveis, do que espécies em eterna transmutação ao longo das eras geológicas, movidas por mudanças pequenas e graduais. Bem, mas se essas mudanças foram graduais, não deveríamos ter formas intermediárias entre os animais vivos hoje? Claro que deveríamos! E temos! Basta olhar os fósseis.

PROVA NÚMERO TRÊS – FÓSSEIS

Na época de Darwin, os fósseis já estavam na moda, embora fossem poucos e incompreendidos. Foi justamente naquele tempo que começaram a ser identificados os primeiros dinossauros. Sabemos hoje com base em evidências geológicas concretas que eles viveram entre 230 milhões e 65 milhões de anos atrás. E uma olhada neles revela o que a evolução é capaz de fazer ao longo de períodos imensos de tempo.

Sabemos, por exemplo, que as aves modernas têm como ancestrais dinossauros terópodes. E como podemos saber disso? Além de observarmos características similares entre os ossos de um grupo e de outro, há algumas espécies extintas que parecem uma exata mistura dos dois. Pegue o arqueoptérix, por exemplo, que viveu cerca de 150 milhões de anos atrás. Ele é metade ave, com penas capazes de voo e asas, e metade dinossauro, com dentes e tudo. Tanto dinossauros como aves são as únicas criaturas que têm aquele famoso “ossinho da sorte”. E uma análise de proteínas remanescentes de uma coxa de tiranossauro mostrou em 2005 que o colágeno dos músculos do bichão é muito parecido com o das galinhas modernas. São provas incontestes do processo evolutivo.

Fóssil de arqueoptérix, metade-ave, metade-dinossauro. Ele viveu há 150 milhões de anos.
Fóssil de arqueoptérix, metade-ave, metade-dinossauro. Ele viveu há 150 milhões de anos.

E toda a árvore da vida está cheia dessas formas intermediárias, hoje extintas. Diversos hominídeos descobertos mostram um aumento crescente da caixa craniana de nossos ancestrais. Obviamente, aumento de cérebro (e de inteligência) foi favorecido pela seleção natural, o que explica o processo.

É verdade que não existe na Terra nenhuma espécie viva mais inteligente que a nossa. Mas isso não quer dizer que exista um abismo intransponível entre nós e nossos parentes no reino animal, em termos de comportamento.

PROVA NÚMERO QUATRO – COMPORTAMENTO ANIMAL

Costuma-se fazer uma distinção clara entre humanos e o resto do reino animal. Nós seríamos inteligentes, sofisticados, capazes de abstrações, conscientes de nós mesmos. Os demais não teriam consciência de si mesmos e seriam estúpidos.

Essa distinção é puro preconceito. A teoria da evolução por seleção natural sugere que essa escalada da inteligência e da consciência deveria ser um aclive suave, e não uma divisão abrupta. Se os evolucionistas estivessem errados, encontraríamos mesmo esse abismo. Mas os etólogos (estudiosos do comportamento animal) encontram cada vez mais evidências de que muitos dos atributos originalmente concedidos só aos humanos estão presentes no reino animal.

Veja os chimpanzés mesmo. Eles são menos espertos que os humanos, fato, mas ainda assim são bem espertos. E fazem coisas que, até outro dia, achávamos que fossem exclusividades nossas. Chimpanzés não falam, mas são capazes de aprender linguagem de sinais e conseguem comunicar ideias simples. Constroem e usam ferramentas rudimentares. Seu nível de inteligência para o uso de ferramentas é comparável ao de uma criança de cinco anos! Gostam de montar quebra-cabeças só por diversão, como nós. Conseguem contar até 40 e fazer operações aritméticas simples. E são capazes de algum nível de empatia. Não são animais estúpidos. São mais parecidos conosco do que gostaríamos de admitir. Não há vergonha nenhuma em ser primo dos chimpanzés. Apesar daquela mania horrível de jogar cocô nos outros, eles são legais e representam nosso elo mais próximo na imensa corrente da vida na Terra.

Mais parecidos conosco do que alguns gostam de admitir. Mas DNA não mente.
Mais parecidos conosco do que alguns gostam de admitir. Mas DNA não mente.

Apesar disso, seguimos caçando-os sem dó. Limitados à África, eles estão ameaçados de extinção. Estima-se que existam cerca de 150 mil chimpanzés em liberdade na natureza hoje. Humanos, são 7 bilhões. E subindo. Não é impensável que nossos parentes mais próximos passem à categoria de fósseis em pouco tempo. A situação dos gorilas, que também estão perto de nós evolutivamente, é ainda mais dramática. Seleção natural na sua forma mais cruel. Nossa inteligência, mal empregada, está os destruindo. A troco de nada. Quem é o inteligente mesmo?

PROVA NÚMERO CINCO – PSEUDOGENES

Os chimpanzés e gorilas podem sumir, mas a vida é um contínuo, graças à evolução. Em meio ao DNA dos mais de 7 bilhões de humanos, existem pedaços de genes de nossos ancestrais comuns, inativos, mas ainda lá. Esse talvez seja a maior evidência de evolução já encontrada. As mutações por vezes desativam genes não essenciais, tornando-os não funcionais sem inviabilizar a vida do indivíduo e a passagem da modificação à próxima geração.

Aí esses chamados pseudogenes continuam guardados no genoma, mas não servem para grande coisa no organismo. Viram algo como um “museu da vida”, guardado no interior das nossas células. Além de permitirem que, ao lermos suas sequências, possamos traçar com precisão nossa ancestralidade evolutiva, eles servem como uma “reserva” para o futuro da evolução. Especula-se que genes inativos possam, com novas mutações, tornarem-se ativos novamente, produzindo características novas que se submetam à seleção natural.

Os cientistas mais ousados, por exemplo, especulam sobre a possibilidade de reconstruir os genomas de dinossauros extintos “pescando” pseudogenes em seus descendentes — as aves modernas — e reativando-os. Díficil? Sem dúvida. Talvez até impossível para essas criaturas, que sumiram há 65 milhões de anos. Mas pode ser uma estratégia viável para trazer os mamutes, extintos há 12 mil anos, de volta à vida. São incríveis perspectivas que só se abrem porque a evolução é um fato.

O RESUMO DA ÓPERA

Como se pode ver, a evolução por seleção natural é uma teoria que explica muita coisa. Ela poderia ser superada por outro paradigma científico no futuro? Em tese sim. Mas onde está esse paradigma?

Alguns dizem que a melhor explicação para a diversidade da vida seja o que eles chamam de Design Inteligente — a ideia de que a vida é sofisticada demais para que suas incríveis nuances fossem produzidas pela seleção natural, e que somente uma consciência superior poderia ter produzido os seres vivos terrestres, individualmente, espécie por espécie.

Certo. É uma hipótese. Vamos testá-la? Se o Design Inteligente estiver certo, não devemos encontrar parentesco claro entre todas as espécies estudadas ao investigar seu DNA. Afinal de contas, se cada uma delas foi individualmente projetada por uma inteligência superior, não haveria razão para termos, por exemplo, distribuição similar dos genes pelos cromossomos em diferentes espécies. Aliás, deveríamos encontrar distribuições bem diferentes, otimizadas para cada forma de vida. Não é o que vemos.

Outra conclusão que advém da hipótese do Design Inteligente é que as diferenças entre as espécies não podem ser usadas para estimar a época em que elas divergiram (até porque, pelo Design Inteligente, elas nunca teriam divergido para começar, tendo sido criadas individualmente). Em resumo, deveria haver profundo desacordo entre estimativas da época da especiação feitas com base na genética e o registro fóssil. Nos casos estudados até agora, vemos que há acordo razoável. A genética sugere, por exemplo, que o ancestral comum entre humanos e chimpanzés viveu entre 5 milhões e 7 milhões de anos atrás. Os fósseis de formas intermediárias suportam essa estimativa. A australopiteca Lucy, por exemplo, que seria posterior à divergência, viveu cerca de 3,2 milhões de anos atrás. Ótimo encaixe com a teoria da evolução, péssimo para a concorrência.

Aliás, os fósseis em geral apresentam um desafio intransponível para o Design Inteligente. Porque eles revelam não só a época em que certas espécies foram extintas, mas também a época em que certas espécies apareceram. E vemos que as espécies surgem paulatinamente, num processo contínuo, ao longo de bilhões de anos. O Designer passou todo esse tempo por aqui, introduzindo uma a uma as novas espécies? E, curiosamente, adotou um ritmo de introdução das espécies exatamente compatível com o que seria produzido pela evolução por seleção natural, segundo nossas estimativas de mutações?

Outra coisa: por que o Designer usou formas intermediárias nesse processo? Por que ele teve de produzir Homo habilis, Homo erectus e Homo ergaster antes de fazer o glorioso Homo sapiens? Fosse uma criação inteligente e projetada sob medida, não precisaria de formas intermediárias. Só a evolução explica esse processo.

Por fim, uma conclusão possível do Design Inteligente é que espécies modernas seriam tão boas e adaptadas quanto possível. Existe espaço para aperfeiçoamento na biologia terrestre? Ô se existe. Outro dia, um grupo de pesquisadores inseriu nanocápsulas em células de plantas e melhorou o rendimento da fotossíntese em 30%. E nós, humanos, supostamente o supra-sumo, temos um apêndice, cuja única função parece ser causar apendicite, e os dentes do siso, que precisam ser extraídos na maior parte de nós porque não nos cabem na boca. Que diabo de projeto inteligente é esse? Por que temos órgãos vestigiais? Por que o Designer se deu ao trabalho de disfarçar toda a biosfera para fazer que ela evoluiu, se esse não foi o caso?

O Design Inteligente não explica nada. Nem de longe. E a evolução já tem evidências demais para que a descartemos como uma infeliz coincidência. Vamos aos fatos: entre nós e os chimpanzés, 96% de identidade no DNA. Se você prefere acreditar que nós e eles fomos criados separadamente por um Designer, tem de se perguntar por que esse Criador quis fazer você exatamente como se fosse primo dos macacos.

Deixo, afinal, uma pergunta para reflexão. Qual é o Designer mais inteligente: aquele que constrói um relógio automático, liga-o e vê, satisfeito, como cada ponteiro avança sozinho no momento preciso para marcar o tempo, ou aquele que constrói um relógio e fica, em sua paciência infinita, empurrando os ponteiros com o dedo a cada segundo para mantê-lo sempre marcando a hora certa?

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