Plutão à vista!
Como se fazia nas antigas caravelas, este seria um bom momento para gritar a plenos pulmões: “terra à vista!” A sonda americana New Horizons acaba de produzir uma série de fotografias de seu alvo, Plutão, pela primeira vez identificando junto com ele a maior de suas luas, Caronte.
A espaçonave da Nasa viaja desde 2006 com destino ao planeta anão (no momento da partida, inclusive, Plutão ainda era considerado pelos astrônomos o nono planeta) e está a um ano de fazer um voo rasante por esse misterioso mundo.
O objetivo das novas imagens é identificar com precisão a posição do planeta anão e da maior de suas luas, de forma a ajustar com precisão o curso da New Horizons para obter os melhores resultados científicos sem o risco de colidir com nenhum dos objetos ali presentes. E as imagens já revelam uma das mais curiosas peculiaridades desse sistema: Caronte não gira em torno de Plutão enquanto o planeta anão fica parado. Na verdade, ambos giram em torno de um centro de gravidade comum, o que faz com que o objeto central também execute um bamboleio leve, enquanto sua principal lua gira em torno dele.
É um bonito balé, que nos lembra de como funciona a gravitação: ambos os corpos se atraem, e o movimento resultante tem relação com suas massas. Como Caronte tem cerca de 11% da massa de Plutão (com metade de seu diâmetro, 1.200 km contra 2.400 km) e orbita relativamente próximo a ele, a atração gravitacional mútua leva o planeta anão a oscilar de lá para cá e para lá novamente.
Nas imagens, ainda não podemos ver as outras luas conhecidas de Plutão — Nix, Hidra, Estige e Cérbero –, bem menores e descobertas recentemente (duas em 2005 e outras duas em 2012), mas elas devem começar a aparecer diante das câmeras em janeiro.
No próximo dia 29, a sonda entra em hibernação (quatro dias após cruzar a órbita de Netuno, o último dos planetas) e só voltará a ser religada em dezembro, quando começa para valer a perseguição ao planeta anão. O encontro deve acontecer em 4 de julho de 2015 e promete diversas surpresas, na primeira visita de um artefato humano a um objeto residente do cinturão de Kuiper — um repositório de cometas e planetas anões localizado nas profundezas do Sistema Solar.
Plutão já havia sido registrado pelas câmeras da New Horizons uma vez em 2008, mas então ele era apenas um pontinho indistinto sobre um fundo de estrelas. Agora, visto a uma distância de cerca de 425 milhões de km, ele começa a tomar forma. Pode parecer ainda uma distância enorme (e é mesmo, cerca de três vezes a separação entre a Terra e o Sol), mas por outro lado é pouco menos de um décimo da distância que separa hoje Plutão de nosso planeta — cerca de 4,8 bilhões de km. Ou aproximadamente 4 horas-luz, se você preferir contar a distância com base no tempo que um sinal de rádio partindo do controle da missão, na Terra, leva para chegar até a espaçonave.
Nos próximos meses, Plutão sofrerá uma enorme transformação aos nossos olhos. Desde 1930, quando descoberto por Clyde Tombaugh, ele nunca foi mais que um pálido arranjo de meia dúzia de pixels, mesmo sob a óptica poderosa de plataformas como o Telescópio Espacial Hubble. No ano que vem, ele passará a ser um mundo, com montanhas, vales, crateras e sabe-se lá mais o quê, ao ser explorado pela primeira vez por um representante robótico do terceiro planeta a contar do Sol. Como dizem por aí, “audaciosamente indo aonde ninguém jamais esteve”. Eu já estou ansioso.
Salvador, seria Plutão um proto planeta, em plena fase de acreção? Isso até mesmo explicaria a grande quantidade de satélites orbitando um corpo celeste tão pequeno.
No mais, excelente post. Espero com ansiedade ver novas imagens de Plutão e do cometa Churyumov-Gerasimenko em breve por aqui 😀
Não, mesmo no cinturão de Kuiper a acreção está concluída.
Seu blog é demais! Acho muito legal ler tanta coisa interessante, descritas por alguém que realmente entende do assunto!
Bom dia Salvador!
Entendo que existam gigantescos “vazios” no espaço e que “toda a evolução” do Sistema Solar ainda deva estar em andamento, mas por que Plutão estando no cinturão de Kuiper não atingiu um tamanho maior “com tantas ofertas” de detritos cósmicos que permitiram as formações de luas? Seriam a baixa gravidade ou outras interferências ainda por serem identificadas?
Apesar da grande quantidade de detritos, ela está espalhada por uma região orbital muito maior. Acaba que os objetos ficam bem distantes uns dos outros, em média. Embora, claro, colisões ocasionais devam ocorrer.
Acompanho a New Horizons, pelos sites da Nasa, desde o lançamento. Acho fascinante termos (me considero “proprietário” da N.H. também – afinal somos todos habitantes do 3o planeta) uma pequena sonda, não maior que um fusca, se não me engano, solitária, se aproximando dos limites do sistema solar, tantos anos após a Voyagers e a Pioneers! Vida longa a New Horizons!
Desculpe ser chato, mas o texto não está 100% correto quando diz “já revelam uma das mais curiosas peculiaridades desse sistema: Caronte não gira em torno de Plutão enquanto o planeta anão fica parado”. Isto não é uma peculariedade, é normal, como você mesmo sabe, o mesmo acontece com a Terra e a Lua, a diferença que o centro comum fica bem próximo ao centro da Terra, por isso não é “perceptível”. Só acho que podia ser mais claro na explicação, dizendo que pela proporções das massas, o efeito é bem visível. Como disse no início, desculpe ser chato, afinal sempre gosto de ler suas reportagens.
Celso, tudo bem, acho saudável esse nitpicking. Numa boa. Mas acho que, do jeito que está, fica mais sucinto e não considero que esteja errado. O movimento da Terra, sob influência da Lua, é tão sutil que pode ser aproximado a zero. É meio como dizer que a Terra não completa uma rotação a cada 24h, ou nem a cada 23h56, mas a cada 23h56min9s. Preciosismo. Mas, claro, tecnicamente, você está correto. Kepler estava errado. Nenhum objeto fica exatamente parado no foco da elipse das órbitas. Mas, para uma primeira aproximação, parado é bem bom. Menos, claro, para o sistema Plutão-Caronte, que por isso mesmo é peculiar nesse sentido. 😉
Salvador, desde o lançamento da missão eu sempre acompanhei tudo pelos sites da NASA, a quantidade de informações é enorme, com papers, releases…
a quem quiser ver: http://pluto.jhuapl.edu/
e se quiser ver no mapa e acompanhar onde nossa amiguinha se encontra: http://pluto.jhuapl.edu/mission/whereis_nh.php
Abraços…
Um grande salva pro grande Salva! hehehe
Salvador, olha na informação da atual posição da N.H. (15/08, hoje), na primeira foto deste segundo link ai em cima, tanto a distância em Unidades Astronômicas, quanto o tempo em horas-luz, para o sinal atingir a sonda: 8h08m21segundos.
Acho que é isto mesmo, ou eu entendi errado?
Um abraço. cheio de poeira estelar.
Sérgio, a medida, se não me engano, é de ida e volta. Ou seja, sinal parte da Terra, sonda recebe, responde, sinal volta para a Terra. Por isso 8h, em vez das 4h que mencionei. 😉
Uma coisa que eu não entendo, são varias fotos de galaxias, de nebulosas, estrelas e outros corpos celestes espalhadas pelo universo e uma fotografia de um planeta do nosso sistema solar, tão ruim… São vários telescópios ultra modernos que detectam estrelas a milhões de anos luz, e não são capazes de revelar imagens de planetas vizinhos a terra? Com tanta tecnologia deveriam mostrar algumas imagens desses planetas e sua atmosfera, como se fosse uma imagem do Google Maps, sem a necessidade de enviar sondas espaciais e cortar gastos exorbitantes. Sou ignorante nesse assunto mensageiro, gostaria de alguns esclarecimentos. Sei la tem coisas que não vejo logica…
As coisas distantes que vemos são absurdamente grandes – coisas como nebulosas e galáxias, medidas em anos-luz de tamanho. Mesmo estrelas individuais, salvo raras e notáveis exceções, são vistas como pontos de luz. Achar que qualquer satélite seja capaz de ver direito um objeto de 2.800 km de diâmetro (um quinto do diâmetro da Terra) a 5 bilhões de km de distância é muito otimismo.
Obrigado pela resposta Salvador Nogueira, apesar de tudo o universo é algo excepcional e acredito que os avanços estão acontecendo a cada dia que passa…
imagine São Paulo a noite, pense que cada lampada é uma estrela, dependendo de onde voce estiver voce pode ensergar uma lampada acesa a varios quilometros, agora pense que em volta desta lampada há varios insetos , alguns minúsculos voando ao seu redor. Dá para ver os insetos há varios quilometros? Planetas são como minúsculos mosquitinhos sem luz propria orbitando Holofotes gigantescos e mesmo assim os cientistas conseguiram criar meios de encontra-los e estamos no limiar de observa-los diretamente , fantastico não…
Perfeita a analogia!
🙂
Na VA 243, é o que fica mais embaixo, ao lado de Saturno.
Não entendi seu comentário 🙁
Salvador, grato pelo blog! Sinto-me na janela da New Horizons vendo a paisagem! Estamos viajando junto com ela, com Rosetta e outras!