Voo de protótipo da SpaceX coloca a humanidade mais perto de Marte
O que mais impressionou no voo-teste do protótipo do futuro superfoguete da SpaceX, o Starship, realizado no último dia 9, em Boca Chica, no Texas, foi o quanto a imensa maioria da imprensa não entendeu nada. Enquanto os entusiastas vibraram com seis minutos e 42 segundos de “sonho vívido”, tudo que as agências de notícias viram foi uma nave espacial prateada se estatelar e explodir. Na CNN Brasil, virou motivo de escárnio. O sentimento apropriado era de júbilo.
Que o diga o rival de Elon Musk e da SpaceX nessa nova corrida espacial, Jeff Bezos. Por meio de sua empresa Blue Origin, Bezos disputa com Musk um lugar nos planos da Nasa de levar humanos à Lua nos próximos anos. Após o voo, ele escreveu no Instagram: “Todo mundo que sabe como esse negócio é difícil está impressionado pelo teste de hoje do Starship. Baita parabéns a toda a equipe da SpaceX.”
Não, não foi um foguete que “explodiu logo após o lançamento”. Foi um protótipo de segundo estágio de foguete com colossais 50 m de altura por 9 de diâmetro que decolou conforme o planejado, usando (intencionalmente) três, depois dois, depois um motor, atingiu a altitude máxima planejada, 12,5 km, orientou-se para descer de barriga (algo jamais feito) usando flaps para controlar a queda livre com aerodinâmica (algo jamais feito) e então, no momento final, se endireitou para a posição vertical (algo jamais feito) e desceu exatamente na plataforma designada, usando (como planejado) apenas dois dos três motores – mas em velocidade alta demais. E aí tivemos a explosão.
Antes mesmo da partida Musk já dizia que a chance de voltar ao solo inteiro era de 30%. Seria maior se a SpaceX estivesse preocupada com o que os outros vão pensar e decidisse por um perfil de voo mais conservador, como o dos primeiros estágios do Falcon 9, foguete mais tradicional da companhia. Mas o objetivo era realizar o teste mais agressivo possível, sem se importar com a preservação do veículo em si. Por quê? Primeiro porque, quanto mais você “empurra o envelope”, levando o sistema a seus limites, mais você aprende. Segundo porque, chegando ou não ao chão, a SpaceX provavelmente jamais lançaria novamente o finado protótipo SN8.
Não percamos de vista o objetivo de Musk: promover a colonização de Marte. Isso exigirá não só um veículo confiável e amplamente testado; exigirá muitos veículos iguais. Parte do aprendizado da SpaceX tem sido desenvolver o Starship e, ao mesmo tempo, a técnica para construir muitas réplicas, a baixo custo. Enquanto o SN8 fazia sua demonstração mesmerizante, o SN9 estava pronto, o SN10 e SN11, nas fases finais de integração, e os protótipos SN12 a SN16, parcialmente construídos.
A dificuldade para o pouso do SN8 foi identificada (pressão baixa nos tanques superiores) e há razões para acreditar que o SN9 possa voar ainda neste ano. E com ele virá mais aprendizado, para o 10, o 11… Mas quem viu (e entendeu) o voo do SN8 sabe que foi ali que Marte, pela primeira vez, de fato pareceu estar ao alcance da humanidade.
Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.
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