Sucesso da SpaceX ofusca terremoto no programa lunar da Nasa

O voo bem-sucedido da SpaceX que restaurou a capacidade americana de levar astronautas à órbita terrestre acabou abafando um terremoto que varreu os bastidores da Nasa, com a exoneração do diretor de programas tripulados da agência espacial americana, Doug Loverro. Na última sexta-feira (12), a organização nomeou, para o lugar dele, Kathy Lueders, até então gerente do programa comercial de envio de tripulação à Estação Espacial Internacional (ISS), numa tentativa de recuperar a confiança perdida.

O imbroglio envolveu a seleção das empresas para o desenvolvimento do módulo de pouso do programa Artemis, destinado a levar humanos mais uma vez à superfície lunar – segundo a meta imposta pela Casa Branca, até 2024, data que soa menos viável a cada dia que passa.

Os primeiros contratos de desenvolvimento do módulo de pouso foram anunciados em 30 de abril e seguirão o modelo adotado para os programas comerciais de transporte de carga e de tripulação à ISS. Foram selecionadas três empresas, em contratos com valores diferentes e valor total de US$ 967 milhões.

A Blue Origin (de Jeff Bezos) reuniu um grupo de empresas como Lockheed Martin, Northrop Grumman e Drape, e recebeu US$ 579 milhões para desenvolver um módulo de pouso de três estágios. A empresa Dynetics formou um consórcio de mais de 25 subcontratadas (e uma importante parceria com a europeia Thales Alenia) e levou US$ 253 milhões para criar um módulo de estágio único.

Correndo por fora, a SpaceX cavou US$ 135 milhões para seu veículo Starship – que a empresa de Elon Musk já estava desenvolvendo e testando com recursos próprios antes mesmo de a Nasa fechar a parceria. Com seu design “Flash Gordon”, a proposta da SpaceX é a mais arriscada, mas também a que traz maior possibilidade de uma revolução no transporte espacial. Com isso, a agência espacial optou por ter um pezinho no projeto.

Uma ausência notória na escolha foi a tradicionalíssima Boeing, que entrou na disputa, mas teve seu projeto classificado como caro demais e “impreciso” – linguagem técnica para “completo desastre”.

Doug Loverro presidiu essa escolha de descartar a Boeing. Mas com dor no coração. Aparentemente, antes da decisão final, ele havia repassado à empresa informações sobre como o projeto estava sendo mal visto, tentando encorajá-la a submeter mais detalhes que pudessem “salvá-la”. Isso não é permitido. Com a constatação de que isso de fato ocorreu, Loverro imediatamente pediu demissão, em 19 de maio, após apenas seis meses no cargo. Ele nem chegou a participar da revisão final que autorizaria o voo da Crew Dragon, dali a 11 dias.

Com a promoção de Kathy Lueders para o lugar de Loverro, espera-se que o programa recupere a estabilidade momentaneamente perdida. Mas, claro, o mergulho da economia em razão da pandemia torna ainda mais improvável que algum desses projetos esteja pronto para voar com tripulação em 2024.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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