Mensageiro Sideral https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br De onde viemos, onde estamos e para onde vamos Sat, 04 Dec 2021 19:09:39 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Planetas geologicamente ‘vivos’ devem ser comuns na Via Láctea, diz estudo https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/11/29/planetas-geologicamente-vivos-devem-ser-comuns-diz-estudo/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/11/29/planetas-geologicamente-vivos-devem-ser-comuns-diz-estudo/#respond Thu, 29 Nov 2018 17:26:12 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/11/Ciclo_do_carbono_Melissa_de_Andrade_Nunes-320x213.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=8378 É consensual entre os cientistas que a Terra é um planeta com vida em parte por ser um planeta “vivo”, ou seja, geologicamente ativo. São esses processos que ajudam a produzir o campo magnético terrestre e alimentam o chamado ciclo do carbono, ambos essenciais à biosfera. E agora um trabalho feito por um grupo internacional de pesquisadores com liderança brasileira demonstrou que ao menos essa característica geofísica não é peculiar ao nosso planeta; pelo contrário, deve ser comum em planetas rochosos espalhados por todo o disco da Via Láctea.

Os pesquisadores analisaram 53 estrelas gêmeas solares, ou seja, astros que mostram aproximadamente a mesma massa, o mesmo diâmetro e propriedades gerais muito similares às do Sol. Por meio de espectrógrafos, é possível analisar a “assinatura de luz” dessas estrelas todas e, a partir disso, identificar sua composição.

O grupo estava à procura de tório na composição desses astros. Isso porque se trata de um elemento radioativo importante na composição do interior planetário; ao sofrer decaimento, ele é uma fonte de calor interno, e com isso ajuda a manter o planeta geologicamente ativo.

“Confirmamos que há um grande orçamento energético do decaimento de tório para manter a convecção do manto dentro de potenciais planetas rochosos ao redor de gêmeas solares, desde a formação do fino disco galáctico até agora”, escreveram os pesquisadores em artigo publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

O trabalho tem como primeiro autor Rafael Botelho, orientando de doutorado de André Milone no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), e tem importantes implicações para uma avaliação do potencial para a vida na Via Láctea. “O mais empolgante é que parece que o tório também é abundante em gêmeas solares velhas, significando que o disco da galáxia pode estar repleto de vida, tanto no espaço quanto no tempo”, diz Botelho.

Não custa lembrar que o Sistema Solar é relativamente recente, comparado à idade da galáxia. Enquanto o Sol e sua família de planetas nasceram cerca de 4,5 bilhões de anos atrás, a Via Láctea, ainda que numa forma mais primitiva, já está por aí há mais de 10 bilhões de anos. Ou seja, há estrelas e planetas muito mais velhos que o Sol e a Terra, e a implicação é que mesmo nesses tempos mais antigos já havia concentração suficiente de tório para servir como “bateria de energia” para a atividade geológica.

É uma descoberta importante, uma vez que sabemos que o Universo nasceu apenas com elementos leves (hidrogênio, hélio e lítio), há 13,8 bilhões de anos, e foi apenas gradualmente se tornando mais enriquecido em elementos pesados, conforme as primeiras gerações de estrelas os foram fabricando e os espalhando pelo espaço ao fim de suas vidas. Aparentemente, esse processo de enriquecimento aconteceu de forma relativamente rápida, de modo que mesmo em épocas bem mais remotas já havia um inventário respeitável de fontes radioativas de calor para o interior de planetas.

O trabalho dá maior amplitude a um estudo feito anteriormente por um grupo da Universidade Estadual de Ohio, nos Estados Unidos, que analisou a presença de tório em 13 gêmeas solares. Com uma amostra mais robusta de 53, com as mais variadas idades, a nova pesquisa consolida as conclusões originais. Em ambos os casos, os dados espectrais das estrelas vieram do Harps, instrumento instalado no telescópio do ESO (Observatório Europeu do Sul) em La Silla, no Chile.

UM PROCESSO COMPLEXO
Mostrar que há energia de processos radioativos para planetas geologicamente ativos em toda a galáxia, contudo, não pode ser confundido com demonstrar que todos os planetas ricos em tório são geologicamente ativos.

Aliás, entender o que mantém o interior de um planeta “vivo” é ainda um problema a ser resolvido. Certamente se trata de uma questão multifacetada. Ter elementos radioativos capaz de gerar calor interno é um dos fatores, mas está longe de ser o único. Outro igualmente importante é a quantidade inicial de calor armazenada no planeta durante sua formação, em razão do processo violento de colisões que o gera. E é bem possível que o efeito de maré também contribua para “chacoalhar” (e assim manter aquecido) um manto planetário.

Um ótimo exemplo disso é a situação dos quatro planetas rochosos do Sistema Solar: Mercúrio, Vênus, Terra e Marte. Ambos se formaram a partir da mesma nebulosa que gerou o Sol, o que nos faz presumir que todos tiveram acesso ao tório presente nela — embora algumas diferenças de concentração possam existir em razão de os planetas terem se originado em diferentes locais do disco de gás e poeira responsável por sua formação ao redor do Sol nascente.

Modelos teóricos do interior dos quatro planetas rochosos do Sistema Solar, mais a Lua. (Crédito: Nasa/JPL)

A despeito disso, apenas Mercúrio e a Terra têm campos magnéticos apreciáveis (gerados no núcleo externo, ao que tudo indica), e apenas a Terra segue com tectonismo ativo. Vênus, apesar de ser praticamente do mesmo tamanho da Terra e dar toda pinta de ser geologicamente ativo, não apresenta sinais claros de placas tectônicas. Marte, por sua vez, que é menor, se mostra geologicamente morto. (A propósito, um dos objetivos da sonda InSight, que acabou de pousar por lá, é determinar quanto calor interno ainda existe no planeta.)

Então, não dá para saltar do fato “há tório” para a conclusão “há atividade geológica”. É apenas um indício de que energia fornecida por decaimento radioativo não é uma limitação para planetas geologicamente vivos.

“Se tivéssemos encontrado níveis muito baixos de tório em outras estrelas, isso poderia questionar o potencial de termos planetas rochosos geologicamente ativos na galáxia”, afirma Jorge Melendez, pesquisador do IAG-USP (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo) e coautor do trabalho. “Como encontramos níveis aproximadamente similares em todas as estrelas estudadas, isso indica que existe potencial de termos planetas ativos. Lógico que isso não quer dizer que todo planeta rochoso é ativo, mas pelo menos existe potencial para isso.”

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Buscar vida em Europa ficou mais fácil https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/07/30/buscar-vida-em-europa-ficou-mais-facil/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/07/30/buscar-vida-em-europa-ficou-mais-facil/#respond Mon, 30 Jul 2018 05:00:51 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/PIA21048_orig-320x213.jpg https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7960 Encontrar evidências de vida em Europa, lua de Júpiter, pode ser mais fácil do que antes se imaginava. Um novo estudo mostrou que uma quantidade razoável de moléculas biológicas poderia subsistir por 10 milhões de anos na camada superior do solo, a uma profundidade tão modesta quanto 1 cm. A constatação foi feita por pesquisadores da Nasa e publicada na Nature Astronomy.

Europa é um dos melhores lugares no Sistema Solar para a busca por vida. Lá, uma espessa crosta de gelo esconde um oceano de água salgada, mantido líquido pelo poderoso efeito de maré de Júpiter.

O oceano deve estar em contato com um leito rochoso e abrigar fontes hidrotermais. Na Terra, esses habitats são candidatos fortes a berço da origem da vida. Mas como saber se o mesmo se deu em Europa?

Uma olhada na superfície da lua revela poucas crateras, indicando que o terreno é novo. Ou seja, há troca constante entre o que há na superfície e no interior. Além disso, há evidências de plumas de água ejetadas a partir de fissuras no gelo. Ou seja, é quase certo que o conteúdo do oceano se deposite na superfície – para então ser destruído.

Europa é bombardeada por altas doses de radiação guiada pelo campo magnético de Júpiter. Isso tem o potencial para desmanchar moléculas de origem biológica. Mas só na superfície.

O estudo constatou que o nível de radiação nas regiões equatoriais destrói moléculas orgânicas nos primeiros 10 cm de solo. Nas latitudes mais altas, a uma profundidade de 1 cm já há proteção razoável.

O trabalho é o prelúdio de duas missões que a Nasa deve mandar a Europa na próxima década. O orbitador Europa Clipper fará um mapeamento da superfície da lua, a fim de escolher o melhor local para a descida de um futuro módulo de pouso. E agora sabemos que ele não precisará cavar mais que 1 cm para encontrar sinais de vida, se eles existirem.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha.

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Marte já teve química orgânica complexa essencial à vida, revela jipe da Nasa https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/06/07/marte-ja-teve-quimica-organica-complexa-essencial-a-vida-revela-curiosity-nasa/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/06/07/marte-ja-teve-quimica-organica-complexa-essencial-a-vida-revela-curiosity-nasa/#respond Thu, 07 Jun 2018 18:00:47 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/curiosity-320x213.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7784 Já sabemos há algum tempo que Marte, em seu passado remoto, foi habitável — ou seja, tinha a capacidade de preservar água em estado líquido na superfície. Agora, graças ao jipe Curiosity, sabemos que ele tinha, na mesma época, os ingredientes necessários para a vida — moléculas orgânicas complexas.

Ao analisar amostras colhidas na cratera Gale com idade de cerca de 3 bilhões de anos, o robô da Nasa estabeleceu de forma conclusiva que havia abundância de compostos orgânicos no planeta. Com efeito, os resultados sugerem um conteúdo orgânico comparável ao de rochas sedimentares ricas nessas substâncias aqui da Terra.

Ninguém está dizendo que houve vida em Marte, claro. Mas saber que os ingredientes estavam lá — água e moléculas orgânicas — é um passo importantíssimo em busca dessa resposta. Tanto que o principal objetivo do Curiosity, assim que chegou a Marte, em 2012, era achar esses benditos compostos. E a busca não foi nada fácil.

Nas tentativas iniciais de detecção, nos primeiros cem dias da missão, a melhor definição para o resultado seria “fracasso”. A quantidade de compostos orgânicos simples era tão pequena que não se podia descartar contaminação da Terra enviada dentro do jipe ou mesmo que a fonte dessas substâncias fossem asteroides a colidir com Marte.

A ausência de compostos orgânicos no planeta vermelho era uma grande surpresa. Afinal, essas moléculas de carbono parecem estar em toda parte no espaço — em asteroides, cometas, planetas, luas e até nebulosas. Por que Marte seria estranhamente empobrecido nelas?

Ocorre que a superfície marciana hoje é bem hostil a moléculas orgânicas. Raios ultravioletas do Sol encontram pouca filtragem na tênue atmosfera daquele mundo, quebrando com facilidade moléculas orgânicas maiores. E, para completar, o solo é rico em percloratos. São moléculas sem graça feitas de oxigênio e cloro, mas que, quando suficientemente aquecidas, se quebram e destroem qualquer molécula orgânica maior que esteja por perto.

Calor não é lá um grande problema em Marte. Mas é um grande problema quando o método de detecção de moléculas orgânicas do seu jipe envolve aquecer a amostra centenas de graus Celsius para ver que moléculas evaporam por lá. Você já começa com quase nada, graças ao ambiente hostil de Marte, e o que ainda restava é destruído pelos percloratos assim que você aquece a amostra. Voilà: uma grande decepção.

A equipe do Curiosity, no entanto, perseverou, procurando rochas mais adequadas para a busca. No fim de 2014, eles anunciaram um grande avanço: uma das amostras recolhidas mostrava uma quantidade de moléculas orgânicas simples tal que se podia descartar qualquer contaminação. Era química orgânica para valer no passado marciano.

Ainda assim, eram moléculas bem pequenas e com cloro, o que indicava uma formação em interação com perclorato. Nada do que seria necessário para a vida ou que indicasse a natureza das moléculas originais que forneceram o carbono. A hipótese de trabalho era a de que, na origem, havia moléculas orgânicas mais complexas, que no entanto foram destruídas por percloratos e tiveram seus átomos recombinados nos compostos simples detectados.

Quase quatro anos depois, chega a resposta definitiva: analisando amostras ainda melhores, e se concentrando apenas nos gases evaporados delas a temperaturas bem altas (assim descartando o que pudesse ser ação de percloratos ou qualquer outro contaminante vindo da Terra), os pesquisadores encontraram moléculas orgânicas relativamente grandes e que continham enxofre — um sintoma de que provavelmente compunham cadeias de moléculas ainda maiores. O proverbial filé orgânico marciano. E tudo isso em perfurações de apenas 5 cm de profundidade em rochas.

O artigo científico reportando a descoberta, que tem como primeira autora Jennifer L. Eigenbrode, da Nasa, sai na edição desta sexta-feira (8) da revista Science. E, na mesma publicação, um segundo artigo relata outra fascinante descoberta feita pelo Curiosity em Marte.

A TEMPORADA DO METANO
Sim, é mais química orgânica. Desta vez na atmosfera. Além de procurar compostos complexos em rochas, o Curiosity tinha como uma de suas metas primordiais fazer a primeira detecção de gás metano na atmosfera, estando ele envolto nela. Resultados anteriores obtidos por telescópios e missões orbitais sugeriam a presença de uma quantidade significativa dele, ainda que medido em partes por bilhão. De novo, foi uma batalha. No início, o Curiosity detectou quantidades tão baixas que esbarravam no limite de precisão do equipamento.

Os pesquisadores então começaram a trabalhar num novo método para diminuir a margem de erro, “enriquecendo” a amostra da atmosfera em metano antes de tomar a medição. E ajudou o fato de que, em 2013, o jipe foi engolfado por uma pluma de metano emanando do solo, que fez saltar a detecção de 0,69 parte por bilhão para 7,2 partes por bilhão.

Certo, mas por que essa neura com metano? São dois os motivos: primeiro, trata-se de uma molécula que não dura muito na atmosfera, sendo logo destruída. O que significa que, se ela existe no ar marciano, mesmo em quantidades pentelhesimais, algo está constantemente lançando mais dela na atmosfera.

E o segundo motivo é ainda mais interessante: ao menos na Terra, a imensa maioria do metano atmosférico é produzido por formas de vida. Pois é. Manja a sua flora intestinal? De vez em quando ela te força a lançar uma pluma de metano no ar que, em Marte, deixaria os cientistas num frenesi nerd.

Por outro lado, há outros meios de gerar metano que não envolvem vida, como um processo químico conhecido como serpentinização. Afinal, o que gera as plumas de metano em Marte?

Desde essa detecção inicial em 2013 os cientistas responsáveis pelo Curiosity permaneceram tomando medidas periódicas do metano na atmosfera. E agora, com dados colhidos ao longo de quase cinco anos (terrestres, três marcianos), eles encontraram uma pista intrigante: a emissão de metano é sazonal.

Os dados revelam que, noves fora os picos gerados por plumas repentinas locais, a quantidade média de metano na baixa atmosfera flutua entre 0,24 e 0,65 parte por bilhão. O pico se dá próximo ao fim do verão no hemisfério norte marciano (inverno no sul). O jipe em si está na região equatorial do planeta, apenas 4,5 graus Sul.

Gráfico mostra o padrão sazonal do metano em Marte. (Crédito: Nasa)

Com esse resultado, os pesquisadores podem descartar várias possíveis fontes para o metano que não apresentariam esse padrão. A aposta deles é que haja grandes quantidades do gás presas no subsolo marciano no interior de cristais baseados em água chamados de clatratos. Para eles, as mudanças sazonais de temperatura poderiam explicar as flutuações na liberação do gás observadas pelo jipe.

Ainda resta a pergunta mais importante: o que teria produzido o metano aprisionado nesses clatratos? Pode ser vida, pode ser outro processo abiótico. A resposta terá de esperar — talvez por novos resultados, mais provavelmente por novas missões. Com efeito, o Trace Gas Orbiter, da ESA (Agência Espacial Europeia), acabou de começar sua missão científica em órbita marciana, e seu objetivo é estudar a distribuição e os padrões de emissão do metano em escala global. Ele poderá corroborar ou colocar em dúvida os atuais resultados do Curiosity, mas certamente agregará mais peças ao quebra-cabeça.

O artigo reportando a sazonalidade do metano em Marte tem como primeiro autor Christopher Webster, também da Nasa, e sai ao lado do texto de Eigenbrode, nesta sexta.

“Ambos os resultados são avanços revolucionários para a astrobiologia”, avalia Inge Loes ten Kate, pesquisadora da Universidade de Utrecht que não participou das pesquisas, mas escreveu um artigo de comentário para a Science.

“A detecção de moléculas orgânicas e metano em Marte tem vastas implicações à luz de potencial vida passada marciana. O Curiosity mostrou que a cratera Gale foi habitável há 3,5 bilhões de anos, com condições comparáveis às da Terra primitiva, onde a vida evoluiu mais ou menos na mesma época. A questão de se a vida pode ter se originado ou existido em Marte é muito mais oportuna agora que sabemos que moléculas orgânicas estavam presentes na superfície naquela época.”

Em 2020, tanto europeus quanto americanos prometem enviar jipes capazes de dar o próximo passo e procurar evidências diretas de vida marciana. Não saia daí.

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Estudo com estrela similar ao Sol ajuda a explicar evolução da vida na Terra https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/30/estudo-com-estrela-similar-ao-sol-ajuda-a-explicar-evolucao-da-vida-na-terra/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/05/30/estudo-com-estrela-similar-ao-sol-ajuda-a-explicar-evolucao-da-vida-na-terra/#respond Wed, 30 May 2018 18:37:19 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/cme-2012-sdo-320x213.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7754 Um novo trabalho feito por uma dupla de astrônomas brasileiras a partir de dados colhidos pelo satélite Kepler ajuda a entender as agruras pelas quais a vida na Terra teve de passar para lidar com o mau humor do Sol, bilhões de anos atrás.

O estudo, feito por Raissa Estrela e Adriana Valio, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, se concentrou na estrela Kepler-96, onde o telescópio espacial da Nasa descobriu um planeta do tipo superterra numa órbita curta de apenas 16 dias.

A estrela Kepler-96 é bastante parecida com o Sol — mesma massa, diâmetro quase igual –, mas significativamente mais jovem: ela tem 2,3 bilhões de anos, enquanto nosso Sistema Solar tem 4,6 bilhões de anos.

Hoje, o Sol é uma estrela relativamente quieta, produzindo apenas ocasionalmente grandes explosões solares. Mas, de forma geral, os astrônomos acreditam que essa calmaria venha com a idade. Com efeito, Kepler-96 é mais agitada que o Sol — e provavelmente representativa do que nossa estrela já foi no passado.

Vasculhando os dados do Kepler, as pesquisadoras perceberam que, em 3 das 84 ocasiões em que o satélite flagrou a passagem do planeta Kepler-96b à frente de sua estrela, o astro central também estava produzindo uma explosão estelar. A mais potente se revelou mais de 50 vezes mais intensa que a explosão solar mais potente já registrada: uma superexplosão.

Qual teria sido o efeito de um evento desses sobre a Terra do passado? Isso foi o que a dupla estudou a seguir, ao investigar o que aconteceria a um planeta como o nosso se ele estivesse na zona habitável da estrela Kepler-96.

Elas modelaram duas possíveis atmosferas — uma sem camada de ozônio, como a atmosfera terrestre primitiva, e outra já devidamente oxigenada pela vida, como é o caso da nossa hoje. Calcularam a quantidade de radiação ultravioleta nociva chegaria à superfície e compararam à capacidade de sobrevivência de dois micróbios bastante estudados pelos cientistas: E. coli e D. radiodurans.

E aí é o tal negócio: só ozônio salva. Ambos poderiam sobreviver tranquilões na superfície, se houvesse essa camada atmosférica protetora. Em compensação, sem ela, nem mesmo a dura na queda D. radiodurans aguentaria o tranco. A não ser, claro, que os micróbios estivessem debaixo d’água. Água é ainda melhor que atmosfera para barrar ultravioleta.

O trabalho mostrou que E. coli poderia sobreviver a uma superexplosão solar se estivesse a 28 metros de profundidade, e a D. radiodurans, a modestos 12 metros.

Os resultados, aceitos para publicação no periódico Astrobiology, ajudam a explicar porque durante tanto tempo a vida na Terra esteve limitada aos oceanos. Somente depois que bactérias descobriram a receita da fotossíntese e começaram a oxigenar a atmosfera, criando uma camada protetora de ozônio, outras formas de vida tiveram chance real de colonizar terra firme.

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Astronomia: Fontes radioativas podem alimentar vida em Europa https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/02/26/astronomia-fontes-radioativas-podem-alimentar-vida-em-europa/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2018/02/26/astronomia-fontes-radioativas-podem-alimentar-vida-em-europa/#respond Mon, 26 Feb 2018 05:00:29 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2014/04/europa-150x150.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7391 Estudo brasileiro mostra que pode haver vida movida a energia nuclear em lua de Júpiter.

FAMÍLIA NUCLEAR
Um novo estudo feito por pesquisadores brasileiros mostra que pode haver vida em Europa, uma das luas-oceano de Júpiter, alimentada pela energia do decaimento de elementos radioativos que devem existir em seu interior rochoso, como urânio e tório. Vida movida a energia nuclear.

NA TERRA COMO NO CÉU
“Quando falamos em energia nuclear, estamos falando de organismos que vivem à base de quimiossíntese, da redução de sulfato. Esse metabolismo existe na Terra, como numa mina profunda na África do Sul, e em lugares mais mundanos, como os manguezais”, explica Douglas Galante, pesquisador do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, em Campinas (SP), e um dos autores do trabalho.

VARIEDADE
A pesquisa consistiu em avaliar a quantidade de energia que deve haver no leito rochoso de Europa proveniente de elementos radioativos, baseado nas melhores informações de que dispomos a respeito da composição da lua. O trabalho mostrou que deve existir uma grande variedade de fontes possíveis de energia em Europa que sejam biologicamente aproveitáveis.

ESQUEÇA O SOL
O Sol está distante demais de Júpiter e suas luas para ser de grande valia como fonte de energia. Mas especula-se que o oceano de Europa, escondido sob sua crosta de gelo, esteja em contato com um leito rochoso, que por sua vez deve ter fontes hidrotermais também capazes de alimentar ecossistemas limitados.

SÓ INDO ATÉ LÁ
Contudo, há uma distância enorme entre “pode haver vida” e “há vida”. Para cruzar esse abismo, a Nasa planeja para a próxima década uma nova sonda, o Europa Clipper, que vai à órbita de Júpiter para caracterizar o conteúdo do oceano de Europa. Ela também buscará o melhor local para um futuro módulo de pouso que possa fazer experimentos na superfície e investigar se há sinais químicos de vida no satélite natural.

A coluna “Astronomia” é publicada às segundas-feiras, na Folha Ilustrada.

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Grupo desenvolve tecnologia para mapear superfície de planetas fora do Sistema Solar https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/12/31/grupo-desenvolve-tecnologia-para-mapear-superficie-de-planetas-fora-do-sistema-solar/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/12/31/grupo-desenvolve-tecnologia-para-mapear-superficie-de-planetas-fora-do-sistema-solar/#comments Sun, 31 Dec 2017 04:00:40 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/12/planets-180x101.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7231 Os últimos 20 anos viram a descoberta de milhares de planetas espalhados pela galáxia, com uma variedade tal que faz o Sistema Solar parecer careta. Agora, um grupo internacional de astrônomos, com participação brasileira, planeja a tecnologia que permitirá estudar a fundo esses mundos.

“A maioria dos grandes telescópios é de uso geral. Nós estamos pensando em construir um que seja dedicado ao estudo de exoplanetas”, explica Marcelo Emilio, pesquisador da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), no Paraná, e participante do projeto liderado pela Fundação Planets (acrônimo “esperto” para Luz Polarizada da Atmosfera de Sistemas Extraterrestres Próximos, em inglês).

O primeiro passo do grupo é desenvolver a tecnologia necessária para observar diretamente a luz vinda dos exoplanetas — uma tarefa nada fácil.

Até hoje, praticamente todos os mundos conhecidos fora do Sistema Solar, fora uma ou outra exceção, foram descobertos por técnicas indiretas: mede-se o bamboleio da estrela causado pelo puxão gravitacional de planetas ao seu redor, ou a redução de brilho estelar quando um planeta passa à frente dela, mas o planeta em si não é observado.

De uns tempos para cá, alguns instrumentos — como o Sphere, instalado no Very Large Telescope, e o GPI, acoplado ao Telescópio Gemini Sul, ambos no Chile — foram desenvolvidos para observação direta.

Contudo, mesmo eles estão limitados a detectar apenas planetas mais jovens (que são mais quentes e emitem mais luz infravermelha, faixa do espectro eletromagnético em que a diferença abismal de brilho entre estrelas e planetas diminui um pouco) e que estejam bastante afastados da estrela — à moda dos planetas gigantes mais remotos do nosso Sistema Solar.

Mesmo usando dois dos maiores telescópios de solo disponíveis hoje, não há possibilidade de que um desses instrumentos possa captar um planeta do tamanho da Terra a uma distância de sua estrela que seja comparável à que nosso mundo guarda do Sol.

A Fundação Planets quer mudar esse jogo, demonstrando um novo modelo de telescópio — não necessariamente maior, mas melhor para a tarefa.

DESAFIO DUPLO
“O telescópio capaz de fazer imagens diretas de exoplanetas precisa de duas coisas: ser grande o suficiente para colher luz espalhada pelo exoplaneta e ter um design que impede o brilho muito maior da estrela de obscurecer o exoplaneta”, explica Jeff Kuhn, pesquisador da Universidade do Havaí (EUA) e idealizador do projeto.

“Até certo ponto você pode tentar compensar o segundo ponto com uma abertura maior, mas nossa crença é de que o mundo precisa de um telescópio que atenda aos dois pontos, dedicado a esses problemas.”

Para demonstrar como fazer isso, o grupo já está construindo o telescópio Planets, um protótipo que deve ficar pronto até o fim de 2019, a um custo de US$ 4 milhões.

Além de envolver a Universidade do Havaí e a Estadual de Ponta Grossa, o projeto também tem apoio da Universidade Tohoku, no Japão, do Instituto Kiepenheuer, na Alemanha, e da Universidade Nacional Autônoma do México.

Em termos de tamanho, o telescópio Planets não impressiona; seu espelho primário tem apenas 1,85 m. Comparado, por exemplo, ao VLT e ao Gemini, com 8 m, ele é nanico. Mas tem uma característica especial: ele foi construído fora do eixo.

Normalmente, telescópios refletores são construídos de forma que o espelho secundário, responsável por levar a luz colhida pelo primário até os instrumentos, fica exatamente na direção da entrada dos raios de luz.

“Por causa disso, a aranha do telescópio [a estrutura que suporta o espelho secundário] fica no caminho e causa um espalhamento maior da luz das estrelas.”

O resultado é que ela “vaza” para muito além da posição pontual da estrela na imagem, ofuscando planetas ao redor. (É esse fenômeno que faz com que estrelas mais próximas apareçam com aquelas pontas agudas, mesmo em imagens do Telescópio Espacial Hubble, que também tem uma montagem tradicional, com o secundário no mesmo eixo dos raios de luz que adentram o primário.)

Fora do eixo, o Planets pretende evitar esse problema, além de testar novas tecnologias para a construção do espelho que devem baratear seu custo.

Combinando essa configuração fora do eixo com um coronógrafo (dispositivo que bloqueia a luz de uma estrela específica), espera-se que, em termos de imagear exoplanetas, ele possa ser competitivo com o VLT e o Gemini, mesmo tendo um espelho primário com um quarto do tamanho.

SÓ O COMEÇO
Contudo, o mais importante é que ele é o primeiro passo num caminho muito mais ambicioso.

Caso o Planets se mostre economicamente e cientificamente recompensador, ele é apenas o degrau de entrada para o desenvolvimento de sistemas capazes de detectar sinais de vida em exoplanetas e até mesmo fotografar suas superfícies, produzindo “mapas-múndis” rudimentares.

O próximo passo nessa escada seria o ELF, sigla para ExoLife Finder, ou Buscador de ExoVida. Ele seria composto por um conjunto circular de 16 espelhos de 5 metros cada um.

Todos esses espelhos teriam uma montagem fora do eixo, e a ideia é combinar o sinal individual de cada um deles numa única imagem, por uma técnica conhecida como interferometria.

Seria equivalente a ter um único espelho gigante de 40 metros, maior do que os telescópios de próxima geração já em construção para a década de 2020.

Concepção artística do ELF (Crédito: Planets Foundation)

Com seu foco dedicado em pesquisa de exoplanetas, ele poderia ser usado por meses a fio para observar o mesmo exoplaneta, acompanhando sua órbita ao redor de sua estrela e capturando sinais luminosos em suas diferentes fases, entre “cheio” e “novo” (pense nas fases da Lua, aplicadas a exoplanetas).

Esses dados, colhidos por meses a fio, seriam integrados por meio de um algoritmo para que se possa extrapolar mapas de sua superfície. Seria possível com o ELF, por exemplo, obter uma visão global da superfície de Proxima b, o mundo terrestre potencialmente habitável que orbita ao redor de Proxima Centauri, a estrela mais próxima do Sol, a 4,2 anos-luz.

Planetas muito mais distantes, contudo, permaneceriam fora do alcance para mapeamento. Mas a Fundação Planets tem um terceiro degrau em sua escada: o Colossus.

Ele teria nada menos que 58 espelhos de 8 metros, todos fora do eixo, com uma imagem equivalente à de um único espelho de 74 m de diâmetro.

Esse projeto, se chegar a ser realizado, ainda está várias décadas no futuro. Mas o futuro já começa agora, com a fase final de construção do pequenino Planets.

Concepção artística do Colossus (Crédito: Planets Foundation)

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Estudo revela segredo do oceano de Encélado https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/11/07/estudo-revela-segredo-do-oceano-de-encelado/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/11/07/estudo-revela-segredo-do-oceano-de-encelado/#comments Tue, 07 Nov 2017 17:40:14 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2015/03/enceladus-180x111.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=7057 Um estudo feito por pesquisadores na Europa e nos Estados Unidos pode ter descoberto o segredo para a manutenção de um oceano habitável sob a crosta da pequenina lua Encélado, de Saturno.

De acordo com o trabalho, publicado nesta segunda-feira (06) na revista “Nature Astronomy”, o satélite natural pode manter seu oceano aquecido, em princípio, por até bilhões de anos, caso seu núcleo rochoso não seja completamente sólido, mas poroso, ou seja, cheio de vazios e interstícios, por onde a água do oceano pode fluir.

A hipótese é consistente com as observações feitas pela sonda Cassini, que de início foram recebidas como total surpresa pelos cientistas. Desde a missão Voyager a Saturno, em 1980, já se desconfiava que Encélado pudesse ter algum tipo de atividade geológica, uma vez que sua superfície se revelava livre de crateras e cheia de sinais de tectonismo.

Contudo, o que a Cassini revelou, a partir de 2005, foi um mundo extremamente ativo, a despeito de seu pequenino tamanho (504 km de diâmetro), com plumas de água sendo ejetadas para o espaço a partir de fissuras na região polar sul de Encélado.

O resultado, consistente com a presença de um oceano global sob a superfície congelada, era inesperado, porque não se imaginava que houvesse força de maré suficiente para manter a água em estado líquido, como há nas luas Europa e Ganimedes, de Júpiter. Encélado era simplesmente pequeno demais para isso, e os modelos sugeriam que ele deveria ter se congelado completamente poucos milhões de anos após sua formação.

A nova simulação tridimensional realizada por Gaël Choblet, da Universidade de Nantes, na França, e seus colegas mostra que este não precisa ser o caso se o núcleo rochoso de Encélado for poroso. Nesse caso, a força de maré agiria nele produzindo fricção capaz de gerar o calor extra para manter o oceano líquido. “Nós predizemos que essa atividade endogênica pode ser sustentada por dezenas de milhões a bilhões de anos”, escreveram os autores no artigo da “Nature Astronomy”.

Curiosamente, o modelo mostra também que existe uma tendência a liberar mais energia nas regiões polares, o que é consistente com a camada mais fina de gelo no polo sul e as plumas que dali emanam para o espaço, abastecendo de partículas o anel E de Saturno.

Modelo da estrutura interna de Encélado; núcleo poroso permite que a água do oceano seja processada em seu interior. (Crédito: ESA)

SEM ENTREGAR A IDADE
O trabalho é um passo importante para explicar as principais características globais observadas em Encélado pela Cassini: um oceano global, forte dissipação da energia de maré, uma espessura menor da crosta de gelo no polo sul e os indícios de atividade hidrotermal no leito rochoso do oceano, detectados a partir da composição das plumas.

Contudo, ele não nos aproxima de descobrirmos a verdadeira idade de Encélado. Há hoje duas possibilidades: ou a lua é tão antiga quanto Saturno e o resto do Sistema Solar, com 4,5 bilhões de anos, como em geral se pensava, ou ela pode ser tão jovem quanto “meros” 100 milhões de anos.

Nessa segunda possibilidade, apoiada por algumas evidências do estudo da dinâmica das luas mais internas de Saturno, Encélado teria se formado junto com os anéis do planeta e seria relativamente recente, fruto do colapso de um sistema primordial de luas destruído por impactos sucessivos.

Como a idade da lua está atrelada à dos anéis, está todo mundo de olho no processamento dos dados colhidos pela sonda Cassini em suas últimas semanas antes do mergulho final na atmosfera do planeta, em setembro. Eles podem indicar a massa total dos anéis e, com ela, uma estimativa mais fiel de sua idade.

A nova modelagem 3D do núcleo de Encélado é agnóstica com relação a isso: seus resultados são compatíveis tanto com uma lua que tem 4,5 bilhões de anos quanto com uma que tem apenas 100 milhões de anos. Contudo, essa pode ser a diferença entre uma lua habitável e uma lua habitada.

Sabemos, pelos dados da Cassini, que o oceano de Encélado tem a capacidade de abrigar bactérias metanógenas com extrema facilidade. Uma questão que fica é: Encélado teve os ingredientes certos para o surgimento da vida? Claramente, diversidade química não deve ter faltado. Os estudos da Cassini mostram a presença de moléculas orgânicas nas plumas que emanam do polo sul, e as simulações dos pesquisadores mostram que, com um núcleo poroso, toda a água do oceano teria sido “processada”, ou seja, teria passado pelo núcleo e experimentado temperaturas mais altas que 90 graus Celsius num período de 25 milhões a 250 milhões de anos.

Por outro lado, sabemos que o surgimento da vida não depende só de diversidade química e gradientes de energia apropriados. Um dos fatores essenciais na equação é tempo. Será que houve tempo suficiente em Encélado? Se a lua tem 4,5 bilhões de anos, pode apostar que sim. Se, contudo, ela tem apenas 100 milhões de anos, esse pode ter sido um fator limitante.

O mistério central de Encélado, portanto, continua. E os pesquisadores admitem isso. “Apenas missões futuras equipadas com instrumentos capazes de analisar as moléculas orgânicas nas plumas com precisão maior do que as medições da Cassini poderão nos dizer se as condições requeridas foram sustentadas por tempo suficiente para que a vida tenha emergido nesse distante mundo oceano”, concluem os autores em seu artigo.

Não sei quanto a você, mas, mal findada a missão Cassini, já não vejo a hora de termos outra espaçonave para explorar Saturno e suas luas.

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Astronomia: Os mistérios que restaram em Saturno https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/09/18/astronomia-os-misterios-que-restaram-em-saturno/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/09/18/astronomia-os-misterios-que-restaram-em-saturno/#comments Mon, 18 Sep 2017 05:00:42 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2015/08/Saturn_Equinox1-e1440985362135-180x156.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6887 Conheça os seis grandes mistérios que a Cassini deixou para a próxima missão a Saturno.

TEMPESTADE HEXAGONAL
Saturno tem uma estranha tempestade permanente no polo norte, que molda os ventos em forma hexagonal. O que a alimenta? Não sabemos, assim como não temos ideia da estrutura mais profunda da atmosfera do planeta gigante.

ESTRUTURA FINA DOS ANÉIS
A Cassini fez observações incríveis de todos os anéis de Saturno. Mas ela não foi capaz de se aproximar a ponto de ver as partículas individuais que os compõem. Uma próxima missão poderia se concentrar nisso, elevando nossa compreensão desse cartão postal do Sistema Solar.

RESPINGOS EM TÉTIS
Com pouco mais de mil quilômetros de diâmetro, a lua Tétis é praticamente toda feita de gelo de água. Esburacada e vulgar, ela não chamaria grande atenção, não fossem arcos vermelhos que cruzam sua superfície. Ninguém sabe como essas estruturas, que mais parecem respingos de tinta, foram parar lá.

O OCEANO DE DIONE
A vizinha de Tétis, Dione, é só um pouquinho maior, e bem mais densa, com um substancial núcleo rochoso. A Cassini obteve evidências consistentes de que ela tem um oceano de água líquida sob a crosta. Mas não será fácil aprender mais sobre ele no futuro, já que ele parece não ter contato com a superfície.

OS MARES DE TITÃ
A maior das luas saturninas merecia até ser planeta: é maior que Mercúrio e tem atmosfera mais densa que a da Terra. Lá, num frio de rachar, metano e etano fazem o papel da água, produzindo nuvens, chuvas, rios, lagos e mares. Que reações químicas bizarras podem acontecer num corpo líquido desses? Mandar uma nova sonda lá poderia elevar a expressão de Camões “por mares nunca dantes navegados” a um novo patamar.

HÁ VIDA EM ENCÉLADO?
Com 504 km de diâmetro, Encélado foi a grande surpresa da Cassini, com um oceano de água líquida sob a crosta e gêiseres no polo sul. A Cassini conseguiu determinar que o oceano teria tudo para abrigar microrganismos como os que existem na Terra. Mas será que tem algo vivo lá? Só uma nova missão, capaz de detectar moléculas orgânicas complexas, poderia responder isso.

BÔNUS: MEU RÉQUIEM PARA A CASSINI
Na edição de sábado (16), esta Folha publicou minha reportagem sobre o final da Cassini. Convido você à leitura, à sua conveniência, claro, clicando aqui.

A coluna “Astronomia” é publicada às segundas-feiras, na Folha Ilustrada.

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Nasa estuda plano para trazer amostras de Marte na próxima década https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/08/29/nasa-estuda-plano-para-trazer-amostras-de-marte-na-proxima-decada/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/08/29/nasa-estuda-plano-para-trazer-amostras-de-marte-na-proxima-decada/#comments Tue, 29 Aug 2017 05:00:09 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/08/mars-sample-return-180x150.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6817 Finalmente a Nasa resolveu tirar a poeira de todos aqueles velhos planos para trazer amostras de Marte a fim de estudá-las na Terra. Um projeto para trazer rochas marcianas — de forma robotizada — pode decolar a partir de 2026.

Foi o que sugeriu Thomas Zurbuchen, chefe do diretório de ciência da agência espacial americana, em uma reunião de diretoria das Academias Nacionais dos EUA. A informação é de Jason Davis, da ONG Planetary Society.

O envio de amostras de Marte para a Terra é essencial de muitas maneiras diferentes.

Ele é tido, por exemplo, como crucial para a busca de sinais de vida — sobretudo pregressa — no planeta vermelho. Isso porque a busca de traços fósseis em rochas que foram modificadas por fluxos de água no passado marciano exige equipamento delicado, que já está disponível em laboratórios terrestres, mas dificilmente poderia ser miniaturizado para ser embarcado num jipe robótico.

Além disso, o retorno de amostras é um passo fundamental para uma futura tentativa de levar astronautas ao planeta vermelho na década de 2030 — objetivo declarado da agência (ao menos no papel). Afinal, antes de usar com humanos qualquer tecnologia que envolva ida e volta de Marte, será preciso testá-la de maneira robotizada.

Por fim, é um passo natural decorrente da missão do jipe robótico já em estágio de planejamento avançado pela Nasa, chamado até o momento apenas de Mars 2020. Como o nome sugere, ele será lançado no primeiro ano da próxima década, e uma de suas atribuições será recolher e armazenar amostras de interesse para um futuro reenvio à Terra.

Concepção artística do Mars 2020 operando em Marte (Crédito: Nasa)

UM DESAFIO E TANTO
Não será fácil, nem barato, tirar esse coelho da cartola. Decolar de Marte será muito mais complexo do que voltar da Lua, como humanos e robôs já fizeram diversas vezes. A gravidade marciana é quase o dobro da lunar, e o planeta vermelho ainda tem uma atmosfera para complicar ainda mais as coisas.

A Nasa não descarta uma parceria com outros países — ou mesmo empresas — na iniciativa. (Sr. Musk, esta é a sua deixa.) Mas não quer dizer também que a agência espacial americana tope qualquer parada. Segundo Zurbuchen, um elemento essencial de qualquer arquitetura de recolhimento e retorno de amostras é o cuidado com a “proteção planetária”. Ou seja, não podemos levar bactérias terrestres que possam colonizar Marte, nem devemos trazer de volta, de maneira acidental, qualquer entidade biológica marciana que porventura possa existir por lá.

“A parte da proteção planetária é absolutamente essencial”, disse Zurbuchen. “Qualquer que seja o parceiro, ele precisa compartilhar nossos valores nisso — sem meios termos.” (Sr. Musk, esse é um recado para o senhor.)

Diagrama mostra arquitetura básica para missão de retorno de amostras (Crédito: Nasa)

COMO SERIA
Tudo ainda é muito vago, claro, mas a arquitetura básica para a missão envolveria o lançamento de um módulo com um veículo de ascensão embarcado nele. Um jipe robótico — talvez o próprio Mars 2020 — levaria as amostras até o veículo, que então seria lançado da superfície marciana, até a órbita do planeta vermelho. Lá, ele acoplaria com um orbitador com capacidade para retornar às imediações da Terra.

E a fase final pode envolver a reentrada da cápsula com as amostras diretamente em nosso planeta ou, quiçá, seu estabelecimento em uma órbita lunar, onde astronautas poderiam ir buscá-la e trazê-la com mais segurança — e menos risco de contaminações acidentais. (Alguém aí se lembra da cápsula Genesis, uma missão de retorno de amostras de partículas do vento solar que teve falha no para-quedas e se espatifou em 2004 no deserto de Utah?)

Até aí, tudo relativamente tranquilo — a Nasa pretende ter a capacidade de enviar astronautas às imediações da Lua até 2023. O que realmente complica a coisa toda é o custo da brincadeira. Uma missão de retorno de amostras de Marte será bem cara, talvez algo como US$ 4 bilhões. É dinheiro de pinga se estivesse no lado do programa tripulado, mas para o orçamento de ciência planetária robótica é uma cifra bem grande. Normalmente,  a despesa anual com todas as sondas não tripuladas (as que estão voando e as que vão voar) gira ao redor de US$ 1,5 bilhão.

Resta saber se a Nasa vai ter a grana para implementar isso, e que outros projetos podem pagar o pato num futuro equilíbrio orçamentário. (Vítimas óbvias seriam as missões robóticas aventadas para Marte depois de 2020.) Por sinal, esse foi o motivo pelo qual a agência só enrolou até hoje com esse assunto. Na década passada, falava-se em um lançamento desse tipo talvez para 2013 ou 2016. E na década anterior a ela, falava-se em 2009, talvez. Ou seja, faz 20 anos que estamos a 10 anos de uma missão de retorno de amostras marcianas. Nada impede que a história se repita.

Algo, no entanto, é diferente desta vez. Outras agências espaciais estão ganhando terreno. Em 2020, a ESA (Agência Espacial Europeia) vai lançar seu jipe ExoMars — uma tentativa de buscar sinais de vida na superfície marciana. Em órbita já temos o Trace Gas Orbiter, da mesma ESA, que tentará decifrar a origem do metano atmosférico marciano, que também pode ter conexão com vida. Ou seja, se a Nasa ficar enrolando demais, pode acabar ficando para trás num jogo em que até então ela sempre esteve muito à frente — e que potencialmente envolve a mais incrível descoberta já feita pela ciência.

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Novo telescópio da Nasa poderá ver as primeiras galáxias do Universo, diz astrônoma brasileira https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/06/29/novo-telescopio-da-nasa-podera-ver-as-primeiras-galaxias-do-universo-diz-duilia-de-mello/ https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2017/06/29/novo-telescopio-da-nasa-podera-ver-as-primeiras-galaxias-do-universo-diz-duilia-de-mello/#comments Thu, 29 Jun 2017 23:30:16 +0000 https://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/files/2017/06/conexao-duilia-180x101.jpg http://mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/?p=6530 Existe uma grande ansiedade para o lançamento do Telescópio Espacial James Webb, em outubro do ano que vem, sobretudo em conexão com o estudo de exoplanetas e a busca de potenciais evidências de habitabilidade e vida fora do Sistema Solar. Mas, quando o próximo grande observatório da Nasa foi projetado, seu objetivo era outro: sua missão principal era — e continua sendo — observar as primeiras galáxias do Universo.

Quem conta essa história é Duília de Mello, astrofísica, pesquisadora associada da agência espacial americana e vice-reitora da Universidade Católica da América, em Washington (EUA).

“O que ele foi feito mesmo para fazer é observar as primeiras galáxias. A gente não sabe quando as primeiras galáxias se formaram. A gente não sabe nem se teve uma primeira geração de estrelas e depois surgiram as galáxias, e é isso que o James Webb vai tentar ver”, afirma a pesquisadora ao Mensageiro Sideral.

Por essa razão, e diferentemente do Hubble, o novo telescópio será um observatório exclusivamente capaz de detectar luz infravermelha. Como o comprimento de onda da luz se estica ao atravessar grandes distâncias, em razão da expansão cósmica, o que era ultravioleta lá nos confins do Universo chega aqui já como infravermelho.

A astrônoma Duilia de Mello, com modelo do Telescópio Espacial James Webb (Crédito: Tommy Wiklind/Nasa)

“A gente vai conseguir então ver as primeiras galáxias, [que se formaram há] 13,5, 13,4 bilhões de anos. Essa é a ideia de observar com o James Webb, e é isso que eu quero fazer também — quero ver ‘baby galaxies’, galáxias bebezinhas, se formando”, conta Duília.

Os resultados que o novo telescópio trará com exoplanetas também empolgam a cientista. “Depois vamos ter de ter uma missão dedicada a exoplanetas, mas com o James Webb já se espera que se possa fazer alguma coisa transformadora, algo que vá ser legal.”

Em termos de pesquisa de exoplanetas, o foco estará sobre os mundos a orbitar estrelas menores e menos brilhantes — as anãs vermelhas, como Proxima Centauri, a estrela mais próxima do Sol. Contudo, há grande discussão entre os astrônomos se planetas na zona habitável dessas estrelas poderiam ou não ter ambientes favoráveis à vida. O James Webb pode ser o tira-teima neste caso.

Antes que ele possa fazer isso, contudo, o telescópio precisa ser lançado e funcionar corretamente. E Duília de Mello afirma que, no momento, esta é a maior preocupação de todos os envolvidos com o projeto. “Ele vai abrir [no espaço] igual a um guarda-chuvinha, e são 65 pontos de abertura. Se um desses der errado, são muitos bilhões de dólares, muita gente a perder o sono. Essa é a ansiedade atual.”

Concepção artística do James Webb no espaço (Crédito: Nasa)

Confira a seguir o que Duília de Mello tem a dizer sobre a inserção das mulheres na ciência, o que está reservado para o futuro do Hubble, qual telescópio a Nasa pretende lançar depois do James Webb, que pesquisas ela está conduzindo agora e qual foi a grande questão científica que já chegou a tirar seu sono, na entrevista completa.

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