Uma nova forma de adoração do Sol
Eis um cenário ao melhor estilo da abertura de “2001: Uma Odisseia no Espaço”. Começamos com seres humanos do paleolítico, vivendo em cavernas. Observamos seus costumes, separados de nós por dezenas de milhares de anos. Eles criam seus primeiros instrumentos de pedra lascada, usados principalmente para a caça, e vestimentas primitivas feitas da pele de animais. Durante a noite, nossos ancestrais se reuniam ao redor de uma fogueira, à entrada de uma caverna, e contemplavam o céu. Entre seus deuses primitivos decerto figurava o Sol. Eles queimavam ossos de animais e com isso formavam carvão, que usavam para retratar seu dia a dia em belas pinturas nas paredes das cavernas. Em meio a animais e figuras humanas, os antigos também desenhavam coisas do céu. Um tema recorrente, digno de adoração, era o Sol.
Saltamos para a era moderna. O ser humano, em sua constituição física e capacidade intelectual, nada mudou de lá para cá. Mas nossos costumes e tecnologias se sofisticaram. A superstição deu lugar à ciência. Se antes nossos ancestrais estavam limitados a admirar os astros a olho nu e retratá-los com reverência em suas pinturas, eles agora procedem com outro tipo de “adoração”, guiados pela curiosidade de compreender o mundo. Com esse objetivo, engenheiros e cientistas da ESA (Agência Espacial Europeia) projetam uma sonda que vai estudar o Sol de uma proximidade sem precedentes. Para orbitar a cerca de 42 milhões de quilômetros do astro-rei — menos de um terço da distância que a Terra guarda da estrela, e mais perto dela que o planeta Mercúrio –, ela precisará de um revestimento térmico altamente sofisticado, capaz de resistir temperaturas superiores a 520 graus Celsius. Para produzir essa maravilha tecnológica o homem moderno usará… o pigmento usado nas pinturas rupestres da nossa pré-história!
Pensar nessa ligação entre incontáveis gerações humanas, do paleolítico à era espacial, é de causar arrepios. Nós e eles estamos irmanados, a despeito dos milênios que nos separam, nessa curiosidade pelas coisas do céu. E compartilhamos, ainda hoje, tecnologias. Quando a Solar Orbiter for ao espaço, em 2017, ela será insulada da radiação de nossa estrela por um escudo térmico de titânio, revestido com carvão de osso queimado.
Não foi fácil chegar a essa solução pouco ortodoxa. “Logo identificamos um problema com os requisitos do escudo térmico”, disse Andrew Norman, um especialista em tecnologia de materiais que trabalha na missão europeia. “Para absorver a luz solar e então convertê-la em infravermelho para irradiá-la de volta para o espaço, seu material superficial precisa manter ‘propriedades termo-ópticas’ constantes — manter a mesma cor a despeito de anos de exposição à radiação ultravioleta extrema. Ao mesmo tempo, o escudo não pode perder material ou liberar vapores, por causa do risco de contaminar os instrumentos altamente sensíveis da Solar Orbiter. E tem de evitar qualquer acúmulo de carga estática sob o vento solar, porque criaria o risco de uma descarga perturbadora ou mesmo destruidora.”
Diante desses requerimentos, a escolha inicial — fibra de carbono — foi descartada. A equipe precisou procurar soluções criativas, fora das empresas de tecnologia espacial. Tropeçaram então com a empresa irlandesa Enbio, que desenvolveu uma técnica para revestir implantes médicos de titânio. E coube a ela adaptar a tecnologia para a construção do escudo térmico da sonda. Ao aspergir um tipo escuro de fosfato de cálcio — obtido a partir de carvão de ossos queimados — no titânio, ambos se combinam como se fossem um só material, em vez de meramente produzir uma “demão” de pintura externa.
E assim a Solar Orbiter preservará sua eletrônica em funcionamento para captar imagens sem precedentes de nossa estrela-mãe. Após milhares de anos, seres humanos continuam a admirar o Sol e usam tecnologias não de todo dissimilares para registrar suas observações.
Falando em “Odisséia 2001”, juro Salvador: me senti um perfeito idiota quando saí do cinema.
E isso é o mais maravilhoso do filme! Temos a impressão de que travar contato com alienígenas é uma coisa trivial. Eles vão dizer coisas esperadas, como “Cuidado com as armas atômicas”, ou “Cuidado com o aquecimento global”. Mas o encontro com uma inteligência extraterrestre de verdade provavelmente estará além da nossa compreensão. Se, ao ver 2001, você não entendeu nada, você entendeu tudo. 😉
Reassisto até hoje e sempre encontro um gancho novo no filme, para tentar entendê-lo na totalidade. E ainda fica sobrando alguma coisa. Uma obra de mestre, sem dúvida.
E a continuação, 2010, o ano em que faremos contato, também é excelente.
Eu adoro 2010 também, mas é um filme bem mais convencional que o 2001.
Cara, você é muito competente na criação de textos instigantes! Parabéns!
Eu já havia lido matéria sobre isso, mas bolar toda essa “conexão poética” que você fez entre nós e nossos ancestrais (os três primeiros parágrafos, principalmente) é digno de felicitações. 🙂
Valeu! 🙂
Vish, viu isso Salva?
http://noticias.uol.com.br/ciencia/ultimas-noticias/afp/2014/02/24/astronomo-grava-impacto-de-asteroide-contra-a-lua.htm
Vi sim. Tou querendo fazer um post disso pra amanhã de manhã! 😉
Mas já desisti, vendo que o UOL já deu… 😛
O Salvador deve ter um capacete de titânio revestido de pigmentos de carvão oriundo da queima de ossos contra certos comentários críticos, bestas e desnecessários!!!kkk
Pior que não.
Prezado Sr nogueira, boa tarde. Por favor, de uns tempos para cá tive curiosidade de conhecer a galaxia, estou curioso as cores que aparecem na imagem, sei que são retocadas, mas são realmente estas cores que conseguimos, exemplo desta foto, um laranja bem forte, enxergar de um telescópio? Obrigado
Esta é uma concepção artística. No caso de fotos, depende da frequência observada e dos filtros usados na captura da imagem.
Oi Salvador.
Tem como saber mais detalhes do processo de combinação do titânio com o material oriundo dos ossos?
Parabéns pela matéria.
Cleston, creio que não, porque a técnica é de uma empresa privada que dificilmente revelará seu segredo industrial. Abraço!
Que lindo, né? toda essa tecnologia aliada a um ingrediente tão básico! (e antigo!!)
Acabo de ler no Yahoo, que um astrônomo espanhol gravou o impacto de um asteroide de 60 cm a 1,40 m de diâmetro e viajava a uma velocidade de 60.000 km/h.
“A Royal Astronomical Society (RAS) britânica, que informa sobre o ocorrido em sua revista mensal, indicou que o evento de oito segundos de duração foi tão luminoso quanto a estrela polar, razão pela qual poderia ter sido visto a partir da Terra sem a necessidade de telescópios.”
Ainda bem que temos muitos parachoques.
Por que tanta proteção? Não bastaria ir lá num dia nublado?
Falando sério, um espelho de altíssima pureza e grau de reflexão não seria eficiente? Ou uma proteção que seria descartada em camadas para que sempre estivesse em boas condições sem afetar os instrumentos?
OFF:
http://meiobit.com/280372/astronomy-photographer-year-competicao-para-quem-gosta-de-fotografar-estrelas/
Ótimo post e uma maravilha da tecnologia moderna, apesar da concepção artística da foto estar muito errada quanto a verdadeira distância do sol.
Hj vemos o sol com 0,5º de arco e a sonda estando a 42milhoes de km verá o sol com 1,89º de arco, isso equivale a ver uma bola de basquete a 7 metros de distância.
Depois tem gente que ainda fala que “o homem nunca foi à Lua porque não tinha tecnologia na época”. Aí, usando “tecnologia” de milhares de anos, vai ser possível mandar uma sonda bem próxima do Sol. Irônico, né não?
#chupaconspiracionistas
E o prémio Nobel de Analogia sofismática vai para……….Tu!
Carvão queimado combina com rosto pintado. O Sol é adorável. Pegaram no pé da tradução : a literal sempre é melhor e requerimento não está errado ; é como ‘recollection’ por recolhimento, basta pensar na pessoa recolhida e pronto, serve. A adoração é feita à distância : é vão pegar o Sol com a mão ; basta repetir Om … ( brincadeira ). Muito bom. Impressionante o Sol manter ao Seu redor planetas tão distantes – haja força.
Essa força não é só devido ao Sol, mas aos dois corpos: massa do sol e do planeta.
não dá para comparar os dois colocando tudo no mesmo prato : o Sol é o centro e fornece ininterruptamente luz e calor enquanto o outro lado só recebe. o tamanho tb é desproporcional. ou seja, não dá para dizer que atraímos o Sol para nós e o fazemos girar ao nosso redor. divago.
Sugiro ao autor adotar o costume de publicar o link para o artigo que inspirou o post. Neste caso: http://www.esa.int/Our_Activities/Space_Engineering/Prehistoric_cave_pigment_to_shield_ESA_s_Solar_Orbiter
Quanto ao “carvão” de osso, caberia a observação de que isso é uma simplificação do processo químico, pois ossos não se queimam e viram carvão, como acontece com a madeira. Os ossos são sim colocados no fogo e se transformam em outra substância usada como pigmento, mas o osso em si não “queima” nem vira “carvão”. Perguntem aos funcionários dos crematórios.
Alex, acho suficiente sempre citar a fonte da informação no texto, mas sem o link. Mas agradeço pela dica. E eu não disse que os ossos viram carvão. Disse que o pigmento é o carvão produzido pela queima de ossos.
Burro só sabe dar coice né?
Te acertou, Salvador? hauauua
Opa, de vez em quando voa uma patada aqui. Mas tenho conseguido desviar… rs
Alex,
Pega um pedaço de carvão e risque…
Agora pega o pó de osso queimado (carbonizado) e risque…
Incrivelmente você terá o mesmo efeito…
Obs.: Não faça como os homens da caverna e risque a parede de sua casa, sua mãe pode não gostar! rsrs
E não se esqueça, faça as experiências sempre com a Supervisão de um adulto… o Beakman agradece!
Nossos ancestrais tinham muito mais livre arbítrio do que temos hoje.
Até pode ser, “SeoPadre”… mas eles não sabiam o que significava… precisavam de alguém que lhes dissesse no que, como e quando acreditar!
Falou, falou, mas um parágrafo apenas sobre a tinta, se fosse redação do ENEM era reprovado
Ainda bem que não é, né? Se fosse redação do ENEM, ninguém gostaria de ler. 😉
Se fosse redação do ENEM… muitos nem chegariam a fazer…. rssssss….
É que… E NEM assim melhora a “ortopédia”…. rssss…. 😀
Realmente, somos os mesmos. O que nos diferencia dos homens das pinturas rupestres é a longa evolução tecnológica e filosófica. Eles usavam o carvão de ossos para desenhar a figura do “deus sol” nas paredes das escuras cavernas, talvez, para adorarem sua imagem no intuito de que este os protegesse durante sua ausência noturna dos céus. Hoje, usamos figuras e imagens, nos templos escuros, que representam o “deus luz” que destronou o sol e as adoramos, com o mesmo intuito de obter proteção dessa nova divindade de plantão, que continua permeando nossa imaginação. Mas, o carvão de ossos foi um belo legado. Parabéns pela matéria.
Boa Salvador… A Soho tem proteção com cerâmica, coisa inventada há milênios pelos chineses. Não é tão antigo como o carvão de ossos, mas percebemos que toda esta tecnologia atual ainda não consegue substituir os materiais mais antigos…
Abraço!
Q?????????
Queima osso aí no forno da sua casa, passa numa bicicleta de titânio e vai pedalando pro sol. Tipo o E.T.
Material antigo superior….Huauaua
Como todo engenheiro sabe, as soluções mais elegantes para problemas complexos são as mais simples…
Esse post me faz lembrar a anedota da caneta e do lápis, na corrida espacial… 😀
Obrigada pela reflexão, Salvador!
Verdade!!!
Completamente diferente.
Quem disse que é simples?
Muito bem lembrado!
Como sempre, bastante informativo e desafiador.
Ótima matéria, muito interessante
Parabéns pela matéria, muito interessante as descobertas sobre o astro rei. Só achei a parte “nossos ancestrais se reuniam ao redor de uma fogueira, à entrada de uma caverna”, uma viagem intergalática na maionese. hehe
Ah bem. A julgar pelo carvão queimado encontrado em sítios arqueológicos, é o que acontecia…
Eles se reuniam em volta do fogo porque eles eram muito pobres e não tinham dinheiro para comprar uma TV para deixá-los muito burros.:
É verdade, se eles tivessem TVs e assistissem BBB, ainda estaríamos na idade da pedra. kkkkk
Tão evoluído, partindo de algo tão simples. Impressionante!
Muitos outros materias de uso “comum” também devem ter propriedades ainda inusitadas, que descobriremos conforme as necessidades.
Quanto tempo ainda falta para encontrarmos um monólito no espaço??? 😀
astro rei
Oi, Salvador. Tenho grande curiosidade por tudo que diz respeito à astronomia e, principalmente, admiro seus textos: são claros (até para leigos) e muito caprichados. Mas hoje você devia estar com um pouco de pressa e não se esmerou tradução da matéria. Vemos algumas coisas como insulada (isolada) e requerimentos (exigências/ obrigatoriedades), por exemplo, que são dignos de tradução feita por software… Mas isso não é suficiente para tirar o brilho (astral) de suas matérias.
C.Bolão. Obrigado pelos toques. Insulado está certo. É o termo usual, técnico. Requerimento cai melhor como requisito, como outro leitor já apontou. Estou mexendo lá. Obrigado pela vigilância.
Uma prova de que praticamente tudo já foi inventado ou utilizado.
Os saltos tecnológico estão agora muito dependentes de evoluções, aperfeiçoamentos e adaptações de materias e equipamentes disponíveis hoje, alguns em aplicações que nada tem a ver com suas possibilidades futuras.
Nem tanto, cristal líquido, nanotubos e outros materiais não podiam ser feitos até poucas décadas atrás. E agora estão projetando materiais especiais em simulações por computador para uso em condições especificas.
Infelizmente ainda tem humanos na atualidade que ainda adoram deuses inexistentes. E o pior, ainda querem empurrar suas crenças goela abaixo nos que não acreditam.
Como disse Lavoisier…. Tudo se transforma( ou evolui ? )
Ou se copia?
ZEI ZINTIA BAZIA ZEI
É a sua, ok? rs
ok
Parabéns pela matéria, apesar de ser geógrafo e, assim, a temática foge um pouco, sou aficionado pela astronomia, não com a competência de entender tudo o que é escrito aqui, mas, com grande admiração. Sempre nos mantenha informado do que se passa pelo nosso universo, Salvador.
Valeu, Leandro! Ainda me lembro com carinho da introdução ao Universo que recebi da minha professora de geografia! Por você passa o caminho dos astrônomos do futuro! Abraço!
As voltas que a vida da… Talvez aquele irmãos pré-históricos tivessem a mais avançada das tecnologias, como imaginamos ter hoje. E, quem sabe, nossos irmãos dos futuros copiarão nossat atual tecnologia, rudimentar para eles…
Nao fale abobrinhas..
Eles fizeram milhares, e milhares de pintura.
A unica que sobrou foi essas pinturas com o material que sera utilizado pela NASA…
Eles pintavam com o que tinham em maos.. e das milhoes te tinta.. somente essa sobreviveu… (isso enao eh inteligencia.. eh acaso)
Não sabia que a NASA usa esse material achei que era a ESA…
Não consigo escolher quem falou mais merda.
Dá um empate técnico para todos.
Minha gente, a tradução em lingua portuguesa para a palavra “requirements” é REQUISITO e nao requerimento. Alooou!!!
requisitos
Puts, cara, como você é inteligente. Quando eu crescer, quero ser como você!!!
Desde quando o texto postado é tradução de um texto em inglês? Ademais, requerimento e requisito funcionam como sinônimos: condição para algo ser alcançado.
Negativo, cara. “Requerimento” é um documento no qual se faz uma solicitação a um órgão público. “Ato ou efeito de pedir por meio de petição por escrito, segundo as formalidades legais” segundo o Houaiss, que devia entender sobre o significado das palavras mais que você.
Requisitar é sinônimo de requerer. Dããã
Requerimento pode ser muito bem entendido como uma variação de requisitos, no caso se trata de um sinônimo.
Ao que apenas devemos usar um ao outro dependendo de um contexto geral.
Ta chato demais essa aulinha de português. 🙁
O Sol, tão distante de nós e é dele que nós dependemos. Nada existiria sem ele. Obrigado Sol.
Brigado nada! 10 real e mais o busão.
kkkkk Sol mercenário…