Exercício de futurologia pós-covid tem de passar pelo lado positivo da crise

O que será da sociedade após a pandemia? Muitas das especulações flutuam entre o tragicômico e o surreal. Não, não teremos uma ditadura da epidemiologia. Tampouco um apocalipse zumbi. Em contraposição, ouso apostar no otimismo: superada a crise, estaremos melhores do que entramos. E a vida inevitavelmente voltará ao normal.

Por que melhores? No legado da pandemia, podemos esperar que mais gente absorva a lição básica de enxergar a natureza pelo prisma da matemática. Uma sociedade que não sabe multiplicar para além do “multiplicai-vos” estará, sempre, em sérios apuros.

Espero que agentes públicos tenham uma “memória socioimunológica” de ao menos algumas décadas, com uma pauta de ação e cooperação (local, nacional e global) em caso de novas emergências.

Também podemos imaginar que mais estados sairão com o entendimento de que “a conta” dos impactos sociais e econômicos é deles. Ninguém paga imposto para, na hora do aperto, ouvir “lamento, você quer que eu faça o quê?”. É para essas horas que o estado existe.

E haverá ganhos tecnológicos. Nos últimos meses, cientistas e técnicos têm apresentado desde lâmpadas germicidas mais eficientes a desinfetantes de longa duração, passando por respiradores de baixo custo. Eram todas tecnologias de prioridade baixa ou nula antes da crise. Embora agora sejam apenas paliativos leves, devem ajudar muita gente no futuro.

Isso para não falar em vacinas. Sim, estou otimista de que uma vacina para o novo coronavírus seja possível e esteja a caminho – até o fim do ano não seria impensável, apesar de a maioria dos agentes de saúde manter o discurso tradicional de “18 a 24 meses, na melhor das hipóteses”. (Ninguém pode culpá-los; antes de entrarmos no modo “pressa”, essa seria de fato a perspectiva otimista.)

A vacina pode não vir, claro. Mas, ainda assim, as tecnologias criadas e testadas hoje, para tentar fazer frente à covid-19, bem como a ampliação do parque industrial para produção em massa, beneficiarão tratamentos futuros.

De novo, antes da pandemia, vacinas avançadas eram vistas como prioridade baixa e risco alto. Agora, investimentos de bilhões se tornaram “modestos”, comparados à desgraça econômica. A relação custo-benefício se transformou – em benefício da medicina do futuro.

Dizem que a necessidade é a mãe da invenção. É mesmo. Sairemos da pandemia melhores do que entramos – mais solidários, maduros e preparados para a volta à normalidade. Não só porque é isso que humanos fazem (de novo e de novo), mas pela dívida que teremos com quem não concluirá conosco a travessia. Zelemos hoje pelo presente, fazendo nosso melhor, e o futuro se encarrega de si mesmo.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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