Sonda de passagem por Vênus tentará confirmar presença de fosfina em outubro

A detecção de fosfina nas nuvens de Vênus, potencial sinal de vida naquele planeta infernal, pode ganhar confirmação antes do que se imaginava. Pesquisadores ligados à missão nipo-europeia BepiColombo tentarão detectar o composto na alta atmosfera durante um sobrevoo a ser conduzido em menos de um mês, no dia 15 de outubro.

Raras vezes na história da exploração espacial tivemos uma coincidência tão feliz. O trabalho de detecção liderado por Jane Greaver, da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, levou mais de três anos para ser cuidadosamente verificado e apresentado ao público, o que aconteceu só na última segunda-feira (14), com a publicação de um artigo na revista científica Nature Astronomy.

Quis o destino que a BepiColombo, uma missão projetada para investigar a fundo o planeta Mercúrio, fosse passar por Vênus quase exatamente um mês depois. Na verdade, trata-se de uma espaçonave dupla, com um segmento desenvolvido pelos japoneses e outro pelos europeus (que vão se separar ao atingirem seu destino final, em órbita de Mercúrio). Os sobrevoos de Vênus no meio do caminho são usados para ajustar sua trajetória e velocidade a fim de levá-la ao mais interno dos planetas solares.

Um dos instrumentos embarcados no segmento europeu da missão, chamado Mertis, é um radiômetro e espectrômetro de infravermelho que, em princípio, poderia captar a “assinatura” da fosfina na alta atmosfera. Resta saber se a sensibilidade será suficiente, mas ajuda muito que os cientistas da missão saibam o que estão procurando.

No sobrevoo de mês que vem, as chances de sucesso são relativamente modestas. Isso porque a sonda passará a respeitáveis 10 mil km do planeta e, sobretudo, porque as rotinas de observação foram planejadas antes do anúncio da fosfina, de forma que não foram otimizadas para a tentativa de confirmação do resultado obtido aqui na Terra, com o telescópio James Clerk Maxwell e o conjunto de radiotelescópios Alma.

Contudo, a sorte realmente sorriu para a missão, pois haverá um segundo sobrevoo venusiano, em 10 de agosto de 2021, quando a sonda passará a meros 550 km do planeta. Então, mesmo que a primeira passagem não permita a detecção, na segunda os cientistas poderão fazer um esforço concertado e aumentar as chances de sucesso.

Trata-se de uma detecção muito sutil, é verdade, uma vez que estamos falando de uma molécula que deve existir na pequena proporção de 20 partes por bilhão. Ou seja, a cada 1 bilhão de moléculas na atmosfera venusiana, 20 seriam de fosfina.

Em compensação, ter uma confirmação independente de uma sonda nas proximidades de Vênus em apenas um mês (ou um ano, pensando no sobrevoo seguinte) seria fantástico. E, de certo modo, já colocaria o planejamento de futuras missões robóticas em outro patamar: o objetivo não seria mais meramente confirmar a presença da molécula, mas sim determinar o que a está produzindo. Seria vida? Ou algum mecanismo químico ou geológico hoje desconhecido? A resposta se esconde em meio às brumas ácidas da alta atmosfera venusiana. Quem sabe, não por muito tempo.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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