O longo sono do Philae

Salvador Nogueira

Ninguém fala isso oficialmente, mas os engenheiros alemães que desenvolveram o módulo de pouso Philae, que desceu no cometa Churyumov-Gerasimenko em novembro do ano passado, estão desesperançosos. Eles acham que o pequeno robô não despertará mais de seu sono, a despeito do aumento de temperatura e de incidência de luz solar sobre seus painéis.

Concepção artística do Philae na superfície do cometa. Na verdade, ele caiu num buraco quase sem luz. (Crédito: ESA)
Concepção artística do Philae na superfície do cometa. Na verdade, ele caiu num buraco quase sem luz. (Crédito: ESA)

O módulo operou por 57 horas ininterruptas após sua emocionante “cometissagem”, em 12 de novembro. O Philae chegou a quicar duas vezes e flutuar por mais de uma hora sob a tênue influência da gravidade do cometa, antes de finalmente se fixar ao solo. Seu pouso definitivo se deu numa região nada propícia, parcialmente nas sombras, meio de lado, e praticamente num buraco.

O módulo ficou tão escondido que nem mesmo imagens feitas a poucos quilômetros de distância pela sonda orbitadora Rosetta (que segue operando normalmente ao redor do Churyumov-Gerasimenko) conseguiram identificar com precisão sua posição. Outro problema decorrente disso é que ele recebia luz solar em apenas um dos paineis e mesmo assim por pouco tempo, o que o impedia de recarregar suas baterias e continuar seu trabalho. Por isso ele entrou em hibernação.

De início, imaginou-se que por volta de abril, conforme o cometa se aproximasse mais e mais do Sol em sua trajetória elíptica, o nível de iluminação fosse suficiente para reaquecer a sonda e recarregar sua bateria. Contudo, depois de ficar por tanto tempo sem energia e escondido num buraco, o Philae deve ter se sujeitado a temperaturas congelantes, muito menores do que as mínimas a que ele foi submetido em testes na Terra. Não sabemos se a exposição de seus circuitos à baixa temperatura pode tê-los danificado irreparavelmente. Segundo apurou o Mensageiro Sideral, muitos dos engenheiros acreditam que sim.

Imagem mostra um dos pés do Philae, na superfície do cometa.
Imagem mostra um dos pés do Philae, na superfície do cometa.

Por via das dúvidas, sempre que há oportunidade, a Rosetta está tentando ouvir um sinal do Philae, para que as operações possam ser retomadas. A última sequência de escutas aconteceu entre os dias 11 e 18 de maio — e o silêncio permanece. Tentativas de contato continuarão a ser feitas até setembro, quando o Churyumov-Gerasimenko já terá ultrapassado o periélio (ponto de aproximação máxima do Sol) e seguirá seu caminho de volta para as regiões mais gélidas do sistema.

Ainda resta um fio de esperança, de uma missão que já produziu diversas surpresas positivas no passado. Vai saber. Mas é bem possível que o Philae já tenha feito sua última transmissão, em novembro do ano passado. Os dados que ele colheu, no entanto, ainda estão sendo analisados pelos cientistas e certamente produzirão muitas descobertas.

Uma delas, anunciada recentemente, é a de que o Churyumov-Gerasimenko não tem um campo magnético. Trata-se de um achado importante, que lança luz sobre os processos de formação do Sistema Solar. Até então, especulava-se que a “colagem” de partículas para formar os cometas pudesse ser induzida por magnetismo, e que o mesmo efeito continuasse a operar para reunir objetos maiores, até produzir planetas inteiros. Agora está claro que, se o magnetismo cumpre um papel, ele está limitado a objetos menores, mas não a pedregulhos com vários quilômetros de extensão, como o Churyumov-Gerasimenko. (Para efeito de curiosidade, o cometa tem uma forma altamente irregular e 4,3 km de comprimento em sua maior dimensão.)

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Comentários

  1. Show essas informações parabéns, ainda resta pouca coisa do portal da UOL esses artigos é uma delas….

  2. Gostaria de fazer um pequeno esclarecimento com relação as baterias. A SAFT forneceu em 2004 as baterias de Lítio primário, portanto não recarregáveis, tipo LSH20. As baterias funcionaram por 65 horas, como projetado, após 31 meses de hibernação. No ano passado a SAFT recebeu congratulações da CNES (Centre National d’Etudes Spatiales). Segue mensagem do Sr. Lam-Trong Thien, gerente do Electrical Power Department do CNES em Toulouse: “Congratulations to Saft for the quality of the primary lithium battery that was essential for the success of the Rosetta mission”.

  3. pelo que entendi, Russia e China se unirão para formar uma nova potencia mundial, e de cara logo providenciar uma guerra pra aliviar a terra de tanta gente

    1. Entendeu tudo errado. Primeiro, que o post não trata disso, segundo que China e Russia são países continentais que mal conseguem manter seus territórios e populações unidos sob o mesmo poder estatal, que dirá unirem entre si.

  4. Vejo a grandeza mesmo sem entender os detalhes. Romântico acredito que os “acasos” nos mantém ávidos pelas respostas e tornam os “mistérios” ainda mais interessantes. Philae e Roseta, as Mars’s e outras missões, sem falar das atuais tripuladas trazem fagulhas de um infinito ou no meu caso, inconcebível conhecimento. Comentário pretenso, mas sincero e feito com grande reverência à capacidade intelectual de todos que por aqui “orbitam”. Obrigado por compartilhar essas informações de forma acessível e agradável. Grande abraço!

  5. “o Philae deve ter se sujeitado a temperaturas congelantes, muito menores do que as mínimas a que ele foi submetido em testes na Terra”

    Foi erro de projeto Salva ? (não tinham como prever/testar isto ?)

    Ou :

    Confiança (tvz em excesso) quanto ao local onde ele pousaria ?

    1. Roger, erro certamente não foi. Uma missão espacial trabalha com limitações de orçamento e planejamento. O Philae já foi bem longe — ele era considerado apenas um “bônus” da Rosetta.

    1. Fala! Já tinha visto essa história! Bem legal! Qualquer hora escrevo sobre ela! Abraço!

  6. Salvador, esse objeto pousa, se bem sucedido tem condições de trazer descobertas sobre o corpo celeste e sua origem? como é possível uma coisa assim? Sou em cético em sono, ou vocês são todos uns sonhadores?

    1. Cara, cada vez eu entendo menos o que você escreve. O Philae já pousou, em novembro do ano passado…

      1. que pousou eu sei, pergunta: é capaz de informar o que sobre esse corpo celeste, de onde veio? do que é feito?

    2. A Philae levou instrumentos para fazer análises químicas dos materiais do cometa. Ela chegou a coletar “poeira” e enviar dados, mas o principal, que era cavar um pequeno buraco e tirar “terra” para análise não foi possível, pelo que li.

      Além disso levou instrumentos de análise óptica, então tem muito material a ser analisado pelos pesquisadores a partir do que ela conseguiu enviar antes de dormir.

      1. Realmente, concordo com você, colocar um instrumento num cometa para que esse instrumento nos informe sua composição, de onde veio, se mal conhecemos a composição de nosso próprio mundo, só pode ser devaneios.

          1. Eu, você e o Fábio estão sempre juntos e sempre invertendo, cá entre nós, quem morde a fronha?

          2. sempre juntos e sempre invertendo, cá entre nós, quem morde a fronha?

          3. Oswaldo é um homem de Deus. Abençoado e cristão. Não abre mão de desrespeitar seus pais com os xingamentos (só pode quando ele usa, claro), destilando seu veneno e deixando a máscara cair aos poucos. Mas Deus tudo sabe, tudo vê, né? hehehe

        1. Pousar uma sonda num objeto de pouco mais de 4 km de extensão a milhões de km da Terra realmente não é mesmo trabalho de nibirutas sonhadores. E sim de gente que sabe o que está fazendo, aqueles que são bem pagos pelo programa espacial e usam a cabeça pra algo útil.

  7. Fala Salvador! Beleza? Eu adoro suas postagens, tudo o que você fala agrega muito conhecimento pra todos! Eu aceitaria de boa fazer um estágio com você sem remuneração! kkkkkk Gosto demais dessa área!

    Abração e continue nos brindando com sua sabedoria

    1. Opa, Edu! Obrigado pela oferta! Mas jamais “contrataria” alguém sem remuneração. Nem relógio trabalha de graça. Questão de ética. 😉
      Abraço!

  8. Eu me lembro que na busca do melhor local de pouso, as irregularidades do cometa eram a maior preocupação. Procuraram o melhor ponto, mas, como qualquer terreno, sempre houve rochas e buracos para atrapalhar. So o fato de ter pousado já foi um feito fantástico, devido à gravidade muito baixa.

    Os dados já enviados trarão muita informação preciosa, não é caso de tristeza. A Philae pousou!

  9. É uma pena o Philae não testemunhar o momento da sublimação do cometa com o aumento da temperatura. Talvez fosse este evento o mais peculiar no universo próximo que transmita tanta curiosidade.

  10. Grande Salvador,

    De qualquer forma o feito em si já foi deveras impressionante!!

    Imagine se num futuro muito distante alguma raça alienígena encontrar o artefato agarrado ao cometa.

    1. Na verdade, eu fiquei imaginando de uma missão tripulada futura visitando o cometa e tentando resgatar o Philae… 😉

        1. Sem querer não. E o mais provável é que, com a erosão do cometa após múltiplas passagens, ele se solte espaço afora…

  11. pois é . uma pena esse silêncio da philae . Uma missão que tinha tudo para trazer descobertas sobre um corpo celeste e sua origem mas que não deve mais se manifestar . Muito azar o local de aterrisagem não ser propicio

  12. Uma pena!! Mas ainda tenho esperança. Seria incrível se voltasse a funcionar. Vamos aguardar e torcer, mesmo sabendo ser pequenas a chances.

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