O asteroide que faz roleta-russa com Júpiter
Todo mundo sabe que é bem perigoso passar perto de Júpiter. Na melhor das hipóteses, sua gravidade poderosa desviará sua trajetória — como aconteceu com as naves Voyager, rumo ao planetas mais exteriores. Na pior, você acabará mergulhando nele — como aconteceu com o cometa Shoemaker-Levy 9, em 1994. Mas, de acordo com um trio de pesquisadores, um asteroide resolveu fazer o mais perigoso dos jogos, o equivalente de uma roleta-russa astronômica: ele orbita exatamente na mesma faixa de Júpiter, só que no sentido contrário!
O temerário bólido celeste é conhecido pelo nome 2015 BZ509 e foi descoberto há dois anos, pelo sistema de busca de asteroides Pan-STARRS. Seu comportamento temerário, no entanto, só foi caracterizado agora, com o devido acompanhamento de sua trajetória por um longo período de tempo. O trabalho foi feito pelo grupo de Paul Wiegert, da Universidade de Ontário Ocidental, no Canadá, com o LBTO (Large Binocular Telescope Observatory), no Arizona (EUA), e publicado no periódico “Nature”.
O período orbital do BZ509 é o mesmo de Júpiter, o que por si só não é um grande problema. Com efeito, duas grandes populações de asteroides — chamadas de troianos — co-orbitam com o maior planeta do Sistema Solar sem grandes problemas. Eles estão concentrados à frente e atrás de Júpiter, nos chamados pontos lagrangianos, e evoluem no mesmo sentido que ele, de forma que nunca há um encontro fatal. São mais de 6.000 troianos conhecidos.
Só que o BZ509 é uma espécie de anti-troiano. Ele co-orbita com Júpiter, mas no sentido oposto ao do planeta (e de 99,99% dos asteroides no Sistema Solar). Aí, como você pode imaginar, os dois astros fazem um encontro próximo duas vezes por volta, e no entanto não colidem. (Dê uma olhada na órbita de ambos no vídeo abaixo.)
Uma avaliação superficial levaria à conclusão de que tamanho desafio ao poder joviano só poderia terminar em tragédia. Contudo, estudos mais aprofundados confirmam que é possível viver perigosamente no Sistema Solar e ainda assim escapar ileso, como é o caso do BZ509.
Com efeito, a existência de um objeto assim foi predita, dois anos antes que ele fosse descoberto, pela astrônoma portuguesa Helena Morais, professora da Unesp (Universidade Estadual Paulista) no campus de Rio Claro.
“Comecei a estudar as ressonâncias retrógradas em 2012”, conta Morais ao Mensageiro Sideral. “Na altura estava interessada no problema da estabilidade de planetas em sistemas binários. Tinha sido anunciado um novo planeta na estrela binária Nu Octantis detectado pelo método da velocidade radial, mas uma órbita prógrada era instável, o que levou à sugestão de que o planeta estaria em órbita retrógrada, em relação ao movimento orbital do binário. Percebi que as órbitas retrógradas eram mais estáveis por causa da natureza das ressonâncias entre os períodos orbitais do planeta e binário. Quando o planeta tem movimento retrógrado as ressonâncias são mais fracas e têm uma zona de influência menor. Por isso no caso do movimento retrógrado a zona de instabilidade é menos extensa. Já agora, ainda não é certo que exista mesmo um planeta no sistema Nu Octantis.”
Mas foi o suficiente para que Morais passasse a estudar de forma completa e rigorosa os padrões de ressonâncias retrógradas e os aplicasse aqui mesmo, em nosso Sistema Solar, numa parceria com Fathi Namouni, do Observatório de Nice, na França. “Em artigo de 2013, identificamos asteroides com órbitas retrógradas e em ressonâncias com os planetas Júpiter e Saturno. Não havíamos, no entanto, identificado nenhum objeto atualmente na ressonância co-orbital, em que a razão entre os períodos orbitais entre asteroide e planeta é 1:1.”
Com a descoberta de Wiegert, Morais e Namouni foram chamados a escrever um artigo de comentário sobre o trabalho, publicado na mesma edição da “Nature”.
A órbita do BZ509 não está precisamente alinhada com a de Júpiter num mesmo plano, de forma que ele nunca passa realmente muito perto do planeta gigante. “A ligação entre o asteroide e Júpiter é distinta, mas gentil: o BZ nunca chega mais perto de Júpiter que a Terra do Sol: a aproximação máxima entre os dois é de 176 milhões de km”, diz Wiegert.
E, mesmo que estivessem exatamente no mesmo plano orbital, Morais ressalta que o sistema poderia ser estável, porque a configuração evitaria um encontro dos dois astros.
Estima-se que a órbita do asteroide temerário seja, na verdade, bem estável e dure pelo menos 1 milhão de anos.
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Casquei o bico agora, tava lendo a parte da entrevista e na primeira lida entendi estrela binária Nibiru
GP que deve ver essas coisas direto 😛
Bom, esse asteroide prova que em tudo tem alguém “do contra” 😛
Complementando essa publicação, também foram encontrados asteroides na orbita troiana de Marte que possuem a mesma composição e presumem se tratar de restos de um planeta. http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=restos-planeta-destruido-encontrados-orbita-marte&id=010130170420#.WQIMH-K5E9U
Muito boa a matéria, e outras do mesmo site. Valeu por ter postado!
Pra mim, isso não é novidade. Joguei muito “Asteroids – Atari 2600” e sei que eles podem trafegar em todas as direções. Flw!
Eu joguei Megamania e concordo com você.
Eu era muito bom.
Salva, conserta aí: “Tinha sido anunciado um novo planeta na *estreal binária”, porém dá pra entender de boa.
Consertado!
Caro Salvador… posso não ter compreendido corretamente o conceito, mas isso vai exigir uma revisão no conceito de “planeta anão”?
Afinal, temos que Júpiter não conseguiu limpar sua órbita… ou acabaremos por considerar o BZ509 um satélite retrógrado do planetão?
Ou sou eu que estou com órbita retrógada e confundindo arroz doce com torresmo???
Nada precisa mudar. O conceito de “limpar a órbita” é que é impreciso. Mas geralmente é interpretado como “a massa do planeta é mais de 50% de toda a massa naquela região”. Seria impossível qualquer planeta ser planeta se nenhum outro objeto pudesse cruzar sua órbita. Tem muito lixo vagando pelo Sistema Solar…
Oi Salvador. Fiquei impressionado com a animação.
Sabe me dizer o porque daqueles dois aglomerados de asteróides girarem na mesma órbita de Júpiter? E como esse asteróide dançarino é tão pouco afetado pela gravidade de Júpiter, levando em conta que eles se encontram milhares tantas vezes?
O asteroide está numa configuração estável com Júpiter. É só o suficiente para mantê-lo onde está. Como aliás acontece com os milhares a que você se refere, os troianos, que ficam nos pontos lagrangianos 4 e 5.
Podemos afirmar então que esse asteróide teve sua trajetória BEM alterada por algum corpo massivo que passou perto dele – a ponto de enviá-lo em direção ao Sol.
A estrela binária que passou por aqui lá por 70.000 aC não pode ser – não teria dado tempo para o asteróide chegar até o Sol….
Alguma outra hipótese para a órbita retrógrada??
Além da possibilidade de o asteróide ter origem fora do sistema solar e ter sido capturado pelo Sol?
Seria bem improvável, mas não impossível, desconfio.
Ele pode ser um cometa da nuvem de Oort atirado para dentro, ou um asteroide colocado numa órbita retrógrada por encontros planetários.
Mas atirado pra dentro por quem? Netuno?
Por uma colisão, talvez. Pelo planeta 9, talvez. Vai saber. rs
Salvador, o que está por traz dessa tendência de planetas e outros objetos orbitarem seguindo a mesma direção?
O fato de que nasceram todos num disco giratório de gás e poeira.