Nasa está a caminho da lua-oceano
Atendendo ao clamor popular americano — se é que o Congresso é mesmo a casa do povo –, a Nasa finalmente decidiu abraçar uma causa que empolga astrobiólogos no mundo inteiro há décadas. Este ano, a agência espacial americana formalizou a criação de uma missão a Europa, a lua oceânica de Júpiter. Trata-se de um dos mais promissores locais para a busca por vida extraterrestre no Sistema Solar.
Já faz alguns anos que os congressistas têm tentado empurrar o projeto, mas a Nasa é uma agência controlada pelo Executivo, e não adianta nada o Congresso incluir recursos para uma missão específica se os responsáveis pelo programa espacial não o abraçarem. Pois bem. Anteontem, ao apresentar a proposta de Orçamento para a Nasa em 2016, o governo por fim cedeu às pressões. O administrador da agência espacial, Charles Bolden, chegou a mencionar o projeto em sua apresentação.
“Olhando para o futuro, estamos planejando uma missão para explorar a fascinante lua de Júpiter Europa, selecionando instrumentos nesta primavera [outono, no hemisfério Sul] e seguindo adiante com a próxima fase do trabalho”, afirmou.
Para 2016, a Nasa solicita US$ 30 milhões para trabalhar no projeto. Quando o Orçamento passar pelo Congresso, que já há três anos tenta empurrar a ideia, esse valor deve aumentar. Como padrão de comparação, em 2015 a agência solicitou US$ 15 milhões para explorar possíveis opções e conceitos para a missão, e os congressistas inflaram a cifra para US$ 100 milhões.
Com esse movimento todo, 2015 deve ser o ano em que a missão a Europa ganhará contornos oficiais. Estamos mesmo a caminho da lua joviana.
POR QUE EUROPA?
O interesse nesse satélite de Júpiter decorre de uma descoberta primeiro sugerida pela passagem das sondas Voyager, entre 1979 e 1980, e mais tarde confirmada pela sonda Galileo, na década de 1990: Europa possui um oceano de água salgada, sob sua crosta de gelo.
Você pode muito bem dar uma de Chefe O’Hara e perguntar: “Como é que pode ser verdade uma coisa dessas, hein, Bátiman?” Ocorre que, apesar de estar muito longe do Sol, numa região em que o nível de radiação solar é insuficiente para conservar água em estado líquido, a lua sofre com o poderoso efeito de maré produzido por Júpiter e pela atração gravitacional das luas vizinhas, Io (mais interna) e Ganimedes (mais externa). Resultado: o “vai-pra-lá-vem-pra-cá” da maré é suficientemente forte para aquecer e derreter o gelo nas camadas internas da lua — vários quilômetros abaixo da superfície.
Sob o oceano, imagina-se uma superfície rochosa, como a que existe no fundo do mar na Terra. Ou seja, tirando pelo fato de que o oceano europano é completamente escuro, ele deve ser bem parecido com os do nosso planeta. Não é difícil imaginar por que ele é tido como um dos melhores lugares para a busca por vida. A julgar pelo que compreendemos do sistema joviano, o oceano de Europa deve ter existido tal como está hoje pelos últimos 4 bilhões de anos. Tempo mais do que suficiente para o surgimento de formas biológicas, ainda que a pequena quantidade de nutrientes e a ausência de criaturas fotossintetizantes possa ter limitado serveramente essa biosfera a criaturas unicelulares.
De toda forma, há motivo mais do que suficiente para ir até lá.
(Para ler mais sobre as possibilidades de vida em Europa, e no resto do Universo, por que você não dá uma olhada no meu último livro, “Extraterrestres”, disponível em livrarias, bancas de jornal e em formato digital?)
A MISSÃO
Nessa primeira missão dedicada, a ideia é fazer estudos orbitais para caracterizar detalhadamente a lua. O conceito que tem sido trabalhado pela Nasa envolve uma espaçonave que entrará em órbita de Júpiter. Inicialmente, o desejo era que o veículo orbitasse Europa, mas há um problema: a região que a lua ocupa no sistema joviano está bem dentro do cinturão de radiação gerado pelo campo magnético do planeta gigante. O ambiente é tão agressivo que os cientistas teriam de gastar praticamente toda a massa disponível para a espaçonave só para escudar seus sistemas eletrônicos.
A alternativa mais simples é colocar a sonda em órbita de Júpiter, fazendo apenas aproximações rápidas e periódicas de Europa. A espaçonave entra no cinturão de radiação, faz as medidas, bate as fotos e sai em seguida, para repetir o procedimento de novo e de novo, em futuras aproximações. Não é tão bom quanto entrar em órbita da lua, mas é quase tão bom quanto, com a vantagem de facilitar muito na hora de projetar a sonda e seus instrumentos.
Uma das coisas mais intrigantes sobre Europa é que, no ano retrasado, cientistas acreditam ter detectado, com o Telescópio Espacial Hubble, plumas de vapor d’água sendo ejetadas do hemisfério sul da lua. Isso significa que a água do oceano pode ocasionalmente “vazar” para o espaço, onde poderia ser analisada por uma sonda em órbita.
Os astrônomos continuam de olho, para ver se detectam novas plumas — não só para confirmar o achado original de 2013, mas também para ajudar a guiar a escolha de instrumentos que possam investigá-las de perto. É importante notar que a sonda Galileo, após passar anos no sistema joviano, não viu nada que indicasse o fenômeno.
O fato de que a Nasa começou a se mexer sobre Europa é extremamente empolgante. Trata-se de um dos mais facinantes lugares do Sistema Solar e certamente esta será apenas a primeira de muitas missões científicas dedicadas à lua joviana. Quem sabe não estão lá, na superfície ou no subsolo, as respostas que procuramos para finalmente aplacarmos nossa solidão cósmica?
Salvador, este mesmo cinturão de radiação que você falou, acaba tornando a ideia de enviar um rover a superfície de Europa algo bastante complicado, não é?
E mesmo que conseguissem revestir todo o equipamento para suportar essa radiação, a mesma não afetaria também a comunicação entre o rover e a terra?
Fico um pouco decepcionado com a ideia de uma sonda em orbita de júpiter dando algumas “esticadas” até Europa, pegando uns dados e voltando. Sei que uma missão no solo depende primeiro de uma orbital. Mas se uma que orbita o próprio satélite já é algo difícil, outra que vá ao solo de Europa algo mais difícil ainda, então nem sei se sonho com uma sonda submersa para os próximos cinquenta anos. O que você me diz?
Para concluir: Europa é tão fascinante, que voltar todas as verbas, olhos, equipamentos e etc, para conhecer esse mundo seria algo completamente válido. Como um satélite orbitando júpiter para receber os dados e nos enviar com mais precisão, ou duas ou três missões visando um pouso na lua, não sei, mas eu preciso viver bastante para ver o que vai dar.
Salvador Nogueira, saudações. Primeiramente gostaria de dizer que gostei do seu livro, embora eu discorde um pouco das críticas quanto ao trabalho de autoria do Erick Von Daniken, afinal, nem tudo o que ele escreveu é falso ou pode ser refutado. Quanto à exploração de Europa, pergunto: por que não lançar uma sonda na superfície do satélite, ou um robô como os que estão em Marte, protegendo-os contra esse campo de radiação, ou pelo menos para durar algumas horas e assim obter medições mais precisas e in locu? A tecnologia já permite isso
O ponto não é se é falso. O ponto é que ele falsificar parte das coisas que escreve coloca sob suspeição todo o resto. Sobre Europa, o problema é o custo. Mesmo para a missão orbital a grana está curta.
Salvador, qual o tamanho mínimo que uma objeto tem de ter para ser considerado uma lua? Alías, qual é a definição de lua?
Não tem tamanho mínimo. Tá orbitando um planeta, é lua.
Mas assim, até um objeto do tamanho de uma moeda seria uma Lua e então haveria várias luas na terra.
A propósito. Se Júpiter é cheio de gás hidrogênio, o que aconteceria se fosse detonada uma bomba nuclear dentro dele?
Ele se tornaria uma imensa bomba H?
Não acredito que uma bomba H pudesse detonar uma reação em cadeia descontrolada em Júpiter. O segredo dessas bombas é o calor, que acelera os prótons e os funde, e o calor estaria restrito à região da explosão, originalmente produzida por fissão.
Clayton, lua é qualquer satélite natural que orbita a terra. As vezes temos mais de uma lua sim.
Salvador, você acredita que as mesmas condições apresentadas na produção cinematográfica ” EUROPA REPORT”, seriam as mesmas apresentadas, ou seria algo diferente, já que “2001 uma odisseia no espaço” deu uma noção de como seria as nossas explorações espaciais…
Difícil dizer. Nunca descemos lá. Mas achei o cenário de “Europa Report” plausível.
Salvador, caso existisse a possibilidade de uma missão tripulada a Europa, como seria a saída de orbita da mesma lua, pois, a gravidade de Júpiter exercida sobre ela seria imensa dificultado o retorno seguro para o espaço externo?
Ou seria uma possibilidade utilizar a gravidade de Júpiter como estilingue para a viagem de retorno?
Seria preciso “escapar” de Júpiter. Difícil, mas não impossível.
Salvador, se não me engano um físico já propôs que na busca de civilizações (e que portanto estariam à milhares/milhões de anos luz a nossa frente) deveríamos nos concentrar em buscar satélites, construções artificiais…uma vez que eles teriam tecnologia suficiente para fazê-lo. Não lhe parece lógico essa proposta?!!!
Não é simples identificar construções artificiais a anos-luz de distância…
Excelente notícia Salvador. Acho que assim a NASA reacende a exploração espacial (e volta a se colocar à frente). E com certeza teremos muitas surpresas com essa lua. Mesmo que seja tão somente a “descoberta” do gelo, da água…infelizmente vai demorar, mas é um começo!!! Acho que as respostas a muitas de nossas perguntas estarão lá…quem viver verá!!! Abraço
Salvador, acha que depois dessa missão que ira acontecer na Europa, e outras que poderão vir a acontecer, teremos alguma chance de enviar uma sonda para perfurar seu solo? Tipo, a radiação, pelo que li na sua matéria, é muito intensa, e escavar o solo gelado, não é fácil, mas acha que conseguiríamos chegar a um nível tecnológico suficiente tal tarefa? Ou acha que seria melhor confirmar os eventos de “geisers” e tentar utilizar um desse buracos de vapor d’agua e seguir ele até o oceano da Europa?
Acho que a tecnologia não é um problema. Custo é o problema. Manda lá uma fonte atômica de calor e ela pode ir derretendo o gelo pra você até você chegar lá embaixo.
Perfurar a crosta de Europa não é impossível, mas é bem difícil, provavelmente mais difícil que extrair o petróleo do pré-sal.
Fiquei muito empolgado com a noticia, acredito que um número espetacular de novidades está a caminho, mas talvez Encélado fosse uma tiro mais certeiro não? Mesmo que seja mais distante (Saturno).
Design inteligente é pura pseudo-ciência?
Não seria se já não tivesse sido descartado pelas evidências. Como já foi descartado, insistir com ele é pseudociência.
Parece que Titã é mais promissora do que Europa. Porque não vão lá?
Europa é mais próximo e, na minha opinião, mais promissor também.
É preferível a NASA esperar mais um pouco e obter a tecnologia para lançar uma nave e um caminhador.
Seria legal uma nave entrar dentro de Europa. Talvez com algum tipo de ponta quente alimentada por decaimento.
Marte ainda me parece ser mais interessante que essa lua. não acredito que os cientistas tenha estudado 51% de Marte.
Água evaporando, planetas cobertos por gelo e com varias luas já foi visto aos montes. Bem espero que eu esteja errado. A pergunta que não quer calar é: será que existe vida em outro planeta?. Mas poderia ser : Será que houve vida em outros planetas ?
E dentro desse contexto eu volto minhas atenções para o planeta vermelho.
Já estão estudando Marte, tem até sondas lá! Não recebeu o memorando?
Já pensaram na hipótese de haver organismos inteligentes marinhos dentro da lua que ainda não desenvolveram tecnologia para sair da lua?
Tipo, assim como precisamos estar “mergulhados” sob uma atmosfera com 78% Nitrogênio, 20% Oxigênio, sob pressão de 760 mmHg, eles, por lá precisam estar na sua “atmosfera liquida de água” na pressão onde eles vivem para o organismo deles funcionar. Só que eles estão na sua “Idade Média”, fazendo suas crendices como nós por aqui…
Nooosa… viajei… Desculpe… Este blog é muito entusiasmante,
O Arthur Clarke pensou exatamente nisso quando escreveu 2010. 😉
Por que não colocam uma nave lá dentro deste oceano. Só sobrevoar vai dar mais dúvidas do que informações.
Escavar 10 km de gelo não é uma tarefa trivial. 😛
Sem dúvida. Tenho certeza de que os cientistas sabem o que há de melhor a fazer. Mas o que impediria de que fosse usada uma sonda com ponta quente que derretesse o gelo, visto que existem materiais radioativos que possuem calor do decaimento?
Imagino que um problema seria transmitir os dados, chegando lá embaixo, só pra citar um dos desafios não-óbvios.
Poderiam pensar em algo como a missão Deep Impact. Concordo com o leitor Clayton e acho que o ideal seria “furar” o gelo. Da forma que exposta essa missão a Europa, não parece ter por escopo, exatamente, a busca contundente de vida…
de fato. o wi-fi lá de casa já começa a falhar quando precisa atravessar alguns centímetros de tijolo do meu quarto. imagina então o problema que seria 10 km de gelo!! 🙂
O que me emociona ao pensar em Europa é justamente essa possibilidade de especularmos sobre vida inteligente distante anos-luz e uma delas estar em nossa vizinhança…
Uma simulação interessante
https://www.youtube.com/watch?v=sPCpNlVJBr8
Que boa notícia. Europa, juntamente com Titã, é uma das grandes esperanças de encontrar vida no Sistema Solar. Eu fico aqui pensando nos exoplanetas gigantes que estão sendo descobertos galáxia afora, muitos deles devem ter luas do tamanho da Terra e imaginar as mesmas condições a que estão submetidas Europa mas em escalas muito maiores deixa aqueles ávidos de encontrar vida extraterrestre em êxtase. Agora Salvador, só uma coisa me preocupa, se existe ou não vida em outro ponto do Sistema Solar ainda não sabemos, mas com certeza onde ela alcançou maior desenvolvimento foi aqui na Terra, trabalho na área da saúde e sei que um único microorganismo é capaz de gerar toda uma comunidade quando encontra um ambiente acessível, tenho medo que um esporo perdido de uma bactéria qualquer seja levado ao espaço por nossas naves e “contamine” o precioso mar de Europa – sei que tiveram esse receio quando descobriram um mar interior abaixo de uma calota polar na Rússia, só me esqueci o nome agora – Por mais precauções que a Nasa tome é difícil evitar tal contaminação, afinal a vida emprega todos os recursos para se espalhar, veja Marte por exemplo, já foram tantas missões, quando o homem pisar lá talvez ele se espante ao constatar que uma ameba chegou primeiro. Abraços, ótimo texto.
Salvador, seu site é ótimo. Além das suas matérias informativas, sempre é interessante ler as opiniões e perguntas dos usuários. Vez ou outra leio os comentários religiosos para dar umas risadas, e então volto aos assuntos sérios para continuar obtendo conhecimento. Continue com as postagens!
Salvador,
A existência de mais 02 planetas, maiores do que a Terra, além dos já conhecidos, é claro.
Especulação no momento.
Salvador,
Gostaria que comentasse sobre a possibilidade da existência no nosso sistema solar de dois grandes planetas .
Notícias sobre o assunto foram publicadas em revistas de astronomia e nos principais jornais em todo o mundo em 16.01.2015. Agora mesmo, não é?
Baseado em fortes evidências, o Prof. Carlos de la Fuente Marcos da Universidade Complutense de Madri afirma que eles existem. Os sumérios tinham razão?
Não, os sumérios não tinham razão. Os sumérios não conheciam senão cinco planetas, e o nosso nem entrava na conta. E, ainda que você ache que existem esses dois hipotéticos planetas (já acharam que havia um mais interno que Mercúrio, por razões semelhantes, mas ele não existe; descobrir planetas pela influência gravitacional em objetos conhecidos é bem complicado), eles não são nada parecidos com o tal Nibiru, que teria uma órbita achatada (e impossível).
Salvador, quando erraram ao prever um novo planeta entre Mercúrio e o Sol não se conhecia a Teoria da Relatividade de Einstein além do fato que atualmente existem computadores com processamento bem mais poderoso.
De fato, o problema agora é outro. É que o número de objetos que indicam a existência de outros planetas é muito baixo, com relação à população total da região. Então, pode ainda ser uma coincidência, talvez gerada por algum viés de observação. Eu, pessoalmente, acho que é por aí. Mas, claro, torço para que não. Seria interessantíssimo descobrirmos mais planetas no Sistema Solar, ainda que sejam desertos gelados! Se forem superterras, então, preencherão imenso gap no nosso conhecimento!
Logo após a formação dos satélites galileanos, o ambiente deve ter estado liquido por um bom tempo antes de a crosta de gelo começar a formar. Então, similarmente ao que aconteceu nos fundos dos oceanos da Terra, pode ter formado vida ao lado dos jatos de água quente emanados do interior do satélite. Que pode ter se transformado quando a crosta se formou, deixando-o em um ambiente escuro. Provavelmente, pela ação de Júpiter , o interior do Europa ainda deve estar em atividade constante, e, talvez, ao se distanciar dessas fontes, tenham adquirido alguma forma de bioluminescência, como acontece nas camadas mais fundas dos oceanos terrestres. Espero que esta missão possa responder, já que parece que não terá envio de um robô á superfície (seria o correto, por causa do risco de contaminação). Se não elucidar, acho que só em 2050 saberemos com outras missões…