Vulcanismo pode explicar fosfina na atmosfera de Vênus, sugerem cientistas
Uma dupla de pesquisadores da Universidade Cornell, nos EUA, precisou de apenas uma semana para propor um modo de explicar a presença do gás fosfina na alta atmosfera de Vênus sem evocar a presença de vida. Para Ngoc Truong e Jonathan Lunine, a detecção pode significar não que Vênus tenha micróbios, mas que seja um planeta geologicamente vivo, ou seja, repleto de atividade vulcânica.
Recuperando a saga: no dia 14 de setembro, um grupo internacional de pesquisadores liderado por Jane Greaver, da Universidade de Cardiff, no Reino Unido apresentou a detecção de fosfina (uma molécula simples, com três átomos de hidrogênio e um de fósforo) nas nuvens venusianas.
Isso, de acordo com eles, poderia ser um sinal de vida na alta atmosfera de Vênus, uma vez que esse gás, na Terra, é produzido rotineiramente por seres vivos. O grupo testou diversas hipóteses alternativas, sem envolver vida, e não encontrou outro meio de explicar a presença do gás detectada de forma mais ou menos constante, em observações feitas em 2017, com o Telescópio James Clerk Maxwell (no Havaí), e em 2019, com o conjunto de radiotelescópios Alma (no Chile).
A despeito do material exaustivo publicado pelos pesquisadores, era bola cantada que não tardariam a aparecer hipóteses alternativas. Truong e Lunine submeteram ao periódico Astrobiology sua explicação vulcânica para a fosfina em 21 de setembro.
A dupla da Universidade Cornell levanta a possibilidade de que a fosfina seja produzida pela interação de fosfetos ejetados do interior do planeta por erupções vulcânicas com o hidrogênio da água e do ácido sulfúrico na atmosfera.
De fato, magma terrestre, quando ejetado para a superfície na forma de lava, contém fosfetos. Os pesquisadores modelaram a quantidade necessária para gerar a fosfina na alta atmosfera, detectada numa proporção de 20 partes por bilhão, e constataram que seria possível chegar a algo assim se Vênus estivesse produzindo 93 quilômetros cúbicos de lava por ano. É um bocado. A média da Terra, para efeito de comparação, é de 20 a 25 quilômetros cúbicos por ano. Mas, quando há grandes erupções, pode passar bem disso.
Até o final do século 20, esperava-se apenas modestíssima atividade vulcânica em Vênus, com produção média de 3 quilômetros cúbicos de lava por ano – muito aquém do necessário para explicar a detecção. Mas as evidências vêm se acumulando em tempos recentes, graças à missão europeia Venus Express (2005-2015), de que o planeta talvez seja mais ativo do que isso. O quanto exatamente, ninguém sabe. Se o for a ponto de produzir a quantidade de lava necessária, essa pode ser uma explicação muito mais simples para o enigma da fosfina.
O novo artigo ainda precisa passar por revisão por pares e, claro, a palavra final, como sempre em ciência, estará com a natureza. Futuras missões terão de determinar não só se a fosfina está mesmo lá, mas se a hipótese biológica é mesmo a mais razoável para explicá-la. Por ora, o trabalho de Truong e Lunine está disponível como um pré-print no repositório arXiv.
Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.
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