Cientistas descobrem primeira “Terra gasosa”

Salvador Nogueira
O planeta KOI-314c é pequeno, como a Terra, mas gasoso como Júpiter. Um mistério da astronomia.
O planeta KOI-314c é pequeno, como a Terra, mas gasoso como Júpiter. Um mistério da astronomia.

A ciência dos planetas acaba de ficar mais complicada. Um grupo internacional de astrônomos descobriu um mundo fora do Sistema Solar que tem exatamente a mesma massa da Terra, mas também possui um imenso invólucro atmosférico mais parecido com o dos planetas gigantes gasosos, como Júpiter ou Netuno. Seria uma espécie de “Terra gasosa”, uma aberração sem igual em nosso sistema planetário.

A descoberta foi feita com dados do satélite Kepler, da Nasa, que teve sua missão prematuramente encerrada no ano passado, após um problema técnico. (A Nasa atualmente investiga a possibilidade de voltar a utilizá-lo para caçar planetas, mas com outro modo de operação.)

O anúncio foi feito por David Kipping, do Centro Harvard-Smithsoniano para Astrofísica, nos Estados Unidos, durante a reunião anual da Sociedade Astronômica Americana, em Washington, e mostra que há mais coisas entre o céu e a (nossa) Terra do que até então julgava nossa vã filosofia.

“Esse planeta pode ter a mesma massa da Terra, mas certamente não é parecido com ela”, afirma Kipping, que liderou o estudo. “Ele prova que não há uma divisão clara entre mundos rochosos, como a Terra, e planetas mais encorpados, com os mundos de água ou os gigantes gasosos.”

Chamado de KOI-314c, o planeta orbita uma estrela anã vermelha a aproximadamente 200 anos-luz daqui, completando uma volta a cada 23 dias terrestres. Pela proximidade com a estrela, ele tende a ser quente demais para abrigar vida.

NOVA TÉCNICA

Com um diâmetro 60% maior que o terrestre, ele pôde ter sua composição básica estudada pelos astrônomos graças a uma nova técnica que permite calcular, além de seu tamanho, sua massa. Dividindo massa sobre volume, pode-se estimar a densidade. E, com base nela, os cientistas podem tentar encaixá-lo a modelos teóricos de composição que batam com os dados observacionais.

Normalmente, os planetas descobertos pelo Kepler só podem ter seu tamanho estimado com alguma precisão. Isso porque o método de detecção consiste em observar os chamados trânsitos — uma ligeira redução no brilho da estrela-mãe quando o planeta passa à frente dela. A diminuição de luminosidade é proporcional ao tanto de luz bloqueada, que por sua vez está relacionada ao porte do objeto.

Até recentemente, a massa só podia ser calculada pela medição dos efeitos gravitacionais que o planeta provoca na estrela-mãe, produzindo nela um suave bamboleio conforme ele avança em sua órbita. Isso exige outro tipo de observação e instrumentação, diferente da usada para detectar trânsitos, o que complicava a pesquisa.

Com a nova técnica, os mesmos dados de trânsito coletados pelo Kepler podem produzir estimativas de diâmetro e de massa. Como? Conforme o planeta vai completando voltas e passando várias vezes à frente da estrela, os pesquisadores buscam por pequenas variações no período entre trânsitos. Se às vezes o trânsito começa um pouquinho mais cedo, ou um pouquinho mais tarde, isso pode ser resultado da interação gravitacional do planeta estudado com um outro mundo próximo. Como interações gravitacionais são ditadas pela massa dos objetos em questão, os pesquisadores podem calcular quanto pesam os planetas. No caso em questão, o KOI-314c tinha um vizinho mais interno, KOI-314b, que completava uma volta a cada 13 dias. Ele tinha mais ou menos o mesmo tamanho (60% maior que o da Terra), mas massa quatro vezes a terrestre.

Outros resultados apresentados na reunião da Sociedade Astronômica Americana pertinentes a essa questão, fruto de estudos de “bamboleio gravitacional” e de aplicação da nova técnica, conhecida como TTV (sigla inglesa para Variações de Tempo em Trânsitos), sugerem que esses planetas cujo tamanho oscila entre um e quatro diâmetros terrestres (ora chamados de superterras, ora de mininetunos) podem ser bem diferentes entre si. Os resultados indicam que, entre os mundos com diâmetro 50% maior que o da Terra ou inferior, a tendência a serem rochosos, como nosso planeta, aumenta bastante. Mas ainda não há uma estatística precisa. E a busca por um gêmeo terrestre idêntico continua. Fique ligado!

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Comentários

  1. Ola Salvador!

    Estive a ler os comentários para não repetir os outros, mas ao fim de 40 desisti :p
    Eu tenho uma teoria:
    – O núcleo do planeta pode ser massivo, mas compacto, e o ambiente onde o planeta se formou muito “pobre”, fazendo com que a gravidade do núcleo atraísse só o que houvesse, ou seja, gazes leves;

  2. Um exercício de imaginação científica tem que ser feito para tentar compreender tais descobertas feitas analisando o espectro da emissão ou da absorção de luz de tais planetas. Mas sem se considerar que tudo o que acontece no Universo é aleatório, a nossa imaginação fica limitada a apenas ao que podemos ver e conhecer. Considerando o aleatório, podemos imaginar que o planeta em questão tem um núcleo pequeno em relação ao seu diâmetro, uma grande capa líquida bastante espessa e uma atmosfera bem densa e que sofre efeitos brutais da proximidade da estrela anã vermelha. No Universo há corpos celestes de todos os tipos e o que existe no nosso sistema solar é uma amostra bem diminuta do que existe por ai e o que é estranho para nós, pode não ser para quem conhece tais mundos ou pelo menos usa de imaginação para tentar ter uma visão provável deles.

  3. Tudo no universo vem da mesma fonte. Esta fonte, que chamamos de vida, contêm o nosso passado, o presente, e o futuro. Na medida em que o homem caminha adiante, ele pode desintegrar ou harmonizar a energia vital. O mal nasce no momento em que passamos a acreditar que é apenas nosso aquilo que pertence a todos; isso provoca soberba, desejos inúteis, e raiva. Mas aquele que não é possuído pelas coisas, termina sendo dono de tudo. PAULO COELHO

  4. O homem apareceu marginalmente no mundo animal, e o seu desenvolvimento mais o marginalizou. Estamos sozinhos sobre a Terra, entre os seres vivos conhecidos.
    E. Morin, sociólogo e filósofo francês, Método V

    O nosso pensamento, a nossa consciência, dão-nos a conhecer o mundo físico, ao mesmo tempo que nos afastam dele.
    E. Morin, sociólogo e filósofo francês, Método V

  5. A visão científica do universo, e a constatação das suas dimensões incompreensíveis, gerou espanto e angústia em filósofos como Pascal. Qual o sentido da vida, num cosmo como o descrito pela ciência? O homem é um nada num universo grotescamente gigantesco. O homem não está no centro da criação, como os mitos e as religiões faziam crer, e as concepções tradicionais do homem e de Deus perderam sentido. O universo que o homem antigo concebeu – povoado de almas, deuses, luzes, vida – era um universo à nossa medida, habitável, em que a vida tinha sentido, em que a Terra estava no centro dos desígnios de Deus. O Universo revelado pela ciência é bastante diferente.

  6. As partículas que se constituíram no início do Universo, esses átomos que se forjaram nas estrelas, essas moléculas que se constituíram na Terra ou noutro sítio… tudo isso também está dentro de nós.
    Michel Cassé, astrofísico francês, Desafio do Século XXI, edição portuguesa: Instituto Piaget.

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