2019 OK, uma bala perdida cósmica
A gente já anda há tempos com aquele ar blasé do papo “asteroide vai passar/passou de raspão pela Terra”. Mas a semana que passou viu um susto de verdade em andamento. Não era um pedregulho qualquer, de três, quatro, cinco metros. Era um trambolho com algo entre 57 e 135 metros. “Um campinho de futebol em forma de rocha”, como definiu Cristóvão Jacques, pesquisador do Sonear, observatório responsável pela descoberta, em Oliveira (MG).
Batizado de 2019 OK, ele foi identificado no dia 24 por Jacques, João Ribeiro e Eduardo Pimentel poucas horas antes de sua aproximação máxima da Terra, viajando a serelepes 24 km/s. Multiplique por 3.600, e temos estonteantes 86.400 km/h, também conhecidos como estupidamente rápido.
Uma colisão com a Terra seria medida em megatons de TNT, correspondendo à detonação de uma poderosa bomba atômica. Se fosse sobre uma cidade, poderia tê-la devastado num piscar de olhos.
Duas coincidências levaram à identificação tardia. Primeiro, os três principais projetos de identificação de Neos (objetos próximos à Terra, na sigla inglesa), todos americanos e operados do Havaí e do Arizona, estavam ou parados ou enfrentando tempo ruim para observações.
Segundo, o objeto parecia estar vindo meio que de frente para a Terra, o que faz com que seu movimento aparente dia após dia seja bastante sutil. Isso, claro, até passar zunindo por nós, o que aconteceu no dia 25, quando ele passou a 73 mil km da Terra. (Pode parecer um montão, mas é menos de um quinto da distância até a Lua. Em termos astronômicos, é o equivalente a passar triscando.)
Esse já foi, o que o torna apenas mais um “quase”, agora convertido em objeto interessante que sabemos ter vindo do cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter, e que cruza regularmente o interior do Sistema Solar, chegando a cruzar até mesmo a órbita de Vênus.
E vale repetir o que sempre se diz nessas situações. Ninguém deve perder o sono por isso. É verdade que em média há um asteroide por semana passando mais perto da Terra que a Lua. Também é verdadeiro que a imensa maioria desses objetos é bem menor que o 2019 OK e não oferece perigo. Podemos também trazer como razão para tranquilidade o fato de já termos catalogado praticamente todos os objetos maiores que 1 km, capazes de causar danos globais na escala “extinção dos dinossauros”.
Por outro lado, há registros de mais de 600 “fireballs” (bólidos de alguns metros passando pela nossa atmosfera) desde 1988, e apenas quatro deles foram vistos antes de queimarem e explodirem violentamente no ar. E também sabemos que um dia um desses objetos não será tão benigno. Aconteceu antes, acontecerá de novo.
A cada ano que passa, aprendemos mais sobre os riscos dessa “roleta-russa cósmica”, mas os investimentos hoje são insuficientes sequer para monitorar os objetos, que dirá ter planos de rápida execução para deflexão de asteroides. Como definiu Cristóvão Jacques: “Nossa única defesa hoje é a estatística.”
Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.
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