‘Namoro’ entre militares americanos e brasileiros pode envolver centro de Alcântara
“Eu acho que algum deputado deveria começar a perguntar sobre isso”, disse um amigo muito bem informado sobre o setor espacial. Ele se referia a uma conversa cada vez mais expansiva entre militares americanos e brasileiros no ramo das atividades espaciais.
Começam a se cristalizar intenções e interesses que até alguns anos atrás estariam na lista dos disparates. Mas partamos do início: após anos de ensaios, Brasil e Estados Unidos assinaram o acordo de salvaguardas tecnológicas que viabilizava o lançamento de foguetes e satélites fabricados nos EUA a partir do Centro Espacial de Alcântara, no Maranhão.
A iniciativa era mais que boa. O acordo, promulgado em novembro de 2019, era o primeiro passo para viabilizar a exploração comercial do centro, uma vez que 70% dos satélites comerciais contêm algum componente americano.
Ocorre que não basta ter o acordo; é preciso ter os serviços de lançamento. Para tanto, a Agência Espacial Brasileira lançou em maio deste ano um edital em que empresas poderiam manifestar seu interesse em desenvolver atividades no centro. Foi uma iniciativa, mais uma vez, na direção correta, mas em processo cheio de vícios, promovido em desacordo com a praxe e envolvendo documentação vaga e sumária.
Em compensação, as conversas entre militares dos dois países parecem mais focadas e produtivas, embora distantes do olhar público. Aconteceu, em quatro sessões virtuais realizadas nos dias 4, 6, 11 e 13 de agosto, uma série de conversações de engajamento promovidas pela Força Espacial americana, envolvendo representantes, pelo lado brasileiro, do Ministério da Defesa, da Força Aérea Brasileira e da Agência Espacial Brasileira; e, pelo lado americano, da Embaixada dos EUA no Brasil, do Comando Sul dos EUA, da Força Espacial dos EUA e do Comando Espacial dos EUA, dentre outros.
“As conversas forneceram um fórum para promover objetivos dos EUA e do Brasil no desenvolvimento de capacidades espaciais em suporte a operações espaciais combinadas”, disse, em nota, o Comando Sul dos EUA.
Até aí, de novo, nada demais. Surpresa seria se militares americanos e brasileiros não estivessem namorando, dada a afinidade passional no escalão superior de ambos os governos. Mas tenha em mente que a Força Espacial também acabou de publicar sua “doutrina”, um documento chamado “Spacepower”, que destaca a importância de acesso rápido ao domínio espacial, envolvendo múltiplas localidades e plataformas de lançamento.
E aí tem o fato de que não foi uma ou duas vezes que militares americanos chegaram a perguntar a brasileiros sobre a possibilidade de lançamento de foguetes de resposta rápida a partir de Alcântara.
Parcerias entre Brasil e EUA no setor espacial são mais que bem-vindas. Mas é importante que estejam voltadas para fins pacíficos e, preferencialmente, em nível civil. A última coisa que nosso país pode querer agora é projetar um neoimperialismo tupiniquim sobre a América Latina, sobretudo como mera linha auxiliar de outra nação.
Talvez algum deputado devesse mesmo começar a perguntar a respeito.
Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.
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