Águas de Marte devem ser geladas e salgadas demais para a vida, diz estudo

A despeito da pandemia, o jipe robótico Perseverance, da Nasa, segue na trilha para partir em julho deste ano, a caminho de Marte, com o objetivo de buscar evidências diretas de vida, presente ou pregressa, no planeta vermelho. Mas a caçada promete ser tão difícil. Um novo estudo mostra que formas de vida terrestres teriam imensa dificuldade em prosperar por lá, mesmo nos locais em que há água líquida – talvez ao ponto da inviabilidade.

O primeiro esforço para a detecção direta de vida em Marte ocorreu nos anos 1970. As missões Viking 1 e 2 foram as primeiras a pousar com sucesso no planeta vermelho e realizaram quatro experimentos com o objetivo de tentar evidenciar algum tipo de metabolismo microbiano em ação no solo daquele mundo. Os resultados foram dúbios, pendendo para “não há nada vivo lá”.

Em retrospecto, a Nasa julgou a tentativa precipitada; seria preciso conhecer mais do ambiente presente e pregresso de Marte antes que tal busca pudesse ser conclusiva. Desde então, a agência adotou uma estratégia “siga a água”: entender a história hídrica do planeta vermelho seria a chave para orientar a busca por vida, já que a presença de água líquida é essencial para a evolução e manutenção de todos os organismos conhecidos.

Não foi por acaso que você passou as últimas décadas lendo sobre água em Marte. Gelo de água. Água corrente. Água salgada. Oceanos, rios e lagos do passado. Fontes transientes de água no presente. Água. Água. Água. A essa altura, já está pacificada a noção de que Marte teve muita água corrente em sua superfície no passado remoto, ainda tem muito gelo nas calotas polares e no subsolo. Vez por outra, hoje, ocorrem episódios de fluxos de água pela superfície.

Isso fez surgir a hipótese de que talvez a vida possa ter surgido em Marte e persistido por bilhões de anos, talvez se “reavivando” temporariamente durante esses eventos que envolvem água líquida. Mas a compreensão das condições prevalentes nesses fluxos parecem jogar um balde de água fria sobre essa possibilidade.

Um estudo liderado por Edgard G. Rivera-Valentín, do Instituto Lunar e Planetário, nos EUA, e publicado na Nature Astronomy mostra que a liquefação de água na superfície o no subsolo marciano só pode se dar de forma estável se houver muito sal dissolvido nela, para baixar a temperatura de congelamento e, ao mesmo tempo, impedir que ela evapore, diante da pressão atmosférica pífia do planeta.

Gráfico mostra onde e por quanto tempo ao ano água extremamente salgada seria estável como líquido em Marte. (Crédito: Rivera-Valentín et al. (2020))

Modelando essas reações, os pesquisadores demonstraram que a temperatura mais alta que poderia ter uma fonte de água rica em sais como essa seria de -48°C. E nada que conheçamos vive bem a essa temperatura.

Aí você pode olhar o copo meio cheio ou meio vazio. Por um lado, tentar encontrar vida nessas águas se torna tarefa ainda mais inglória. Por outro lado, é quase certo que uma missão da Terra seja incapaz de inadvertidamente “contaminar” Marte com formas de vida terrestres. Se bem que o planeta vermelho sempre foi, e deve continuar sendo, uma caixinha de surpresas.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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