Mensageiro Sideral https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br De onde viemos, onde estamos e para onde vamos Sat, 04 Dec 2021 19:09:39 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Polo norte magnético sai do Canadá e se desloca na direção da Rússia https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2020/01/06/polo-norte-magnetico-sai-do-canada-e-se-desloca-na-direcao-da-russia/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2020/01/06/polo-norte-magnetico-sai-do-canada-e-se-desloca-na-direcao-da-russia/#respond Mon, 06 Jan 2020 05:00:07 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2020/01/wmm-1200x480-v2-320x213.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=9167 Até quem estuda em livro didático que não tem muita coisa escrita sabe que as bússolas, guiadas pelo campo magnético terrestre, apontam para o norte. Mas para onde no norte? Já foi no Canadá, mas agora, após um rápido e inesperado deslocamento nos últimos anos, agora está mais para a Rússia. E um novo modelo produzido em cooperação por americanos e britânicos ajuda o mundo todo a se adaptar ao movimento do polo norte magnético.

Ao contrário dos polos geográficos (pontos em torno dos quais a Terra gira), que se movem quase nada (o eixo de rotação em si faz um bamboleio, mas o local do planeta em que se localiza o eixo em si não muda, salvo ao longo de muitos milhões de anos), os polos magnéticos se deslocam com mais facilidade.

Já se sabe disso desde o século 19, mas houve uma surpresa nos anos 1990, quando a velocidade de deslocamento saiu de modestos 15 km por ano para 55 km anuais (e então deu uma maneirada, para cerca de 40 km por ano). Em 2018, o polo norte magnético cruzou a linha internacional de mudança de data e foi parar no Oriente. E agora se aproxima do norte da Rússia.

A mudança obriga a atualizações constantes do modelo do campo magnético terrestre, importantes para manutenção de satélites em órbita, preservação da precisão de GPS e estudos de mineração, entre outras aplicações relevantes.

Daí a divulgação, em dezembro, do Modelo Magnético Mundial 2020, produzido em parceria pela Agência Nacional de Inteligência Geoespacial dos EUA e pelo Centro Geográfico de Defesa do Reino Unido. A ideia é que esse modelo, de uso livre e gratuito, esteja disponível até o final de 2024, quando deverá ser novamente atualizado.

Ter um campo magnético é uma das coisas que faz da Terra um lugar especial. Originado na região mais externa do núcleo do nosso planeta, ele é resultado do fluxo de correntes elétricas em meio ao ferro semiderretido que existe lá embaixo. As correntes elétricas acabam agindo como um ímã gigante, gerando um campo em torno do planeta que o protege das partículas potencialmente perigosas do vento solar.

Compreendê-lo é essencial. Sabe-se, pelo registro geológico, que ele se inverte de tempos em tempos (norte vira sul, sul vira norte). Mas ninguém sabe prever quando isso acontece, e nos últimos 5 milhões de anos o período atual é o mais longo. Faz uns 780 mil anos que ele está lá pelos lados da casa do Papai Noel.

A aceleração recente do deslocamento polar fez com que alguns pensassem que estamos prestes a encarar uma nova inversão. A imensa maioria dos pesquisadores, contudo, considera isso extremamente improvável até o momento. Por ora, e pelo futuro previsível, as bússolas devem continuar apontando para o norte.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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Astronautas trouxeram da Lua um meteorito da Terra, diz estudo https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2019/02/04/astronautas-trouxeram-da-lua-um-meteorito-da-terra-diz-estudo/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2019/02/04/astronautas-trouxeram-da-lua-um-meteorito-da-terra-diz-estudo/#respond Mon, 04 Feb 2019 16:30:53 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2019/02/kring-modifiedversion-of-nasa-rock-photo-illustration-3-story-667623-320x213.png https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=8616 Sabe qual é o melhor lugar do mundo para aprender sobre a história da Terra? A Lua. Não por acaso, no fim do mês passado cientistas anunciaram a descoberta da rocha mais antiga do nosso planeta — uma amostra trazida do nosso satélite natural pelos astronautas da Apollo 14, em 1971.

A rocha foi colhida por Alan Shepard e Edgar Mitchell na região lunar de Fra Mauro, e estudos iniciais sugeriam que ela seria resultado da ejeção de material após um impacto na superfície — mas todo mundo pensava que fosse um impacto na própria Lua.

O módulo lunar bloqueia parcialmente a luz solar em Fra Mauro, durante a missão Apollo 14. (Crédito: NASA)

Uma análise da mesma amostra com instrumentação moderna, contudo, parece apontar uma origem bem mais interessante. O processo de ejeção deixa na rocha várias indicações de temperatura e pressão que permitem estimar de que profundidade ela foi ejetada. Se tivesse sido um impacto na Lua, ela teria de ter vindo de mais de 160 km de profundidade, inconsistente com qualquer modelo viável de ejeção. Em compensação, se o impacto tivesse sido na Terra, a profundidade estimada seria de bem mais razoáveis 20 km.

Além disso, sinais de oxidação na rocha apontam para condições similares às da Terra, mas jamais observadas na Lua. Ou seja, os cientistas têm boas razões para acreditar que a amostra Apollo 14321 na verdade contém material originário da própria Terra.

Não é uma ideia maluca; Terra e Lua foram companheiras por praticamente toda a história do Sistema Solar, desde a formação da segunda por um enorme impacto, 4,5 bilhões de anos atrás. E, assim como muitos meteoritos que caem em nosso planeta são de origem lunar, é de se supor que também chovem na Lua rochas ejetadas da Terra.

Reconstruindo a história da rocha, os cientistas envolvidos no projeto liderado por David Kring, chegaram à seguinte conclusão: 4 bilhões de anos atrás, um impacto na Terra ejetou a amostra para o espaço, de uma profundidade de 20 km. A rocha acabou caindo na Lua, onde sofreu diversas modificações por outros impactos em solo lunar _um deles a derreteu parcialmente 3,9 bilhões de anos atrás, e a enterrou. E o último evento de impacto a afetá-la ocorreu cerca de 26 milhões de anos atrás, quando o impacto de um asteroide produziu a cratera Cone e trouxe a rocha de volta à superfície lunar, onde os astronautas a colheram há 48 anos.

Agora calcule quantas outros meteoritos terrestres ainda poderão ser encontrados na Lua, remontando a épocas em que o registro geológico foi totalmente apagado na própria Terra? Nosso satélite natural é um museu representativo dos 4,5 bilhões de anos de história do nosso planeta, só esperando para ter vasto seu acervo examinado pelos cientistas.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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Planetas geologicamente ‘vivos’ devem ser comuns na Via Láctea, diz estudo https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/11/29/planetas-geologicamente-vivos-devem-ser-comuns-diz-estudo/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/11/29/planetas-geologicamente-vivos-devem-ser-comuns-diz-estudo/#respond Thu, 29 Nov 2018 17:26:12 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/11/Ciclo_do_carbono_Melissa_de_Andrade_Nunes-320x213.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=8378 É consensual entre os cientistas que a Terra é um planeta com vida em parte por ser um planeta “vivo”, ou seja, geologicamente ativo. São esses processos que ajudam a produzir o campo magnético terrestre e alimentam o chamado ciclo do carbono, ambos essenciais à biosfera. E agora um trabalho feito por um grupo internacional de pesquisadores com liderança brasileira demonstrou que ao menos essa característica geofísica não é peculiar ao nosso planeta; pelo contrário, deve ser comum em planetas rochosos espalhados por todo o disco da Via Láctea.

Os pesquisadores analisaram 53 estrelas gêmeas solares, ou seja, astros que mostram aproximadamente a mesma massa, o mesmo diâmetro e propriedades gerais muito similares às do Sol. Por meio de espectrógrafos, é possível analisar a “assinatura de luz” dessas estrelas todas e, a partir disso, identificar sua composição.

O grupo estava à procura de tório na composição desses astros. Isso porque se trata de um elemento radioativo importante na composição do interior planetário; ao sofrer decaimento, ele é uma fonte de calor interno, e com isso ajuda a manter o planeta geologicamente ativo.

“Confirmamos que há um grande orçamento energético do decaimento de tório para manter a convecção do manto dentro de potenciais planetas rochosos ao redor de gêmeas solares, desde a formação do fino disco galáctico até agora”, escreveram os pesquisadores em artigo publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

O trabalho tem como primeiro autor Rafael Botelho, orientando de doutorado de André Milone no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), e tem importantes implicações para uma avaliação do potencial para a vida na Via Láctea. “O mais empolgante é que parece que o tório também é abundante em gêmeas solares velhas, significando que o disco da galáxia pode estar repleto de vida, tanto no espaço quanto no tempo”, diz Botelho.

Não custa lembrar que o Sistema Solar é relativamente recente, comparado à idade da galáxia. Enquanto o Sol e sua família de planetas nasceram cerca de 4,5 bilhões de anos atrás, a Via Láctea, ainda que numa forma mais primitiva, já está por aí há mais de 10 bilhões de anos. Ou seja, há estrelas e planetas muito mais velhos que o Sol e a Terra, e a implicação é que mesmo nesses tempos mais antigos já havia concentração suficiente de tório para servir como “bateria de energia” para a atividade geológica.

É uma descoberta importante, uma vez que sabemos que o Universo nasceu apenas com elementos leves (hidrogênio, hélio e lítio), há 13,8 bilhões de anos, e foi apenas gradualmente se tornando mais enriquecido em elementos pesados, conforme as primeiras gerações de estrelas os foram fabricando e os espalhando pelo espaço ao fim de suas vidas. Aparentemente, esse processo de enriquecimento aconteceu de forma relativamente rápida, de modo que mesmo em épocas bem mais remotas já havia um inventário respeitável de fontes radioativas de calor para o interior de planetas.

O trabalho dá maior amplitude a um estudo feito anteriormente por um grupo da Universidade Estadual de Ohio, nos Estados Unidos, que analisou a presença de tório em 13 gêmeas solares. Com uma amostra mais robusta de 53, com as mais variadas idades, a nova pesquisa consolida as conclusões originais. Em ambos os casos, os dados espectrais das estrelas vieram do Harps, instrumento instalado no telescópio do ESO (Observatório Europeu do Sul) em La Silla, no Chile.

UM PROCESSO COMPLEXO
Mostrar que há energia de processos radioativos para planetas geologicamente ativos em toda a galáxia, contudo, não pode ser confundido com demonstrar que todos os planetas ricos em tório são geologicamente ativos.

Aliás, entender o que mantém o interior de um planeta “vivo” é ainda um problema a ser resolvido. Certamente se trata de uma questão multifacetada. Ter elementos radioativos capaz de gerar calor interno é um dos fatores, mas está longe de ser o único. Outro igualmente importante é a quantidade inicial de calor armazenada no planeta durante sua formação, em razão do processo violento de colisões que o gera. E é bem possível que o efeito de maré também contribua para “chacoalhar” (e assim manter aquecido) um manto planetário.

Um ótimo exemplo disso é a situação dos quatro planetas rochosos do Sistema Solar: Mercúrio, Vênus, Terra e Marte. Ambos se formaram a partir da mesma nebulosa que gerou o Sol, o que nos faz presumir que todos tiveram acesso ao tório presente nela — embora algumas diferenças de concentração possam existir em razão de os planetas terem se originado em diferentes locais do disco de gás e poeira responsável por sua formação ao redor do Sol nascente.

Modelos teóricos do interior dos quatro planetas rochosos do Sistema Solar, mais a Lua. (Crédito: Nasa/JPL)

A despeito disso, apenas Mercúrio e a Terra têm campos magnéticos apreciáveis (gerados no núcleo externo, ao que tudo indica), e apenas a Terra segue com tectonismo ativo. Vênus, apesar de ser praticamente do mesmo tamanho da Terra e dar toda pinta de ser geologicamente ativo, não apresenta sinais claros de placas tectônicas. Marte, por sua vez, que é menor, se mostra geologicamente morto. (A propósito, um dos objetivos da sonda InSight, que acabou de pousar por lá, é determinar quanto calor interno ainda existe no planeta.)

Então, não dá para saltar do fato “há tório” para a conclusão “há atividade geológica”. É apenas um indício de que energia fornecida por decaimento radioativo não é uma limitação para planetas geologicamente vivos.

“Se tivéssemos encontrado níveis muito baixos de tório em outras estrelas, isso poderia questionar o potencial de termos planetas rochosos geologicamente ativos na galáxia”, afirma Jorge Melendez, pesquisador do IAG-USP (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo) e coautor do trabalho. “Como encontramos níveis aproximadamente similares em todas as estrelas estudadas, isso indica que existe potencial de termos planetas ativos. Lógico que isso não quer dizer que todo planeta rochoso é ativo, mas pelo menos existe potencial para isso.”

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Dia terrestre só tinha 18 horas há 1,4 bilhão de anos https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/06/05/um-dia-na-vida-da-terra-ha-14-bilhao-de-anos-so-tinha-18-horas-e-40-minutos/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/06/05/um-dia-na-vida-da-terra-ha-14-bilhao-de-anos-so-tinha-18-horas-e-40-minutos/#respond Tue, 05 Jun 2018 09:00:56 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/61_earth_moon_galileo-320x213.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7773 Se você hoje em dia não tem tempo para nada, saiba que a sua sorte é não ter nascido 1,4 bilhão de anos atrás. Naquela época, o dia na Terra durava apenas pouco mais de 18 horas.

Este é um dos resultados obtidos por um novo estudo que faz uma impressionante combinação de geologia com astronomia para desvendar os segredos do passado remoto do Sistema Solar. Stephen Meyers, da Universidade de Wisconsin-Madison, e Alberto Malinverno, da Universidade Columbia, ambas nos EUA, publicaram seus resultados na PNAS, a revista da Academia Nacional de Ciências americana.

Sabe-se há bastante tempo que a Lua está gradualmente se afastando da Terra e que, ao mesmo tempo, a gravidade exercida por nosso satélite natural vem freando gradualmente a velocidade de rotação do planeta — os dias vêm ficando um tantico de nada mais longos com o passar dos tempos, e por isso de vez em quando o pessoal adiciona um segundo a mais no último dia do ano, para reajustar tudo.

Também sabemos que certos padrões orbitais repetitivos envolvendo os mundos mais internos do Sistema Solar influenciam a órbita e o eixo de rotação terrestres, com isso alterando o clima — são os chamados ciclos de Milankovitch, que podem explicar mudanças ambientais ocorridas em escalas que vão de milhares e centenas de milhares de anos.

(Para mudanças climáticas como as que estão acontecendo agora, medida em décadas ou menos, só mesmo uma grande catástrofe ambiental, como a alteração radical do nível de radiação solar, o impacto de um asteroide, supervulcanismo ou a ação de uma espécie inteligente viciada em petróleo.)

É possível explicar por modelos astronômicos a periodicidade do ciclos de Milankovitch, assim como encontrar evidências geológicas deles ao estudar amostras de formações rochosas cuja idade se conhece. Contudo, existe um limite para o quanto essas duas estratégias podem mergulhar nas brumas do passado. Mesmo um sistema planetário “ordeiro” como o nosso deve sofrer variações que vão além do previsível em escalas de tempo que ultrapassam os 50 milhões de anos. E nem sempre se pode datar com precisão amostras de rocha ou encontrar parâmetros seguros ligados às condições ambientais do nosso planeta na época em que elas foram formadas.

O segredo do sucesso no trabalho de Meyers e Malinverno foi combinar as duas estratégias num único modelo integrado de análise estatística, com isso reduzindo significativamente as incertezas.

Para o estudo, os pesquisadores se concentraram em amostras da Formação Xiamaling, na China, que sabidamente têm 1,4 bilhão de anos, e da Cadeia Walvis, no Atlântico Sul, com idade de 55 milhões de anos — esta última só um cadinho fora do que modelos puramente astronômicos podem prever com segurança.

Jogando os dados todos em seu modelo estatístico, eles obtiveram, como seria de se esperar, parâmetros muito próximos dos atuais para a mais recente das medidas. Um dia há 55 milhões de anos durava aproximadamente 23 horas e 48 minutos. Hoje, uma rotação completa da Terra dura 23 horas e 56 minutos (o chamado dia sideral, medido com relação às estrelas distantes; se medirmos com relação ao Sol, levando em conta a translação do planeta, chegamos às familiares 24 horas). De forma correspondente, a Lua estava mais perto, a uma distância média de 383,1 mil km. Hoje, a distância média é de 384,4 mil km.

Quando o assunto é a Formação Xiamaling, de 1,4 bilhão de anos, a mudança é bem mais radical. De acordo com os pesquisadores, a Lua estava a 340,8 mil km nessa época, e o dia terrestre era de modestas 18 horas e 40 minutos.

Além de reduzir enormemente as incertezas (tanto na idade das amostras como de parâmetros astronômicos, como a posição da Lua), o modelo ajuda a desvendar o passado dinâmico do Sistema Solar. Afinal, os ciclos de Milankovitch, que podem ser determinados no passado geológico com mais precisão graças a essa redução das barras de erro das medidas, estão associados às interações gravitacionais dos cinco planetas mais internos (de Mercúrio a Júpiter).

O estudo também corrobora a noção de que a taxa de dissipação da velocidade da rotação terrestre vem crescendo com o passar do tempo. Modelos que usam a taxa atual para projetar épocas passadas indicam que a Lua estaria a meros 270 mil km da Terra há 1,4 bilhão de anos. A nova estimativa a coloca bem mais distante, a 340 mil km, o que está corrobora certos modelos dinâmicos da interação Terra-Lua.

E o mais legal disso tudo é que se trata apenas de um aperitivo, com duas únicas formações rochosas. “A aplicação dessa metodologia a registros sedimentares que se estendem por toda a história da Terra facilitarão a calibração da escala de tempo geológico, circunscreverão a história do sistema Terra-Lua no passado distante e são promissoras na reconstrução da evolução das frequências orbitais fundamentais do Sistema Solar ao longo de bilhões de anos”, escrevem os autores.

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O vaivém do campo magnético da Terra https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/21/o-vaivem-do-campo-magnetico-da-terra/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/21/o-vaivem-do-campo-magnetico-da-terra/#respond Mon, 21 May 2018 05:00:19 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/campo-magnetico-terra-320x213.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7721 Alô, adeptos de fake news, teorias da conspiração, hipóteses de fim de mundo e simpatizantes! O tema hoje é um dos favoritos de vocês: o campo magnético da Terra — nossa principal linha de proteção contra partículas carregadas nocivas vindas do espaço cósmico. Sabemos que ele está paulatinamente se tornando mais fraco ao longo das últimas décadas, a um ritmo de 5% por século.

É para preocupar? Há quem diga que ele vai desligar, nos deixando ao menos temporariamente desprotegidos. Há os que defendam que ele vai passar por uma reversão — polo norte vai virar sul, e sul, norte –, como já aconteceu tantas outras vezes na história da Terra.

Um novo estudo liderado por Maxwell Brown, da Universidade da Islândia, e publicado na revista da Academia Nacional de Ciências dos EUA joga água nessa fervura e diz que provavelmente nada tão radical assim vai acontecer — pelo menos não tão já.

A chave para a predição é a chamada Anomalia do Atlântico Sul, uma região entre a América do Sul e a África em que o campo magnético é estranhamente mais fraco.

Os pesquisadores criaram, a partir de evidências geológicas, um modelo da evolução do campo magnético terrestre entre 30 mil e 50 mil anos atrás, cobrindo os dois últimos “bugs” da magnetosfera, que, segundo o registro geológico, ocorreram 41 mil e 34 mil anos atrás.

Em ambos os casos, a mudança súbita do campo magnético foi antecedida por um quadro que não tinha uma única anomalia com estrutura similar à do Atlântico Sul.

Em compensação, em momentos em que houve uma situação como a atual, há 49 mil e 46 mil anos, o que houve foi uma posterior recuperação do campo magnético. É o que os pesquisadores apostam que vai acontecer agora. Mas, mesmo que eles estejam errados, os arautos do apocalipse podem colocar as barbas de molho. A humanidade já existia durante esses últimos eventos de mudança do campo magnético e sobreviveu muito bem, obrigado.

A coluna “Astronomia” é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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Sonda parte neste sábado para fazer o primeiro “checkup” de Marte https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/04/sonda-parte-neste-sabado-para-fazer-o-primeiro-checkup-de-marte/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/04/sonda-parte-neste-sabado-para-fazer-o-primeiro-checkup-de-marte/#respond Fri, 04 May 2018 19:12:41 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/insight-320x213.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7660 E lá vamos nós de novo para o planeta vermelho. A mais nova investida vem da Nasa, que lança neste sábado (5) a sonda InSight. Se tudo der certo, a espaçonave deve pousar no quarto mundo a contar do Sol em novembro, para fazer o primeiro “checkup” de Marte.

Pelo menos, essa é a metáfora que a agência espacial americana está usando. Na prática, isso significa detectar potenciais terremotos marcianos (o “pulso” do planeta) e medir o transporte de calor do interior para a superfície (a “temperatura”) e medir a oscilação dos polos marcianos em sua órbita ao redor do Sol (os “reflexos”).

Depois de 4,5 bilhões de anos, vamos combinar que já estava mais do que na hora de Marte passar por um exame médico. Será a primeira oportunidade de compreender como está estruturado o interior do planeta.

O nome da missão tem duplo sentido. Além de ser um acrônimo esperto para Exploração Interior com Investigações Sísmicas, Geodésia e Transporte de Calor (em inglês), também tem o significado de “percepção, lampejo”, e é isto que a sonda espera obter: uma visão mais completa de como se formam planetas rochosos, como o nosso e Marte.

Com pouco mais da metade do diâmetro do nosso planeta (6.800 km contra 12.750 km), Marte é uma Terra em miniatura. E, ao que tudo indica, o planeta vermelho começou bem parecido com o nosso — oceanos, mares, rios e lagos ocuparam boa parte de sua superfície durante seu primeiro bilhão de anos.

O tamanho modesto, contudo, parece tê-lo condenado a uma fossilização precoce. Seu interior se esfriou, o campo magnético do planeta foi desligado, sua atmosfera foi varrida pelo vento solar, o vulcanismo diminuiu brutalmente e o mundo se tornou um deserto gélido. Boa parte da água se perdeu, embora muito dela ainda esteja por lá, congelada sob o solo enferrujado pela oxidação do planeta.

Essa desgraça toda aconteceu aproximadamente uns 3,5 bilhões de anos atrás. Desde então, Marte se tornou um planeta fóssil.

Entender como isso se deu passa por compreender como é a estrutura interna do planeta e no que ela se diferencia da terrestre. Marte tem um manto e um núcleo metálico? Que tamanho eles têm? Ainda há algo em estado líquido nas profundezas? A InSight é como uma “viagem ao centro de Marte” — e isso sem afundar mais do que cinco metros no solo com uma perfuratriz.

HERANÇA TECNOLÓGICA
A espaçonave em si é fortemente baseada na Phoenix, módulo de pouso que desceu próximo ao polo Norte de Marte em 2008. “Algumas das peças inclusive foram reaproveitadas daquela missão”, diz Ramon de Paula, engenheiro brasileiro que trabalha no Quartel-General da Nasa como executivo de programa da missão.

Apesar dessa similaridade, pousar em Marte é sempre difícil, e o fato de ter dado certo em 2008 não quer dizer que vá sair tudo bem agora. “A probabilidade de sucesso é a mesma da que tinha a Phoenix, porque há outros fatores em jogo.”

Com efeito, enquanto a Phoenix desceu proximo a um polo, a InSight vai para uma região colada ao equador marciano, em Elysium Planitia. A nova nave é um pouco mais pesada, vem em velocidade maior e terá menos atmosfera para ajudar na frenagem com para-quedas, uma vez que a área de pouso da InSight tem altitude cerca de 1.500 metros maior que a da Phoenix.

Apesar dos desafios, há grande confiança de que a missão será bem-sucedida. “As estimativas são da ordem de 99,8%, 99,9%”, diz De Paula.

E bem que precisam ser, pelo custo total de US$ 829 milhões.

VAI-NÃO-VAI
Originalmente, a InSight deveria ter voado em 2016. Contudo, os últimos testes do principal instrumento, o sismômetro, revelaram que a cobertura que o protege sofreu uma pequena rachadura em simulações das condições marcianas. Isso comprometia o desempenho científico.

Os engenheiros da Nasa, em parceria com colegas da Cnes, agência espacial francesa e responsável pelo instrumento, bem que tentaram corrigir a ponto de não atrasar a missão. Mas até nisso Marte é jogo duro — só se pode fazer a viagem no momento em ele está apropriadamente alinhado com a Terra, o que acontece a cada 26 meses.

Com o prazo estourado, só restaram duas escolhas: cancelar a missão praticamente pronta para voar ou adiar. E aqui estamos nós, 26 meses e US$ 153 milhões depois, prontos para o voo.

Será a primeira decolagem interplanetária feita da Base Vandenberg da Força Aérea, na Califórnia.

Até então, todas as missões americanas desse tipo haviam sido lançadas da Flórida, que está mais próxima do equador e, com isso, permite lançamentos com maior economia de combustível para esse perfil de voo espacial.

A coifa no topo do foguete Atlas V-401 protege o Insight para o lançamento. (Crédito: Nasa)

DE CARONA
E o foguete Atlas V-401 não levará apenas o InSight, mas também duas pequenas espaçonaves de demonstração tecnológica. São dois cubesats, cada um do tamanho de uma caixa de sapato, mas têm um significado histórico: são os primeiros veículos espaciais do tipo a fazerem uma missão interplanetária.

Os cubesats — satélites de pequeno porte e baixo custo — estão virando uma febre na indústria aeroespacial e têm servido a uma vasta gama de aplicações. Mas, até agora, todas em órbita terrestre. Será a primeira tentativa de expandir seu domínio ao espaço interplanetário.

A missão se chama MarCO, acrônimo para Mars Cubesat One, e os dois pequenos satélites foram apelidados de Wall-E e Eva, em homenagem à animação da Pixar. (A lógica é que eles usam gás de extintor de incêndio, nitrogênio, para manobrar, como o robô Wall-E faz no filme.)

“A missão tem três pontos importantes”, diz Lucas Fonseca, engenheiro aeroespacial que lidera o esforço privado brasileiro de lançar uma missão lunar num cubesat, a Garatéa-L. “Primeiro, validar tecnologias desse tipo para missões interplanetárias; segundo, mostras que se pode fazer missões interplanetárias de baixo custo com cubesats — e isso eu sei bem porque estamos tentando fazer uma missão desse tipo –; e, terceiro, encorajar a miniaturização das tecnologias, o que pode ter impactos importantes em diversas indústrias.”

Wall-E e Eva terão dois objetivos: sobreviver à viagem até Marte e monitorar a descida do InSight, captando sinais do módulo de pouso e retransmitindo-os à Terra.

O lançamento acontece às 8h05 (horário de Brasília), e o Mensageiro Sideral transmite ao vivo.

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Terra já teve atmosfera como a de Titã, diz estudo https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/03/14/terra-ja-teve-atmosfera-como-a-de-tita-diz-estudo/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/03/14/terra-ja-teve-atmosfera-como-a-de-tita-diz-estudo/#comments Tue, 14 Mar 2017 04:00:34 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/03/titan-1-180x180.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6099 Antes do oxigênio, havia o metano. Essa é, em essência, a mensagem de um novo trabalho realizado por cientistas americanos e britânicos, publicado online nesta segunda-feira (13) no periódico da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.

O estudo, que envolveu análises de amostras de rocha da bacia da Gricualândia Ocidental, na África do Sul, e modelos teóricos da atmosfera terrestre antiga, sugere que a Terra já teve, há bilhões de anos e ao menos por curtos períodos de tempo, uma atmosfera similar à de Titã, a maior das luas de Saturno, com uma densa névoa de hidrocarbonetos.

A hipótese, se confirmada, ajudará a explicar de que maneira a atmosfera terrestre deu um salto expressivo e rápido na quantidade de oxigênio há 2,4 bilhões de anos, no chamado Grande Evento de Oxigenação.

O trabalho, que tem como primeiro autor Gareth Izon, da Universidade de St. Andrews, na Escócia, e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos Estados Unidos, se concentrou em investigar o padrão de distribuição de átomos de enxofre e de carbono orgânico ao longo de camadas sucessivas de rocha que remontam a até cerca de 2,8 bilhões de anos atrás.

Com base nessa análise, combinada a modelos atmosféricos, ficou claro que pelo menos um evento em que a atmosfera foi tomada por névoa de hidrocarbonetos aconteceu antes que o ar ganhasse quantidades apreciáveis de oxigênio.

A exemplo do que acontece em Titã, a névoa surge pela separação dos átomos nas moléculas de metano — o mais simples dos hidrocarbonetos — quando expostas à radiação ultravioleta solar. Experimentos em laboratório mostram como esse processo se dá. Mas existe uma diferença entre isso acontecer num recipiente fechado e na atmosfera.

No ar, sobretudo nas camadas mais altas, a destruição das moléculas também leva a grandes fugas de hidrogênio, o átomo mais leve que existe, para o espaço. O metano, CH4, é quebrado e o H escapa facilmente da gravidade do planeta, deixando apenas o carbono para trás.

Em Titã, esse processo é muito mais suave por conta da distância ao Sol, que resulta em nível de radiação menor e em energia contida nas moléculas e nos átomos, idem. Mas na Terra, sugerem os cientistas, essa perda de hidrogênio seria bastante relevante — e serviria como gatilho para o aumento posterior de oxigênio na atmosfera.

“Altos níveis de metano significavam que mais hidrogênio, o principal gás impedindo o aumento do oxigênio, podia escapar para o espaço, abrindo caminho para a oxigenação global”, disse Aubrey Zerkle, pesquisador da Universidade de St. Andrews e co-autor do estudo.

BIOLOGIA MOLDA O PLANETA
O curioso é que tanto o metano atmosférico quanto o posterior oxigênio atmosférico são produtos da vida na Terra. O primeiro é produzido pelos metanógenos — vida microbiana capaz de gerar o gás como subproduto de seu metabolismo — e o segundo pelas cianobactérias — vida microbiana capaz de fazer fotossíntese e converter CO2 em O2. (Em Titã, é importante ressaltar, o metano é muito provavelmente produto de reações não biológicas.)

A dinâmica entre esses dois tipos de criaturas, em conjunto com o ambiente na Terra, acabou determinando a composição da atmosfera — antes e depois do Grande Evento de Oxigenação. E a composição da atmosfera, por sua vez, tem grande papel em influenciar que tipos de formas de vida terão mais chance de proliferar. Basta dizer que os organismos multicelulares todos não estariam aqui não tivesse ocorrido esse processo de oxigenação da atmosfera.

Quanto à duração da fase enevoada da Terra, o atual trabalho é o primeiro a calcular quanto tempo um episódio desses pode ter durado — e é um tempo surpreendentemente rápido (pela escala geológica, claro). De acordo com os pesquisadores, a formação da névoa aconteceu num período de cerca de 300 mil anos e durou por pelo menos 1 milhão de anos, até se dissipar pela destruição do excesso de metano atmosférico.

Os pesquisadores não descartam a ocorrência de mais de um evento como esse ao longo do Arqueano — a segunda grande era da Terra, que ocorreu entre 3,8 bilhões de anos e 2,5 bilhões de anos. Com efeito, há evidências de trabalhos anteriores que indicam uma importante presença de metano na atmosfera durante o período, e os cientistas acreditam que alguns momentos de pico — levando à produção de névoas de hidrocarbonetos — estariam associados a episódios de maior disponibilidade de nutrientes — carbono orgânico e sulfatos — na antiga biosfera terrestre.

OLHO NOS EXOPLANETAS
A importância de compreender a atmosfera da Terra no passado torna-se maior conforme passamos a investigar a composição do ar de exoplanetas lá fora, como os do recém-anunciado sistema Trappist-1. É comum mencionarmos a ambição de detectar uma atmosfera rica em oxigênio, como a nossa atual, indicativa da presença de vida.

Contudo, é igualmente possível que encontremos atmosferas em outras circunstâncias, e não necessariamente indicativas de um planeta morto. Pelo contrário, elas podem meramente representar etapas diferentes da vida, como as que o nosso próprio planeta já vivenciou. Saber como as coisas aconteceram por aqui é fundamental se quisermos interpretar corretamente as histórias que as atmosferas exoplanetárias tentarão nos contar nos próximos anos.

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Cientistas encontram fósseis mais antigos da Terra e se aproximam da origem da vida no planeta https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/03/02/cientistas-encontram-fosseis-mais-antigos-da-terra-e-se-aproximam-da-origem-da-vida-no-planeta/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/03/02/cientistas-encontram-fosseis-mais-antigos-da-terra-e-se-aproximam-da-origem-da-vida-no-planeta/#comments Thu, 02 Mar 2017 04:00:13 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/03/Image-2-iron_structures3.5_200x-1024x776-180x136.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6055 Um grupo internacional de pesquisadores encontrou na província de Quebec, no Canadá, as mais antigas evidências confirmadas de vida na Terra. São microfósseis que têm pelo menos 3,77 bilhões de anos — e podem ser ainda mais velhos que isso.

O achado, publicado na edição desta quinta-feira (2) da revista científica britânica “Nature”, coloca os cientistas mais perto da origem da vida no planeta e confirma que ela se estabeleceu nele com incrível rapidez, o que faz supor que seu surgimento não seja um fenômeno raro.

A idade de 3,77 bilhões de anos para os fósseis recém-encontrados é apenas um valor mínimo. Mas, de acordo com os pesquisadores liderados por Dominic Papineau, do University College de Londres, eles podem ser ainda mais antigos; uma técnica alternativa de estimativa de idade sugeriu que as rochas remontam a 4,28 bilhões de anos atrás.

Chega a ser chocante. A própria Terra se formou há 4,54 bilhões de anos. Caso a estimativa mais antiga de idade dos fósseis acabe se confirmando, o surgimento da vida em nosso planeta teria ocorrido num estalar de dedos do tempo geológico. E, mesmo que a idade real do novo achado esteja mais próxima da mínima, 3,77 bilhões de anos, é um salto de cerca de 300 milhões de anos para trás com relação à evidência fóssil segura mais antiga conhecida até então (sobre a qual o Mensageiro Sideral falou aqui, em 2013).

Um aspecto interessante da descoberta é que ela envolve justamente o ambiente que os cientistas já consideravam como o candidato mais promissor para a origem da vida em nosso planeta: um leito oceânico sob a presença de fontes hidrotermais.

Fumarolas negras no fundo do oceano Atlântico; ambiente é similar ao do registro fóssil encontrado. (Crédito: NOAA)

Os pesquisadores encontraram na rocha uma série de túbulos e filamentos que parecem consistentes com a ação de seres vivos, tanto em sua forma (a morfologia) como na composição mineral fossilizada.

“Com base nas linhas de evidências químicas e morfológicas, os tubos e filamentos são mais bem explicados como restos de bactérias filamentosas que metabolizam ferro, e portanto representam as formas de vida mais antigas reconhecidas na Terra”, escrevem os pesquisadores em seu artigo na “Nature”.

Os autores concluem dando uma dica aos astrobiólogos: “Dada essa nova evidência, sistemas submarinos antigos de fontes hidrotermais deveriam ser vistos como sítios potenciais para as origens da vida na Terra e, portanto, alvos primários na busca por vida extraterrestre.”

ET ONDE?
Atualmente, no Sistema Solar, sabemos que tanto a lua Europa, de Júpiter, quanto a lua Encélado, de Saturno, têm condições semelhantes a essas em seus oceanos, recobertos por uma densa camada de gelo. E, no passado, sabemos que nosso vizinho, Marte, teve condições semelhantes.

Aliás, o planeta vermelho tinha um ambiente essencialmente idêntico ao da Terra — amigável à vida — quando essas bactérias, hoje fossilizadas, estavam botando para quebrar por aqui. O mesmo que aconteceu aqui pode ter ocorrido lá?

A maior dificuldade com que os cientistas se defrontam, a essa altura, é explicar como pode não ter acontecido. Afinal, eram ambientes similares, com a mesma disponibilidade de compostos químicos e tempo similar para o desenvolvimento — isso sem falar na possibilidade de troca direta de material pré-biótico e biológico entre os dois planetas por meio de meteoritos.

“Nós esperamos encontrar evidência de vida passada em Marte há 4 bilhões de anos”, disse Matthew Dodd, estudante de doutorado de Papineau e primeiro autor do estudo, em nota divulgada pelo University College de Londres. “Ou, se não acharmos, a Terra pode ter sido uma exceção especial.”

Duro é encontrar razões para justificar a hipótese da excepcionalidade da Terra, um planeta em tudo mais bastante comum.

Ao mesmo tempo, o fato de esses fósseis só terem sido descobertos agora mostra como é difícil montar o quebra-cabeça do passado remoto da vida — isso na Terra, onde é simples sair por aí e vasculhar o planeta inteiro.

Imagine como será complicado fazer a mesma coisa em Marte e testar a hipótese de que o planeta vermelho tenha tido vida no passado. Embora aquele mundo tenha uma área total que equivale à de todos os continentes terrestres combinados, a plataforma de pesquisa mais móvel que já mandamos para lá, o jipe Opportunity, andou cerca de 44 km em 13 anos. É um salto gigantesco para um rover robótico, mas ainda um pequeno passo para procurar rochas com potencial para abrigar fósseis de vida marciana antiga.

De toda forma, está claro que vai valer a pena dar uma procurada. Achando ou não alguma coisa lá fora, o certo é que aprenderemos mais sobre as circunstâncias de nossa própria existência.

BÔNUS: Dicas de observação do céu de março!

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A Terra já nasceu grávida? https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/10/20/a-terra-ja-nasceu-gravida/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/10/20/a-terra-ja-nasceu-gravida/#comments Tue, 20 Oct 2015 16:56:20 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=4134 Uma análise de alguns dos cristais mais antigos do nosso planeta encontrou traços de carbono que podem ter sido gerados por atividade biológica há 4,1 bilhões de anos — 300 milhões de anos antes dos indícios de vida mais remotos conhecidos até então. Ou seja, ao que parece, a Terra, que hoje tem 4,5 bilhões de anos, praticamente nasceu grávida.

Nosso pálido ponto azul pode ter tido vida há 4,1 bilhões de anos! (Crédito: Nasa)
Nosso pálido ponto azul pode ter tido vida há 4,1 bilhões de anos! (Crédito: Nasa)

Caso o resultado represente mesmo a ação da vida, será o mais antigo indício biológico na Terra. Até agora, os fósseis mais antigos remontam a 3,5 bilhões de anos e há algumas evidências químicas — embora ainda controversas — de vida há 3,8 bilhões de anos.

O estudo foi conduzido por pesquisadores da Universidade da Califórnia em Los Angeles, e consistiu na análise de 656 grãos de cristais de zircão de Jack Hills, no oeste australiano, com idade superior a 3,8 bilhões de anos, em busca daqueles que pudessem ter carbono incrustado. Acabaram com dois grãos, um dos quais não exibia rachaduras externas, sugerindo que o material interno foi inserido lá durante a formação do cristal.

Realizando datação com base na proporção de urânio e chumbo presente no zircão — urânio tende a decair e se transformar num elemento mais estável numa taxa conhecida –, concluíram que o zircão se formou 4,1 bilhões de anos atrás.

E o mais surpreendente eles descobriram ao analisar os tipos de carbono presentes em seu interior. Carbono é um átomo com seis prótons em seu núcleo, mas o número de nêutrons pode variar. As versões estáveis são as com seis e sete (carbono-12 e carbono-13). Já a com oito (carbono-14) é instável e decai com o tempo (por isso a taxa de carbono-14 é usada para datar amostras).

Ao comparar a proporção desses isótopos (assim são chamadas as versões variadas de cada elemento), os cientistas notaram um enriquecimento anômalo de carbono-12 com relação ao 13. O processo mais comum a produzir isso é atividade biológica — por alguma razão, a vida prefere carbono-12.

Daí a ideia de que esse carbono grafite encontrado no cristal de zircão foi um dia, 4,1 bilhões de anos atrás, parte de um organismo vivo. Mas não necessariamente. “Com certeza, nem todos os sinais isotópicos de carbono leve são biogênicos”, dizem os autores em seu artigo publicado ontem nos “Proceedings of the National Academy of Sciences”, publicação da Academia Nacional de Ciências dos EUA.

Há outros mecanismos que podem ter gerado a proporção menor de carbono-13 sem evocar a presença de vida, mas a hipótese de vida a 4,1 bilhões de anos não é nada absurda. Na verdade, estimativas da época do primeiro ancestral comum de toda a vida na Terra com base na genética colocam essa criatura pioneira mais ou menos nessa época.

UMA TERRA AMIGÁVEL
O surpreendente da história toda, caso seja confirmada, é que ela mostra uma Terra que desde muito cedo já se mostrou habilitada a abrigar formas biológicas. E isso, por si só, já “relaxa” os requerimentos exigidos para a origem da vida. Afinal de contas, essa Terra primitiva, mais de 4 bilhões de anos atrás, estava longe de ser o planeta simpático que é hoje.

Para citar um exemplo, ainda estava por acontecer o bombardeio que produziria as grandes crateras lunares, datado em cerca de 3,9 bilhões de anos. E antes disso o número de impactos também não devia ser nada irrelevante — o Sistema Solar levou um tempo até se aquietar, após sua formação, 4,5 bilhões de anos atrás. A própria Lua teria se formado de uma colisão gigante de um mundo do tamanho de Marte com a Terra naqueles primórdios selvagens.

Mark Harrison, um dos autores do estudo, defende que a Terra já era amigável à vida desde o começo (Crédito: UCLA)
Mark Harrison, um dos autores do estudo, defende que a Terra já era amigável à vida desde o começo (Crédito: UCLA)

Aliás, é justamente por isso que é tão difícil encontrar amostras muito antigas da crosta terrestre, remontando até sua origem — impactos e vulcanismo devem ter remoldado diversas vezes a superfície terrestre ao longo do primeiro meio bilhão de anos.

Para Mark Harrison, pesquisador da Universidade da Califórnia em Los Angeles que participou do estudo, a conclusão é clara: “A vida na Terra pode ter começado quase instantaneamente. Com os ingredientes certos, a vida parece se formar muito depressa.”

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Terra e Lua, o casal mais incrível https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/08/05/terra-e-lua-o-casal-mais-incrivel/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2015/08/05/terra-e-lua-o-casal-mais-incrivel/#comments Wed, 05 Aug 2015 20:36:27 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=3859 Uma câmera da Nasa a bordo do sátelite Dscovr, da Noaa (agência de atmosfera e oceanos dos EUA), fez uma sequência de imagens espetaculares do planeta mais famoso do Sistema Solar e sua inseparável companheira. Veja a Lua transitar à frente da Terra, como se você estivesse num camarote a 1,5 milhão de km do nosso mundo.

Câmera EPIC, do satélite Discovr, registra a Lua passando à frente da Terra (Crédito: Nasa)
Câmera EPIC, do satélite Discovr, registra a Lua passando à frente da Terra (Crédito: Nasa)

E, se tiver uma janela perto e ainda estiver de dia, dê tchauzinho para o Dscovr (pronuncia-se “discover”). Ele está bem acima de você, fotografando nosso planeta continuamente de um ponto em que a gravidade da Terra e do Sol se equilibram. Por isso, ele está o tempo todo visualizando o lado iluminado da Terra. Olhe para o céu e, em algum lugar desse vaziozão, a 1,5 milhão de km, lá está ele. (Não tente fazer isso à noite. Nessa hora, o satélite estará fotografando o Japão, onde é dia.)

Duas coisas importantes a dizer dessa imagem: primeiro, a Nasa estuda o espaço, e o espaço inclui a Terra. Sim, é parte da missão da agência espacial americana investigar nosso próprio planeta. O satélite Dscovr é especificamente dedicado a isso e tem como foco pesquisar as transformações (leia-se “mudança climática”) que nosso mundo tem sofrido recentemente. O projeto foi durante muito tempo “empurrado” pelo ex-vice-presidente americano Al Gore, o que rendeu ao satélite o apelido de “Goresat”. Então, nem venha com aquela conversinha de “ah, como gastam dinheiro em coisas inúteis”. É do nosso futuro que eles estão cuidando, pessoal.

E a segunda coisa: quão espetacular é ver o lado afastado da Lua nesse ângulo? Daqui da Terra só vemos o lado próximo, sempre voltado para nós. Mas o lado afastado é interessante (e foi fotografado pela primeira vez em 1959, se não me engano, pela sonda soviética Luna-3). Tem muito menos daquelas bacias escuras (os chamados “mares” lunares, que, naturalmente, não são de água, mas de lava seca), e isso é um genuíno mistério lunar. Por que o lado afastado é diferente? Há possíveis explicações sobre o efeito do calor terrestre sobre a Lua, mas ainda é um caso que merece mais estudos. Temos tanto a aprender. Por isso precisamos ir até lá.

Agora, convenhamos, o que mais impressiona mesmo é a beleza. Nosso pálido ponto azul e sua eterna companheira, enlaçados numa valsa interminável ao redor do Sol.

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