Um mergulho em Occator, Ceres

Salvador Nogueira

Observe, em toda a sua glória, os pontos brilhantes no interior da cratera Occator, em Ceres. A Nasa acaba de divulgar a imagem registrada pela sonda Dawn a uma distância de 1.470 km da superfície do planeta anão, na terceira órbita científica da missão.

Produto combinado de duas imagens da Dawn, uma de baixa exposição e outra de alta exposição, para revelar os detalhes dos pontos brilhantes em Ceres. (Crédito: Nasa)
Produto combinado de duas imagens da Dawn, uma de baixa exposição e outra de alta exposição, para revelar os detalhes dos pontos brilhantes em Ceres. (Crédito: Nasa)

A essa altura, a resolução é de 140 metros por pixel. O que significa que cada pixel nessa imagem ainda representa objetos absurdamente grandes, mas já podemos dizer o que não são os pontos brilhantes — a essa altura, alienígenas inteligentes que esqueceram as luzes acesas parecem estar descartados.

No momento, a hipótese gira em torno de gelo e sais. Houve detecção de uma tênue atmosfera sobre a cratera, o que indica que há material evaporando daquela região — daí a hipótese de gelo, uma vez que ele seria instável na superfície de Ceres. A radiação solar faria naturalmente com que ele evaporasse, uma vez exposto.

Agora, e nas regiões em que ele já evaporou? Bem, se o gelo estava misturado a sais — o que não chega a ser nada de outro mundo, haja vista a quantidade de sais que temos nos nossos oceanos –, uma vez que ele evapore, restam os grãos de sal em grandes depósitos na superfície, capazes de refletir a luz solar. Mais ou menos como quando você sai do mar, a água evapora e você fica cheio de farelos pelo corpo.

Na Terra, temos formações assim. Um ótimo exemplo é o salar de Uyuni, na Bolívia — a maior planície de sal do mundo, com 10,5 mil quilômetros quadrados. Dê uma olhada nele.

O salar de Uyuni, na Bolívia (Crédito: Anouchka Unel, Wikipedia Commons)
O salar de Uyuni, na Bolívia (Crédito: Anouchka Unel, Wikipedia Commons)
Imagem do salar de Uyuni visto do espaço, pelo satélite Landsat (Crédito: Nasa)
Imagem do salar de Uyuni visto do espaço, pelo satélite Landsat (Crédito: Nasa)

A explicação dos pontos brilhantes parece caminhar nessa direção. Mas ainda não dá para cravar. Além disso, falta explicar o que levou o gelo a ser exposto, para começo de conversa. Modelos da estrutura interna de Ceres sugerem que há muito gelo de água no subsolo, mas o que poderia ter feito ele emergir? Eu ainda acho que pode estar rolando algum tipo de criovulcanismo — em que água faz o papel de lava –, mas teremos de esperar o resto dos resultados chegarem.

Aliás, essa é uma coisa importante a se dizer. Não é só a imagem que ajuda a esclarecer o mistério. A Dawn também está fazendo um monte de medições topográficas e espectroscópicas para determinar a composição da superfície, e isso pode ser o fator determinante para desvendar o mistério.

“Logo, a análise científica irá revelar a natureza química e geológica desse cenário extraterrestre misterioso e hipnótico”, disse, em nota, Marc Rayman, engenheiro-chefe da missão Dawn.

A quarta e última órbita científica levará a Dawn a apenas cerca de 400 km da superfície. Então, ainda podemos esperar imagens ainda mais bonitas e detalhadas da cratera Occator no futuro. Fique de olho!

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Comentários

  1. Como sempre suas descrições são elucidativas. E como sempre também – apesar dos aparentes mecanismos que produziram tais “depósitos” carecerem de uma hipótese convincente, o que creio logo virá – põe por terra, explicações estapafúrdias do tipo “antigos astronautas ou alienígenas”. Não que não acredite que haja vida neste vasto Universo – Carl Sagan já disse que seria um grande desperdício de espaço – sempre me pergunto, com tantas estrelas e sistemas estelares mais exuberantes do que o nosso, por que viriam justamente para este grãozinho perdido numa praia? O que temos de tão especial assim? A praia de Copacabana ou a forma como estamos provocando a sexta extinção ou mesmo nossa técnica refinada de matarmo-nos em guerras? Muita filosofia eu sei caro Salvador, perdoe-me, mas quando se olha para este Universo e sobre aliens, difícil não se fazer tais perguntas. Um abraço.

    1. Sem dúvida. E talvez eu esteja sendo parcial, mas acho que podemos ser muito interessantes para alienígenas inteligentes. Nós fazemos do Sistema Solar um lugar especial no Universo. 😉

  2. Salvador,
    A NASA decididamente não sabe o que são nem o que não são aqueles pontos brilhantes. E não sei se a NASA está falando só em estruturas geológicas.Se tivessem seus cientistas tão certos, não chamariam tais pontos brilhantes de “misteriosos”. Quanto às centenas de óvnis na atmosfera da Terra, você não acha que uma civilização como a nossa com uma tecnologia altamente sofisticada, não possui cientistas capazes de distinguir fenômenos naturais de nossa atmosfera que “emulam” comportamento de um “veiculo aéreo estranho” de uma estrutura artificial conduzida de um modo inteligente? Difícil. Já em Ceres, ninguém sabe.

    1. Marisa, a Nasa de fato não sabe o que são os pontos brilhantes. Ela está investigando. É para isso que servem as missões de exploração. Para investigar o desconhecido.
      Sobre os óvnis na atmosfera, sim, em geral eles são — e por isso 99% dos casos de óvnis são explicados e deixam de ser óvnis para ter explicações mais provincianas. Um exemplo recente foi o dos vídeos que fizeram no Aeroporto de Miami. Você viu? Era imagens bem estranhas, mas uma investigação rápida revelou do que se tratava: um foguete Atlas V, decolando de Cabo Canaveral.

      Restam então os 1% de casos não explicados de imediato, os óvnis “legítimos”. Esses aí podem ser visitantes extraterrestres. Ou podem ser fenômenos atmosféricos ainda não conhecidos. Vai saber? Com certeza não sabemos tudo que há para saber sobre a atmosfera da Terra, e sua interação com o planeta e com o espaço.

      A questão é: como você não pode descartar um fenômeno atmosférico desconhecido, também não pode dizer que são visitantes extraterrestres. E como esses episódios não são passíveis de repetição controlada para o teste de hipóteses, não podem ser investigados cientificamente. E aí ficamos só com o mistério.

      A não ser que visitantes extraterrestres decidam revelar de forma clara e sem ambiguidade sua presença, continuaremos sem aprender nada com os óvnis e ainda daremos margem para o charlatanismo que explora esse tipo de fenômeno para ganhar algum tipo de vantagem.

  3. Fenomenal, Salvador! E fiquei fascinado, também, por esse salar de Uyuni, esses polígonos irregulares que aparecem na foto me deixaram curioso. A wikipedia, infelizmente, nada fala sobre eles, devem ser muito naturais, talvez criados nas enchentes sazonais do salar…

    Um dado intrigante sobre Ceres é que ele tem mais pontos brilhantes, apesar de que o mais impressionante é esse mesmo, de Occator.

    1. me parece que existe uma praia no centro da foto um pouco a esquerda…se parece com as prais fe gelo no extremo sul do chile ou alguma praia no norte do canada…repare que proximo ao litoral, o gelo se quebra de forma identica os daqui da terra!
      Vamos colocar bermurdas quando formos visitar plutão….arriba!

  4. Off topic
    Salva, existe estudo sério a respeito da possibilidade apresentada nesta notícia?
    http://www.dn.pt/inicio/ciencia/interior.aspx?content_id=4772953

    O “simples” derretimento das calotas polares poderia gerar o efeito estufa necessário? Se em teoria isso for possível, quantos anos (centenas/milhares) seriam necessários para chegar-se a uma condição atmosférica “parecida” com a do planeta terra?

    Grande abraço!

    1. Ramsés, falo bastante sobre a terraformação de Marte no meu “Rumo ao Infinito”, que ainda vou me esforçar para atualizar e relançar, ao menos em formato digital, até o fim deste ano…

    2. O problema é que a atmosfera de Marte iria jogar todos os subprodutos das explosões atômicas no planeta inteiro, contaminando toda a água que porventura possa se descongelar. Isto não é loucura, é burrice mesmo. Burrice de quem quer tudo automático e para agora, comportamento típico do entrevistado desta matéria.

    3. Bombardear as calotas polares de Marte ao ponto de derrete-las espalharia subprodutos radioativos por todo o planeta tal como se imagina que acontecesse se houvesse uma guerra nuclear aqui na Terra e contaminaria o solo do planeta com muito mais radiação do que já existe lá. Uma proposta destas é típica de gente imediatista, imprudente e que pensa que a tecnologia pode alterar vastos ambientes de maneira quase automática sem consequências futuras, tal como o sujeito que propôs tal coisa.

      1. Eu concordo que bombas atômicas seriam uma má ideia. Mas simplesmente atirar projéteis nas calotas pode fazer o serviço. Só a energia cinética já seria capaz de vaporizar um bocado de água e co2. 🙂

  5. Pois é, de longe era mais interessante… Na minha opinião de leigo ta mais pra sais mesmo do que gelo… Parece algum tipo de poeira ou grãos espalhados. O gelo seria mais definido eu acho, se bem que ha detecção de uma tênue atmosfera no local, o que aponta pra gelo… emfim… Não ajudaria apontar uma câmera térmica pra esses pontos? Se for gelo aparecerá como uma mancha azul bem mais fria do que o terreno em volta. Se for sais imagino que a temperatura deva ser parecida com o resto da superfície…

    Salvador, chegou a ver as fotos divulgadas ontem em alta resolução de Plutão? Show hein.

  6. Sal? Neste planetinha?
    Eu ainda acredito que seja cidade, pode ser abandonada, mas é uma cidade e bem reluzente!

    1. Acho incrível que você considere uma hipótese que envolve vida inteligente (bilhões de anos de evolução) mais provável do que a que envolve a mistura de dois átomos comuns (sódio e cloro) que são diluídos facilmente em água (H2O), uma substância composta absurdamente abundante em Ceres e em todo o Universo…

    2. “é uma cidade e bem reluzente”

      Arrã. E que só acende as luzes durante o “dia” em Ceres. À noite apagam. Super lógico.

      KKKK

      1. É lógico, sim. Eles são Ceresianos e têm os olhos atrás da cabeça. Assim, vêem ao contrário da gente. Olham pro dia: é noite. Olham pra noite: é dia. Muito lógico, acho.
        Sério: são cristais grandes, não de gelo, mas algo com formação física suficiente para refletir a luz do Sol com muita clareza.

  7. Nossa, parece que até foi salpicado! Algum cuspe de algum alienígena gigante? Na verdade, a hipótese de ser deposito de sais pode ser a mais coerente. Se encontra exatamente no centro da cratera. Excelente a comparação com o salar de Uyuni. Ademais, acho que se comparar com salares de menor extensão, vai ter a mesma aparência do fenômeno de Ceres.

  8. Salvador,

    A NASA fala na existência de “estruturas”. É possível os “pontos brilhantes” na cratera de Occator brilharem no lado escuro do planeta anão?
    Existe mesmo a possibilidade de serem os “pontos brilhantes” luzes artificiais? Bases alienígenas?
    Os céus do planeta Terra, caso queiram ou não, estão acostumados com os chamados “objetos voadores não identificados”. Se estão por aqui por que não em Ceres?

    1. Estruturas no sentido geológico do termo. Não estruturas artificiais. Seria possível os pontos brilhantes na cratera brilharem no lado escuro do planeta anão se eles estivessem emitindo luz. Já foi conclusivamente demonstrado que eles estão apenas refletindo luz solar. Então, não, os pontos brilhantes não são luzes artificiais. Nada impede que exista uma nave alienígena lá embaixo, de um porte que o atual nível de resolução não a detecte. Mas os pontos brilhantes claramente não têm nada a ver com uma nave ou uma base alienígena.
      Os céus da Terra são mais propensos a óvnis que os de Ceres pelo fato de a Terra ter atmosfera. Com atmosfera, temos uma série de fenômenos naturais (conhecidos e desconhecidos) que poderiam “emular” o comportamento de um veículo aéreo estranho. Já em Ceres, as possibilidades são bem mais limitadas.

  9. Caríssimo Salvador,

    Nestas análises já feitas, foi descartada a possibilidade de um oceano subsuperficial em Ceres, como o que existe em Europa?
    Aproveitando, existe algum outro corpo do sistema solar com estrutura semelhante?

    1. Descartado, não foi. Mas é improvável. Quanto a estrutura similar, ele lembra em composição algumas das luas geladas.

  10. Olá Salvador, considerando as teorias de que a água da terra poderia ter vindo de cometas, e o fato de diversas crateras, em diversos corpos do sistema solar serem associadas a impactos de cometas e asteróides, somando – se a isso a quase inexistente atmosfera de Ceres, não seria mais imediato assumir que isso seria um residual de gelo do impacto de um cometa? (Claro que é só uma especulação, facilmente descartavel com mais informações, mas gostaria de saber o por quê desse modelo não estar no cerne das notícias sobre os pontos em Occator.) Parabéns pelo trabalho! Abs!

  11. Parece lógico que o meteoro que caiu ali tinha água. O criovulcao do Salvador parace ser a melhor resposta. Agora como disse Marc Rayman, é esperar para ver sobre os processos fisio-quimicos e o tempo que o vulcão está em atividade, se está.

  12. Salvador,seria possível que em Ceres também haja um oceano subterrâneo como se supõe existir na lua joviana Europa?
    Abraços para você,Salvador!

    1. Seria, se houver energia suficiente para mantê-lo aquecido lá embaixo. Há quem diga que deve ter. 😉

      1. É improvável que haja energia suficiente para tanto. Ceres teria que estar sob o efeito de maré gravitacional, tal qual o satélite Europa, para que seu interior fosse aquecido o bastante a fim de manter um oceano subterrâneo. Outra fonte de calor poderia ser a mesma que mantém o núcleo terrestre aquecido: o calor residual da formação planetária e o decaimento de elementos radioativos, este último que no caso da Terra, responderia por cerca de 50% da energia liberada conforme estudo realizado por uma equipe internacional de cientistas que utilizou o detector KamLand, no Japão. Porém, um corpo tão pouco massivo como Ceres tende a se resfriar bem mais rapidamente que aqueles maiores e já teria perdido a maior parte desse calor depois de quase 5 bilhões de anos da formação do sistema solar.

        Márcio A. Silva – físico e astrônomo amador

      2. É improvável que haja energia suficiente para tanto. Ceres teria que estar sob o efeito de maré gravitacional, tal qual o satélite Europa, para que seu núcleo fosse aquecido o bastante a fim de manter um oceano subterrâneo. Outra possível fonte de energia seria o calor residual da formação planetária e o decaimento de elementos radioativos, esse último que no caso da Terra responderia por cerca de 50% da energia liberada, conforme um estudo feito por uma equipe internacional de cientistas utilizando o detector KamLand, no Japão. Porém, corpos pouco massivos como Ceres tendem a se resfriarem bem mais rapidamente que aqueles maiores, como a Terra, e já teria perdido a maior parte desse calor depois de quase 5 bilhões de anos de formação de nosso sistema solar.

        Márcio A. Silva – físico e astrônomo amador

      3. Acho que precisamos rever as teorias sobre a energia necessária pra criovulcanismo, afinal de acordo com as teorias atuais Plutão não poderia ter a atividade que encontramos.

    2. É improvável que haja energia suficiente para tanto. Ceres teria que estar sob o efeito de maré gravitacional, tal qual o satélite Europa, para que seu núcleo fosse aquecido o bastante a fim de manter um oceano subterrâneo. Outra possível fonte de energia seria o calor residual da formação planetária e o decaimento de elementos radioativos, esse último que no caso da Terra responderia por cerca de 50% da energia liberada, conforme um estudo feito por uma equipe internacional de cientistas utilizando o detector KamLand, no Japão. Porém, corpos pouco massivos como Ceres tendem a se resfriarem bem mais rapidamente que aqueles maiores, como a Terra, e já teria perdido a maior parte desse calor depois de quase 5 bilhões de anos de formação de nosso sistema solar.

      Márcio A. Silva – físico e astrônomo amador

      1. Então este material emergiu do interior de Ceres, com o impacto do objeto que colidiu nela assim acho , pela profundidade que causou o impacto.

    1. Até meados do ano que vem, se não me engano. E deve continuar perpetuamente em órbita. Vai virar uma lua de Ceres. 🙂

  13. Salvador, o gelo poderia ser exposto por um impacto de asteroide, não? Afinal, a cratera Occator parece muito com uma cratera de impacto.

    1. A cratera certamente é de impacto. Mas para o gelo ainda estar lá, teria de ser muito recente. E não leva muito jeito de ser. Ainda é um quebra-cabeça.

  14. O que seria aquele pontinho preto logo a esquerda da centro da cratera? Seria a sombra da Down projetada na superfície do planeta anão?

    1. Não, ele é muito definido para ser uma sombra. Pode ser artefato da imagem ou algum objeto que ainda não conseguimos distinguir. Um disco voador estacionado, talvez? 🙂

      1. Muito legal Salvador,

        O ponto me parece uma pequena cratera com sombra parcial como as outras da imagem.

      2. Muito legal Salvador,

        Me parece que tal objeto é uma cratera de impacto pequena com uma sombra parcial, como outras da imagem.

    1. Vai que a base é interna e não na superfície, as chances são ínfimas, mas não há limites para a imaginação nem pra especulação, divirta-se mesmo que novas informações cheguem e comprovem que estava errado…

    2. Sal também é somente uma hipótese! Mas se for uma base de verdade, você nunca vai saber. Ninguém quer que você saiba! O que eles querem é você viva como gado sem saber de nada.

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