Morre Vera Rubin, a “mãe” da matéria escura

Salvador Nogueira

Mais uma notícia triste para fechar 2016. A astrofísica americana Vera Rubin, mais conhecida por seu papel na descoberta da existência da matéria escura, morreu no último dia 25, aos 88 anos.

Uma das maiores expoentes da astronomia, Rubin ganhou destaque a partir dos anos 1970, quando investigava a rotação da galáxias. Ela notou que as periferias galácticas giravam mais depressa do que deveriam, de acordo com a teoria da gravidade, o que só podia ser explicado pela presença de um halo de matéria invisível além delas — o que hoje se convencionou chamar de matéria escura.

Diversos experimentos hoje tentam finalmente determinar a natureza da matéria escura — e há quem diga que melhor seria ajustar as leis da gravidade para explicar a discrepância, dispensando a existência de outras partículas que não interagem com a luz –, mas ninguém questiona que a contribuição de Rubin para a formulação do problema foi fundamental.

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Vera Rubin quando era estudante (Crédito: Vassar)

Numa época em que o papel das mulheres na astronomia era muito reduzido, Rubin seguiu sua paixão profissional. Tentou fazer pós-graduação em Princeton nos anos 1950, mas naquele tempo não eram aceitas mulheres no mestrado em astronomia daquela instituição. Acabou realizando-o na Universidade Cornell e seu doutorado foi obtido em 1954 na Universidade Georgetown, em Washington, sob a orientação de George Gamow. Passou a trabalhar naquela universidade pelos anos seguintes e, em 1965, tornou-se a primeira mulher a usar os instrumentos do Observatório Palomar, na Califórnia.

Mãe de três filhos e uma filha, Rubin permaneceu na ativa até o final, estudando rotação de galáxias. Uma sumidade no meio, foi defensora feroz da maior presença de mulheres na ciência. E entendia que seu legado como pesquisadora era mais importante que seu reconhecimento pessoal. “A fama é fugidia, meus números significam mais para mim do que meu nome. Se astrônomos ainda estiverem usando meus dados nos próximos anos, esse é meu maior cumprimento.”

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Comentários

    1. Eu não apostaria muitas fichas nisso. Pode acontecer, mas ainda tem uma pá de fenômenos que teorias alternativas da gravidade precisam explicar para se livrar da matéria escura…

      1. Eu já aposto minhas fichas nisso. 2016 para mim foi o ano que a matéria escura subiu no telhado. Algo que se mostrou invisível, indetectável, não obstante todos os esforços para encontrá-la, já sugere, de forma muito contundente que a matéria escura provavelmente não existe. O telescópio espacial Fermi nunca a encontrou.

        http://journals.aps.org/prd/abstract/10.1103/PhysRevD.94.123005

        Logo, se ela não existe, ela não pode servir como explicação para a forma como a força da gravidade atua nas galáxias e nas estrelas. Teorias como a da gravidade emergente já são uma alternativa para a matéria escura.

        https://arxiv.org/abs/1612.03034

        A beleza da ciência é isso, não existem dogmas, não existem teorias favoritas, tudo está sendo testado. Não sei qual a reposta alternativa para matéria escura, mas creio que a matéria escura já não é a resposta certa.

        1. Mas tem um detalhe q as equações modificadas ainda não explicam, que são as lentes gravitacionais provocadas supostamente pela matéria escura.
          Os efeitos são observados mas a causa ainda é escura
          Falando nisso, o nome mais adequado seria matéria transparente

          1. Exato! Não será fácil nos livrarmos da matéria escura. Até porque já conhecemos uma partícula que preenche os requisitos da matéria escura — o neutrino. Só que as quantidades estimadas dele são insuficientes para explicar os efeitos. Mas se há neutrinos, por que não poderia haver outras partículas, mais massivas, ainda a ser descobertas?

          2. Uai Pallando, mas os caras da teoria da gravidade emergente falam justamente o contrário, que pelo modelo deles dá para explicar o fenômeno das lentes gravitacionais sem apelar para a matéria escura.

            Não vou discutir a matemática deles porque meu QI mão me permite tal façanha e a coisa ainda fica um pouco mais confusa quando enfiam a teoria das cordas no meio. Nunca a entendi direito.

            No entanto, trata-se de um modelo. Aquele que explicar melhor o universo vence. O que pesa contra a matéria escura é que ela nunca foi encontrada.

            De todo jeito, eu fico desconfiado, e acho que a sua existência poderá será cada vez mais questionada.

            Creio que em menos de uma década teremos uma resposta da comunidade científica, tendo em vista os novos telescópios espaciais.

            O que descobriremos, com certeza, será incrível.

            https://arxiv.org/abs/1612.03034

          3. Victor, obrigado por sua insistência. Finalmente resolvi ler os papers, tanto o original do Verlinde como este aí. Escreverei sobre isso mais adiante, mas a situação é a seguinte.
            Verlinde alega no seu paper original que sua teoria de gravidade emergente pode explicar o papel atribuído à matéria escura tanto nos eventos de lentes gravitacionais fracos como nos fortes e aposta que ela pode oferecer pelo menos algumas das propriedades que explicam o sucesso dos modelos cosmológicos com matéria escura fria (o atual paradigma). O novo paper constata que a teoria dele funciona de fato para algumas galáxias com lentes gravitacionais fracas localizadas no Universo próximo (low redshift). Ainda é muito pouco. Como eles dizem, um primeiro passo. Resta saber se vai funcionar em mais circunstâncias e em lentes gravitacionais fortes (há algumas observações que hão de desafiar essa hipótese; a que mais me chama a atenção é esta, tratada como evidência direta de matéria escura: http://chandra.harvard.edu/press/06_releases/press_082106.html). Por fim, ainda há de oferecer modelos tão bons quanto os tradicionais modelos cosmológicos de matéria escura fria. Claro que é uma ótima ideia a de Verlinde e uma bonita teoria, que merece todos os testes — até porque, convenhamos, a matéria escura é mesmo uma pedra no sapato. Mas, por ora, as minhas fichas ainda estão na realidade da matéria escura. E não é emocionante esta saga da ciência? A cada dia aprendemos um pouquinho mais, refinamos mais nosso entendimento… uma coisa interessante a mencionar é que a teoria do Verlinde dispensa a matéria escura, mas depende profundamente da energia escura para explicar a mudança de comportamento da gravidade nas maiores escalas. E a energia escura também andou caminhando numa corda bamba recentemente (http://www.nature.com/articles/srep35596). Então, se pá, tudo isso que está aí ainda está errado, inclusive as teorias que dispensam a matéria escura… rs
            Obrigado por insistir com o tema!

          4. O neutrino era um bom candidato a matéria escura, uma partícula com massa insignificante que viaja a velocidade da luz e que no conjunto da obra seria o principal suspeito, até porque os neutrinos são onipresente em tudo o universo. Todavia, a conta não fecha. Seria incrível queuma partícula insignificante, inclusive, em termos microscópicos, gerasse um efeito macroscópico tão significante. De fato o macro universo e o micro universo estão conectados intrinsecamente pela gravidade. De onde vem a maior parte os efeitos gravitacionais observados no universo? É o que queremos saber.

          5. Não é que eu não goste da matéria escura, mas ela não foi facilmente localizada, em todo o caso o que fica evidente é que a força da gravidade não tem se portado como deveria se portar, seja pela própria matéria escura ou seja porque a força da gravidade, em escalas intergaláticas, ainda não foi compreendida na sua plenitude. Felizmente temos as lentes gravitacionais para ajudar a entender o que ainda não sabemos. Elas são uma excelente pista. Mas, de fato, ainda estamos tateando no escuro. rsrs

          6. Para mim o grande segredo está em descobrir do que é feito o espaço. Saber como ele interage com a matéria. Saber se a matéria, ao se formar, retira espaço das suas imediações (Hipótese).
            Do que é composto o tecido espacial? Ninguém sabe. É como tentar saber como o peixe nada sem termos a mínima ideia do que seja a água. É como medir a velocidade da Luz na água, encontrar o resultado, que por curiosidade é menor que c, mas não saber como a água influenciou aquela velocidade. Enquanto não descobrirmos do que é feito o espaço, como ele se estica, se contrai e se contorce, não saberemos nada.
            Estamos sendo igual ao bêbado que foi encontrado por um amigo debaixo da luz de um poste procurando a chave de sua casa. – Mas você perdeu a chave por aqui? Questiona seu amigo. – Não. Responde o bêbado. Eu a perdi ali perto daquele mato, mas vim procurar aqui, porque aqui está mais claro.

    1. Muito interessante!
      E tem uma frase lá que diz muito: “É uma demonstração impressionante de algo, mas nós não sabemos o que é esse algo.”

      Esse algo é escuro… matéria escura, constante escura, força escura, dinâmica escura, equação escura… enfim, continua todo mundo no escuro rsrsr 🙂

  1. Uns falam que ela era especializada em astronomia
    .
    Outros falam que ela era uma Astro Física.

    Sinceramente!

    Lá nas “internas”, existe um abismo que separa essas duas especialidades.

    A Astronomia é uma ciência que trata do universo sideral e dos corpos celestes, com o fim de situá-los no espaço e no tempo e explicar sua origem e seu movimento.

    A Astro Física é um ramo da astronomia, muito mais refinado, que envolve a observação do espaço, próximo e profundo, através de cálculos matemáticos, físicos mecânicos e quânticos.

    Na contradita, aguardo retorno!
    Vamos lá, gente!
    Estou aceitando até mesmo a contradita do “estafeta” do Salvador Nogueira.

    1. Como você colocou, astrônomo é um termo genérico que abarca diferentes especializações. Não existe um “astrônomo” puro. Ele vai acabar sendo astrofísico, cosmólogo, cientista planetário, astrobiólogo… No caso dela, era astrofísica (estudava movimento de galáxias), mas tudo bem chamá-la genericamente de astrônoma. Você enxergar um antagonismo é meio como dizer que um engenheiro civil não pode ser chamado só de “engenheiro”. 😉

  2. Uma grande perda, sua busca continua pois há um universo a se descobrir sobre sua descoberta. Falando nisso, faltou uma homenagem à Carrie Fisher, nossa eterna “princesa Leia”, afinal muitos de nós iniciamos na astronomia através de Star Wars; duvido que você não sonhou com ela numa galáxia muito, muito distante (rsrs). Um 2017 rico em saúde, paz, alegria e novos horizontes a serem desvendados.

    1. Fiquei sentido pela morte da Carrie Fisher, embora, o meu amor original pelas estrelas na ficção venha daquela outra franquia sci-fi que começa com “Star”… 🙂

      1. Essa não vale, é hors concours, ela nos levou para onde nenhum homem jamais esteve e aqui estamos nós, olhando para o céu estrelado.. hehe

      2. Star Trek para mim é a minha paixão. Não seria um entusiasta da astronomia se não fosse por ela. Mas Star Wars tem algo como cavaleiros medievais espaciais empunhando os seus sabre de luz, magia e da espiritualidade sob codinome de “força”, ao mesmo tempo, que cuida de temas universais, bem vs. mal, aventura, o caminho do herói, sacrifício e redenção. Pena que o George Lucas se esqueceu disso quando filmou os episódio I, II e III… felizmente, 2016 não foi tão ruim, a Disney me presenteou com o excelente Rogue One. Que força esteja com os executivos da Disney.

    2. Não acho que Star Wars seja ficção científica.
      Não vejo muita ciência em confinar fótons em “sabres de luz”… 🙁

      1. Por favor, não entendam como crítica negativa. Adoro a história. Só não acho que “ficção científica” seja uma classificação adequada para ela…

  3. Sobre esses experimentos eu tenho uma dúvida:
    Ela deve ter levado vários anos tirando fotos das estrelas em posições diferentes, para concluir que não ocorria como no nosso sistema solar, onde quanto mais afastado do sol menor é a velocidade angular.
    Mas considerando o tamanho das galáxias, não é possível que elas estejam se expandindo? Ou seja, o tempo de duração da vida humana é suficiente para ter medidas precisas que mostrem que as distâncias médias em relação ao centro não está aumentando para as estrelas da periferia? Porque nesse caso não haveria contradição com a teoria da gravitação.

    1. Olha, é possível sim conseguir medidas precisa sobre o deslocamento das estrelas, tanto na nossa galáxia quanto em galáxias vizinhas.
      Além de medir a velocidade é possível determinar a rota da estrela. Se as galáxias estivessem “expandindo”, o efeito já teria sido percebido e medido a muito tempo.
      Além do mais, a matéria escura também provoca efeitos em conjuntos de galáxias e lentes-gravitacionais.
      Que existe alguma coisa lá fora que não vemos, tudo indica que sim.

  4. Vera Rubin, Sensacional Astrofisíca. Contribuição sem precedentes no meio científico.
    Sua presença e passagem em nosso tempo, jamais será esquecida.

  5. Que descanse em paz e tenha sucesso na seqüência de seu caminho. Da nossa parte, fica o agradecimento pela obra.

    1. hmmm, será que, de alguma forma, ela vai conseguir agora estudar de perto aquilo que antes só enxergava de longe?

      imagino que para uma astrofísica esta seria uma perspectiva bem interessante! 🙂

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