Estudo quantifica prejuízo da astronomia com megaconstelações de satélites
A guerra pelos céus entre empresas e cientistas segue ferrenha, mas um novo estudo traz uma boa dose de racionalidade ao debate sobre o impacto das megaconstelações de satélites sobre a astronomia. Adivinhe só: (quase) tudo vai ficar bem no final.
No coração dessa polêmica, estão projetos como o Starlink, da SpaceX, cujo objetivo é estabelecer uma rede de telecomunicação global em órbita terrestre baixa, fornecendo internet rápida em qualquer ponto do planeta.
Esse é sem dúvida a mais visível das iniciativas (literal e figurativamente), mas não a única. Outras empresas, como OneWeb e Amazon, também pretendem construir suas megaconstelações, agregando, ao todo, cerca de 26 mil novos satélites artificiais à órbita da Terra nos próximos anos.
Esse número é o que especialistas mineiros classificam como “demais da conta” – dez vezes mais que o número atual de satélites. Esses objetos, quando iluminados pelo Sol, brilham. E sua onipresença, evidentemente, impactará cada vez mais a qualidade das imagens astronômicas feitas com telescópios em solo.
Os mais exaltados já têm decretado nas redes sociais “o fim da astronomia”. Menos, pessoal. Um estudo comissionado pelo ESO (Observatório Europeu do Sul), principal organização astronômica do mundo, e aceito para publicação no periódico Astronomy & Astrophysics, quantificou o drama.
Em simulações, eles mediram o impacto que 18 constelações de satélites planejadas, os tais 26 mil satélites, teriam nas observações dos grandes telescópios atuais e de próxima geração.
Segundo os resultados, as observações de exposições mais longas (em que o telescópio colhe “luz” do mesmo cantinho do céu por cerca de mil segundos) sofrerão mais, com impacto severo em até 3% delas durante os momentos mais complicados de observação, no amanhecer e no anoitecer. Observações com exposições mais curtas sofrerão impacto menor, e estima-se que apenas 0,5% delas seriam afetadas. Não soa como uma tragédia.
As coisas ficam bem mais complicadas, contudo, nos projetos de campo largo, em que grandes pedaços do céu são monitorados. Sem surpresas aí: quanto maior o campo de observação, maior a chance de haver um satélite no caminho para estragar a imagem.
Para projetos de varredura como o do vindouro Observatório Vera C. Rubin, antes conhecido pela sigla LSST, entre 30% e 50% das exposições podem ser estragadas pelos satélites. É um caminhão de prejuízo.
Só consigo imaginar a frustração dos que trabalham no projeto e terão de se contentar com metade dos resultados que esperavam ter. Só que esse é o pior dos cenários, sem contar quaisquer medidas de mitigação das fabricantes dos satélites e dos próprios astrônomos, que podem repensar suas estratégias de observação para minimizar o problema.
Daí a decretar o “fim da astronomia”, anos-luz de distância.
Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.
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